domingo, 10 de fevereiro de 2019

Parlamentares novatos testam 'lives' e enquetes nas redes sociais para medir pressão popular

Deputados Kim Kataguiri (DEM-SP) e Joyce Hasselmann (PSL-SP) e senador Jorge Kajuru (PSB-GO) Foto: Agência O Globo
Deputados Kim Kataguiri (DEM-SP) e Joyce Hasselmann (PSL-SP) e senador Jorge Kajuru (PSB-GO) 
Foto: Agência O Globo

Parlamentares eleitos com a ajuda das redes sociais já começaram a testar, na estreia do Congresso, se a pressão popular pode ajudar ou atrapalhar seus mandatos. Enquanto novatos contam com “lives” e enquetes para sondar seus seguidores, deputados experientes são mais céticos quanto à relação entre internet e plenário.

Os deputados Joice Hasselmann (PSL-SP), Sargento Fahur (PSD-PR), Boca Aberta (PROS-PR) e o senador Jorge Kajuru (PSB-GO) estão entre os que prometem fazer enquetes para definir voto. O método foi testado por Kajuru na eleição à presidência do Senado , no início do mês. Ele votou em David Alcolumbre (DEM-AP) após três enquetes no Facebook.
— Não votei no Davi, quem votou foi o meu seguidor. Eu teria votado no Reguffe (Sem partido-DF). Decidi inaugurar uma nova forma de votações polêmicas — disse o senador, que se gaba de ter trinta contas oficiais nas redes.

‘Sem consistência’

À exceção de alguns estreantes, porém, a ideia sofre rejeição. O deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), da bancada evangélica, lembra que “no caso de Jesus, o povo mandou soltar Barrabás e mataram o Cristo; nem sempre a maioria está com razão”. O próprio Kajuru reconhece que precisa melhorar o método para evitar “votos” de robôs.
— Deputados sem nenhuma trajetória política foram eleitos sob o calor das redes sociais. Alguns vão querer dar continuidade ao mandato da forma como foram eleitos, mas isso não dá consistência. Eles precisam estudar os temas e ter posicionamentos sólidos para tomar posições — afirma André Figueiredo (CE), líder do PDT na Câmara.
“Não votei no Davi (para a Presidência do Senado), quem votou foi o meu seguidor. Eu teria votado no Reguffe. Decidi inaugurar uma nova forma de votações polêmicas”
SENADOR JORGE KAJURU (PSB-GO)
que fez três enquetes sobre o tema no Facebook
A deputada Tabata Amaral (PDT-SP), por exemplo, lançou o aplicativo “Poder do Voto”, em que é possível “verificar se o seu representante está votando de acordo com o que você pensa ou não”, mas acredita que a melhor forma de diálogo com a população é nas ruas, não com enquetes.
Kim Kataguiri (DEM-SP), um dos dois deputados mais jovens dessa legislatura, também não vê futuro em se pautar pela pressão popular.
— É para isso que serve uma democracia representativa. Democracia direta não funciona. A população não consegue deliberar sobre todos os temas ou obter consensos com a profundidade necessária — afirma Kim Kataguiri.
Deputados ouvidos pelo GLOBO colocam a reforma da Previdência como o primeiro grande teste dessa forma de atuação. O deputado Sargento Fahur, um dos 15 mais votados do país, diz que as redes sociais, com as quais foi eleito, podem atrapalhar a votação da reforma proposta pelo governo.
— Ninguém quer perder direitos. Eu sou um policial aposentado, e não quero dar a impressão de que eu tenho um benefício e não quero que outras pessoas tenham. Quem tem o ônus de mostrar para a população a necessidade dessas reformas é o governo, não nós — afirmou.

Pressão

A pressão é minimizada por outros deputados. Joice Hasselmann, segunda deputada mais votada da Câmara, afirma que não basta ter seguidores nas redes. É preciso ter força para convencê-los das suas posições.
— Estou acostumada com pressões. Acho que o eleitor tem que pressionar mesmo. Em geral, explico tudo muito bem para o meu eleitor e ele entende. Fiz isso com Rodrigo Maia (DEM-RJ, atual presidente da Câmara dos Deputados). Quando decidi apoiá-lo, apanhei dia e noite. Debati, expliquei e ganhei apoio da maioria — afirmou.
Um dos benefícios das redes sociais apontados por parlamentares é usar os seguidores para exercer pressão no Congresso. Na semana passada, em uma reunião fechada de deputados federais com o ministro da Justiça, Sergio Moro, Glauber Braga (PSOL-RJ), fez uma transmissão ao vivo para prestar satisfação aos eleitores.
— Foi uma forma de romper a barreira de uma reunião censurada. Vale lembrar que o coordenador daquela reunião proibiu a entrada da imprensa durante a exposição de Moro, ou seja, durante a maior parte da reunião —afirmou o deputado.
Outros se preocupam, por outro lado, com o impacto negativo que os séquitos de seguidores nas redes podem ter sobre a democracia. Quando, sob ameaças, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) decidiu abandonar o mandato e deixar o Brasil, outros deputados, como Alexandre Frota (PSL-SP), foram às redes para atacá-lo.
— Há muitas pessoas nas redes que não gostam das minhas posições e estão no meu perfil para tumultuar — afirma Sâmia Bomfim (PSOL-SP), acrescentando: —Redes sociais auxiliam na interação do parlamentar, mas não podem substituir as posições políticas apresentadas na plataforma eleitoral e nas concepções do partido e da bancada.