domingo, 24 de setembro de 2023

Leonardo Coutinho: 'Esta criança morreu de overdose'

 

Nicholas Feliz-Dominici morreu ao ingerir acidentalmente um comprimido de fentanil na creche; parente da proprietária do estabelecimento era traficante.| Foto: Arquivo familiar


O menino Nicholas Feliz-Dominici completaria 2 anos em novembro. Ele morreu de overdose de fentanil – uma droga sintética 100 vezes mais potente que a morfina e que é o maior desafio de saúde pública dos Estados Unidos. O pequeno Nicholas ingeriu a substância, possivelmente um comprimido, que ele encontrou no chão do berçário onde passava o dia, enquanto os seus pais trabalhavam. Além dele, outras duas crianças – um menino de 2 anos e uma menina de apenas 8 meses – também se intoxicaram e por muito pouco não tiveram o mesmo fim trágico.

As crianças ingeriram fentanil em um berçário porque o local era também um ponto de tráfico. Um dos familiares da proprietária estocava a droga e a repartia para distribuir nas ruas da região. A polícia encontrou um quilo da droga e prensas típicas para fazer tabletes como os de maconha e cocaína.

A morte de Nicholas mostrou que a pandemia de opioides, que, segundo as estatísticas mais recentes matou 80.411 pessoas em 2021, não poupa ninguém. Uma pandemia que, além das mortes, tem deixado um rastro de destruição em milhares de famílias de viciados que vivem como zumbis pelas ruas da América.


Em 2021, 40 bebês e 93 crianças de 1 a 4 anos morreram de overdose de fentanil por exposição acidental. Quase sempre por estarem no mesmo ambiente com pais ou demais familiares viciados


Mas Nicholas não é um ponto fora da curva da barbárie provocada pelo consumo de drogas. Segundo dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, conforme a sigla em inglês), em 2021, 40 bebês e 93 crianças de 1 a 4 anos morreram de overdose de fentanil por exposição acidental. Quase sempre por estarem no mesmo ambiente com pais ou demais familiares viciados.

Um levantamento da Escola de Medicina da Universidade Yale mostrou que, além das 133 crianças menores de 4 anos, outros 1.424 menores de idade também morreram graças a essa droga. Apenas dois anos antes, em 2019, o número de crianças mortas por terem sido expostas acidentalmente ao fentanil ou por terem se tornado viciadas triplicou.

Quantas crianças morreram desde então? Quantos mais ainda morrerão? O atraso na preparação e divulgação dos números pode nos reservar um quadro sombrio que os defensores da liberação do uso das drogas tendem a ignorar; afinal, bebês morrendo acidentalmente por consumo de fentanil não combina bem com a tese de que o uso de drogas é uma escolha do indivíduo com repercussões exclusivas sobre ele.

Se a tendência de crescimento da overdose de crianças e adolescentes tiver se mantido, o fato de a morte de Nicholas ter chamado a atenção pode ser um sinal de quão avassalador tem sido o fenômeno que não poupa nem os fetos. Em 2017, as autoridades de saúde dos Estados Unidos registaram que 5.375 recém-nascidos precisaram ser tratados, logo nos primeiros meses de vida, da abstinência do fentanil. Um vício adquirido no ventre de suas mães usuárias de drogas.

No Brasil, fenômeno semelhante ocorre com o crack, cuja liberação há quem defenda. Em 2018, apenas em um hospital da capital paulista nasciam, todos os meses, uma média de 30 crianças viciadas. Bebês com crise de abstinência que, além de terem de passar por uma desintoxicação nos primeiros meses de vida, levarão consigo para sempre as sequelas da “reengenharia” cerebral provocada pela exposição ao crack desde a fase embrionária, passando pela fetal e, se não impedidos, até pela amamentação.


Liberar o consumo poderá reduzir o tráfico, mas, mais do que tudo, resolverá a vida dos bandidos, não a das vítimas. Crianças seguirão morrendo, por acidente ou vício


Essa enxurrada de números frios frente a uma tragédia com nome e rosto como a de Nicholas parece fria. Mas cada um dos números tinha um nome, rosto e família. Embora eles tenham se perdido nas estatísticas, juntos e no mais profundo anonimato, esses meninos e meninas mortos ou viciados ainda no ventre de sua mãe poderiam ter tido um destino diferente se não fosse o tráfico de drogas.

Liberar o consumo poderá reduzir o tráfico, mas, mais do que tudo, resolverá a vida dos bandidos, não a das vítimas. Crianças seguirão morrendo, por acidente ou vício. Não há mitigação de danos que reverta o que, possivelmente, é o efeito mais perverso e covarde do vício em drogas. O vício e a morte de bebês.



Leonardo Coutinho, Gazeta do Povo

sábado, 23 de setembro de 2023

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'Um retrocesso na imparcialidade dos juízes', por Marcelo Figueiredo

 

O ministro do STF Gilmar Mendes passou espetacularmente de defensor da moralização do Brasil para apoiador de corruptos, como o ex-presidiário Lula - Foto: Nelson Jr./STF.


A imparcialidade do juiz é um tema dos mais relevantes para o regular desenvolvimento do processo. A chamada atividade “desinteressada do conflito” é absolutamente necessária para as partes envolvidas no conflito. Todo juiz deve manter-se equidistante dos interessados e sua atividade é subordinada exclusivamente à lei.  Como se sabe, embora a jurisdição seja função pública do Estado, versa, quase sempre, sobre interesses privados.

A Constituição da República ao garantir o princípio da igualdade ou isonomia exige que em toda atividade estatal haja sua incidência. Um órgão jurisdicional parcial não estaria tratando igualmente as partes no processo e, destarte a relação jurídica instaurada em face desse juiz não teria condições de validade, porque infringiria aquele preceito constitucional. O requisito da imparcialidade filia-se à garantia constitucional do devido processo legal.


Todo juiz deve manter-se equidistante dos interessados e sua atividade é subordinada exclusivamente à lei. 


Nada de novo na tentativa de evitar o juiz parcial. No sistema do velho Direito Processual Penal brasileiro já encontrávamos nos artigos 252 e 254 regras similares. O “novo” Código de Processo Civil após muitos debates e propostas de especialistas aprovou os artigos 144 e 145, com regras a respeito dos impedimentos e suspeições dos juízes em várias situações. O inciso VIII objeto de discussão no Supremo Tribunal Federal tem a seguinte redação:

“Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo: VIII- em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório”.

O Supremo Tribunal Federal, entretanto, formou maioria para flexibilizar regras de impedimento de juízes e liberar magistrados para julgar casos em que as partes sejam clientes de escritórios de cônjuge, parceiros e parentes. Curioso e lamentável que a decisão imediatamente beneficia os próprios ministros do STF, Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes todos casados com advogadas. Outros ministros do STF são pais de advogados. E quantos outros juízes no Brasil seriam atingidos pela regra.

Qual o argumento para não aplicar a lei?  Segundo o voto predominante do ministro Gilmar Mendes a restrição viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Afirma-se que não é possível exigir que os juízes conheçam a carteira de clientes dos escritórios de seus parentes. Já a AMB, Associação de Magistrados Brasileiros, diz que os juízes precisariam exigir dos parentes uma lista diária da relação de seus clientes e poderiam ser penalizados por informações que estão com terceiros.

Dois pontos merecem nossa reflexão. O primeiro é elementar. As regras de impedimento e suspeição têm nítido caráter moralizante e em princípio autorizariam inclusive uma interpretação extensiva e não restritiva ou flexível. Também não merece aplausos o esforço do legislador processual que não primou na redação do citado artigo 144, inciso VIII acima citado de bom rigor técnico ao não prever de modo mais direto um meio de evitar tais situações em um raio de ação talvez mais curto, porém mais certeiro.

É curioso também notar a aparente falta de advertência dos grandes processualistas brasileiros em seus comentários às novas regras de impedimento e suspeição. Por que nenhum deles chegou à mesma conclusão do STF?  Quem estaria com a razão? A doutrina ao não ver nenhuma anomalia ou ausência de aplicabilidade na regra impugnada ou o STF por sua maioria?

Lamentavelmente, mais uma vez, o resultado do julgamento do Supremo dá alguns passos que podem ser chamados de retrocesso ao atendimento do princípio da moralidade administrativa. Este último princípio, aparentemente o legislador processual procurou resguardar, ainda que, na visão do STF, de forma defeituosa e tudo isso quase na mesma semana em que o mesmo Tribunal em nome da mesma imparcialidade instituiu o juiz de garantias.

A pergunta que fica: será que o STF não poderia ter sido mais criativo para não fulminar tais regras, dando-lhe uma interpretação conforme à Constituição? Novamente é necessário a matéria voltar ao Congresso que tem o dever, neste como em muitos casos, de legislar, dessa vez, espera-se, de forma mais inteligente.


Marcelo Figueiredo, advogado e consultor jurídico, é professor de graduação e pós-graduação de Direito Constitucional e Direito Constitucional Comparado da PUC-SP.


Gazeta do Povo

Neocolonialismo: como ONGs ambientalistas causam a “africanização” do Brasil, por Lorenzo Carrasco

 

Na entrada de um parque da Tanzânia, lê-se: “Cuidar, cultivar e proteger para as futuras gerações”.| Foto: fabulousfabs/Wikimídia


Em meu recente depoimento à CPI das ONGs do Senado, tive a oportunidade de comentar um aspecto pouco conhecido sobre a introdução no Brasil do movimento ambientalista, um instrumento de uma agenda de interesses oligárquicos de potências industrializadas, em especial, o eixo anglo-americano.

De fato, o ambientalismo trazido ao País a partir da década de 1980 foi implementado inicialmente na África Subsaariana duas décadas antes, como parte do movimento de “descolonização” do continente, que converteu uma dominação colonial direta em uma espécie de neocolonialismo “invisível”, principalmente, nas antigas colônias britânicas. Ali foi ensaiada a gestão de vastas áreas convertidas em parques naturais, muitas delas geridas direta ou indiretamente por organizações não-governamentais (ONGs), como a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) e o World Wildlife Fund (WWF, hoje World Wide Fund for Nature), criado em 1961 por altos oligarcas britânicos e holandeses, entre eles os príncipes consortes Philip e Bernhard. 

Na década de 1990, esses parques, muitos dos quais situados nas fronteiras de dois ou três países e, com frequência, sobre áreas de ocorrência de recursos minerais, representavam mais de 8% da área da África Subsaariana. Na Tanzânia, cerca de 40% do território chegaram a ser administrados pela ONG Tanzania Natural Parks, que até hoje atua em estreita cooperação com o WWF.


Para o Brasil, por instância direta de Sua Alteza Real Philip, o WWF criou a ONG Survival International, com a missão específica de fomentar a formalização do Parque Yanomami


Como parte do processo de reformatação do colonialismo, muitos integrantes das elites africanas que liderariam a “descolonização” foram educados em universidades europeias, em grande medida, incorporando os princípios de governança que manteriam seus países sob o domínio de fato dos interesses das potências colonizadoras. Processo semelhante ao que ocorre hoje com os gestores da agenda ambientalista-indigenista, em ONGs, na academia, órgãos públicos, setores do Judiciário e na mídia, seduzidos por doações milionárias para ONGs, linhas de pesquisa, cursos e seminários internacionais com despesas pagas, salários de cinco dígitos em moedas fortes e outras benesses.

A rigor, o planejamento do movimento ambientalista como um instrumento político contra as pretensões de desenvolvimento dos países não industrializados remonta ao pós-guerra imediato, em 1948, quando altos oligarcas anglo-americanos criaram três entidades-chave para o impulso antidesenvolvimentista: o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), a UICN e a Conservation Foundation. De forma emblemática, as constituições das duas primeiras foram redigidas pelo Foreign Office britânico, já engajado na agenda da “descolonização”. Ambas ainda estão ativas hoje, enquanto a Conservation Foundation fundiu-se com o WWF em 1990.

A UICN e o WWF (ambos baseados em Gland, Suíça, onde compartilharam a mesma sede durante anos) estão entre as maiores ONGs ambientalistas do mundo, com orçamentos combinados na casa das centenas de milhões de dólares e presença efetiva em mais de 60 países. Em vários países africanos, o WWF já foi acusado de cumplicidade direta com vários abusos e crimes cometidos contra as populações que vivem nas proximidades dos parques.


Nas décadas de 1960-70, o CMI criou um autêntico centro de treinamento para militantes “anticolonialistas” na Universidade de Dar-es-Salaam, na Tanzânia, na qual foi professor o pedagogo brasileiro Paulo Freire


Para o Brasil, por instância direta de Sua Alteza Real Philip, o WWF criou a ONG Survival International, com a missão específica de fomentar a formalização do Parque Yanomami. A iniciativa se tornaria o precedente para a criação de numerosas reservas indígenas no território brasileiro, com frequência, inviabilizando toda sorte de atividades produtivas, que, inclusive, poderiam beneficiar os próprios indígenas, muitos dos quais se ressentem das dificuldades para assegurar o próprio sustento. Com a experiência adquirida, a ONG expandiu sua atuação a vários outros países com populações indígenas.

O CMI é, igualmente, um caso exemplar. Entre os seus fundadores, processo iniciado ainda antes da II Guerra Mundial, destacava-se John Foster Dulles, que viria a ser secretário de Estado dos EUA no governo de Dwight Eisenhower (1953-1961), enquanto seu irmão Allen Dulles ocupava a direção da Central Intelligence Agency (CIA). Outro deles foi o britânico Lorde Lothian, para quem as soberanias nacionais representavam uma “influência demoníaca”. 

Oficialmente dedicado à promoção do ecumenismo religioso, na verdade, sua especialidade é a manipulação de questões referentes ao meio ambiente, direitos humanos, povos indígenas, luta pela terra, desarmamento civil e outros temas de grande apelo público, como instrumentos de uma autêntica guerra irregular contra Estados nacionais situados na alça de mira do Establishment oligárquico anglo-americano. Nas décadas de 1960-70, o CMI criou um autêntico centro de treinamento para militantes “anticolonialistas” na Universidade de Dar-es-Salaam, na Tanzânia, na qual foi professor o pedagogo brasileiro Paulo Freire. 

Outra vertente da sua atuação foi a promoção da chamada “Teologia da Libertação” na Ibero-América, pelo que foi severamente criticado pelo então presidente da Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano, cardeal Joseph Ratzinger (o futuro papa Bento XVI), em 1997.

No Brasil, o CMI foi crucial para a criação do Centro Ecumênico de Informações (CEI), em 1964, depois convertido no Centro Ecumênico de Informação e Documentação (CEDI), e do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), braço indigenista da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em 1994, o CEDI dividiu-se em três ONGs especializadas: Koinonia (agenda “identitária”); Ação Educativa (direitos humanos); e Instituto Socioambiental (ISA – agenda ambientalista-indigenista). Esta última viria a tornar-se um dos principais enlaces das ONGs brasileiras com o aparato ambientalista-indigenista internacional, sendo uma das mais beneficiadas com as doações milionárias de fundações privadas e governos que controlam a agenda “verde-indígena” global.

Na órbita do CMI, enquadram-se outras entidades integrantes da guerra irregular contra o Estado soberano brasileiro, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Via Campesina, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Viva Rio, International Rivers e outras.

Em paralelo com campanhas contra empreendimentos de infraestrutura física em geral, um alvo prioritário desse vasto aparato de guerra irregular tem sido o setor elétrico, com as campanhas contra usinas hidrelétricas (inviabilizando, em especial, as de grandes reservatórios) e a energia nuclear, já prejudicada por um atraso de décadas pelas indecisões de sucessivos governos sobre o setor.

Agora, a agenda da “descarbonização” se concentra em promover as fontes eólicas e solares, cujas deficiências para a operação na base do sistema elétrico (a chamada energia “despachável”) são amplamente conhecidas, insistência que tende a agregar ainda mais custos, instabilidade e ineficiência ao abastecimento de eletricidade.

Por ironia, embora o continente tenha sido um campo de provas das técnicas de intervenção depois aplicadas no Brasil, atualmente, muitos países africanos estão contestando a agenda ambientalista/catastrofista das mudanças climáticas. Tanto na conferência climática COP-27, no Cairo, no final de 2022, como na recente cúpula Rússia-África, em São Petersburgo, vários deles deixaram claro que não renunciarão ao uso dos seus recursos de hidrocarbonetos nos seus esforços de desenvolvimento, pretendendo, inclusive, recorrer à energia nuclear. 

Como afirmou, em São Petersburgo, a fundadora da ONG sul-africana Africa4Nuclear, Princess Mthombeni, o continente é incapaz de realizar uma transição para a “energia verde”, pelo simples fato de que mais de 400 milhões de pessoas não têm acesso à eletricidade em qualquer forma – um dos resultados da “descolonização” orientada pelos antigos colonizadores.

O Brasil, ao contrário, parece estar mergulhando de cabeça e acriticamente na agenda da “descarbonização” da matriz energética e da economia, e seu programa nuclear encontra-se praticamente à deriva, como se observa pelo virtual abandono da usina Angra 3 por três décadas.

Neste aspecto, seria positivo seguir a inspiração dos africanos comprometidos com a reconstrução do continente para o século XXI.

Lorenzo Carrasco é jornalista, presidente do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa) e da Capax Dei Editora. Entre seus livros estão "Conselho Indigenista Missionário: Filho da Mentira" (2016) e "Máfia Verde: o ambientalismo a serviço do Governo Mundial" (2001).


Lorenzo Carrasco é jornalista, presidente do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa) e da Capax Dei Editora. Entre seus livros estão "Conselho Indigenista Missionário: Filho da Mentira" (2016) e "Máfia Verde: o ambientalismo a serviço do Governo Mundial" (2001).



Gazeta do Povo


J.R. Guzzo: 'No STF de hoje, o que vale não é a lei, é a vontade dos donos do governo'

 

Sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília.| Foto: Divulgação/ CNJ


É uma espécie de frenesi. O Supremo Tribunal Federal decidiu que as provas de corrupção contra a construtora Odebrecht não valem mais, apesar da confissão de culpa dos seus próprios diretores e da devolução de bilhões de reais em dinheiro roubado. Decidiu que os índios têm direito de reivindicar qualquer espaço do território nacional, mesmo aqueles que não ocupam há mais de 35 anos – e que são propriedade legal de outros brasileiros.

Decidiu anular a lei que tornou voluntário o pagamento do “imposto sindical”; o trabalhador vai ser obrigado a pagar de novo, na prática, com desconto direto em seu salário na folha. Decidiu colocar em votação (por computador) a exigência de um partido de extrema esquerda para legalizar o aborto até doze semanas de gravidez, em desrespeito direto ao Código Penal em vigor. A coisa não para, nem por um minuto.


É assim que funciona o STF de hoje. Quando há provas indiscutíveis contra alguém que os ministros querem proteger, as provas são anuladas.


Como acontece em qualquer regime onde os que mandam se dão o direito de decidirem tudo, sem respeito a nenhum tipo de limite, o STF também não se obriga a obedecer à lógica comum. A presidente do tribunal, ora em vias de se aposentar, disse tempos atrás que o quebra-quebra do dia 8 de janeiro em Brasília foi um novo “Pearl Harbour” – o ataque aéreo japonês que matou 2.400 pessoas no Havaí, em 1940, e fez os Estados Unidos entrarem na Segunda Guerra Mundial.

Não tem pé nem cabeça, é claro, mas o mínimo que o STF podia fazer em deferência a esse desvario seria um julgamento público, com o máximo de exposição dos condenados. Está fazendo o contrário. Depois do show de abertura, e dos protestos que provocou pela flagrante violação das leis penais brasileiras, o processo virou “virtual”. Os advogados não poderão fazer a defesa oral – um direito básico de qualquer acusado. Não haverá debate entre os julgadores. Tudo volta a ser empurrado para baixo do computador. É algo tão doentio que até a Ordem dos Advogados do Brasil protestou.

Depois da excitação inicial, os ministros acharam mais conveniente se esconder do público. Não querem que o cidadão veja com seus próprios olhos réus serem condenados a 17 anos de cadeia por participarem de uma arruaça. Não querem mostrar para o público que as pessoas estão sendo punidas duas vezes pela mesma coisa, “golpe de Estado” e “abolição violenta do estado democrático de direito” – um truque primitivo para somar duas penas e dobrar o tempo de prisão.

Não querem que os advogados digam na frente de todo mundo que os seus clientes estão sendo acusados de um crime impossível; sua chance real de dar um golpe sempre esteve entre o zero e o triplo zero. Não querem que o povo ouça seu argumento de que não é preciso haver provas contra os réus – culpado não é quem fez isso ou aquilo, mas quem o inquisidor-chefe do processo decide que é culpado.

É assim que funciona o STF de hoje. Quando há provas indiscutíveis contra alguém que os ministros querem proteger, as provas são anuladas. Quando não há prova nenhuma contra alguém que querem perseguir, as provas não são necessárias. Como sempre ocorre quando quem tem a força deixa de ter limites, o Sistema de Justiça é substituído pela anarquia – o que vale não é a lei, é a vontade individual dos donos do governo. É inevitável que fique do jeito que está.

 

J.R. Guzzo, Gazeta do Povo

As falácias do primeiro voto em favor do aborto no STF

 

A ministra Rosa Weber, presidente do STF e relatora da ADPF 442, votou pela legalização do aborto nas 12 primeiras semanas de gestação.| Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF


O julgamento da ADPF 442, que pede a liberação do aborto no Brasil nas 12 primeiras semanas de gestação, irá para as sessões presenciais do Supremo Tribunal Federal. Um pedido de destaque do ministro Luís Roberto Barroso interrompeu o julgamento em plenário virtual, e tudo indica que será o próprio Barroso, que assume a presidência do STF em outubro, quem definirá quando o assunto voltará à pauta da corte. Ele substituirá Rosa Weber, que também é relatora da ADPF 442 e foi a primeira a depositar seu voto – que permanecerá valendo mesmo depois que ela se aposentar do tribunal. 

A ministra julgou a ação parcialmente procedente, ou seja, considerou que os artigos do Código Penal que criminalizam o aborto são inconstitucionais, ao menos no que diz respeito ao primeiro trimestre de gravidez.

Há alguns poucos pontos interessantes a ressaltar no voto da relatora. Ela reconhece, por exemplo, que a expressão “direitos sexuais e reprodutivos” contempla, sim, o direito ao aborto – por décadas, a estratégia do movimento abortista foi esconder sua pretensão sob essa expressão aparentemente inofensiva e até positiva. Além disso, apesar de definir a 12.ª semana de gestação como o limite para a legalização por ela pretendida, a ministra não enfrenta o tema de frente. O que, afinal, acontece de tão incrível quando se passa do sétimo dia da 12.ª semana para o primeiro dia da 13.ª semana, a ponto de um nascituro poder ser eliminado antes e não poder mais sê-lo depois? 

Rosa Weber não responde, limitando-se a dizer que existe uma gradação na proteção legal à vida. O lado positivo disso é ressaltar o caráter totalmente arbitrário da escolha; o negativo é que seus argumentos poderiam, no fim das contas, ser usados para defender o aborto até mesmo nos momentos que antecedem o parto – o que é, no fim das contas, o objetivo final da militância.


Não há base científica, legal ou ética para que o Brasil permita a eliminação indiscriminada de seres humanos ainda por nascer, com ou sem limite de evolução gestacional


De resto, o longo voto da ministra adota uma estratégia já conhecida: a de desumanizar o nascituro para, assim, negar-lhe os direitos de que os humanos nascidos gozam; ou, na mais benigna das hipóteses, argumentar que o nascituro não merece proteção no mesmo grau daqueles que já vieram à luz. Para isso, no entanto, é preciso torcer a ciência e a lei, e nem mesmo o empenho árduo que Rosa Weber coloca nesta tarefa é capaz de ocultar a verdade. 

É assim que, sem titubear, a ministra afirma que “a inexistência de consenso a respeito de quando inicia a vida é fato notório, mesmo para a área da ciência”, uma afirmação facilmente desmentida por qualquer manual de Embriologia usado por qualquer faculdade de Medicina, já que é amplamente sabido que o encontro do óvulo e do espermatozoide leva ao surgimento de um novo ser, um novo indivíduo, indubitavelmente vivo e indubitavelmente humano.

A ministra, no entanto, parte para uma concessão, talvez ciente da fraqueza do argumento sobre o início da vida – fraqueza que ela deixa transparecer em trechos como “o Estado, portanto, tem legítimo interesse (e deveres) na proteção da vida humana, configurada no embrião e no nascituro” (destaque nosso). Ainda que se admita que o embrião é vida humana, diz a relatora, ele não seria protegido pelo caput do artigo 5.º da Constituição brasileira. Rosa Weber fala de um suposto “propósito do texto constitucional em afastar qualquer compromisso com a tese do direito à vida desde a concepção, a qual, diga-se, foi rechaçada nos trabalhos constituintes”. No entanto, não houve “rechaço” algum. 

A expressão “desde a concepção” ficou de fora da Constituição não porque o constituinte quisesse deixar desprotegido o nascituro, mas porque julgava que tal proteção já estava implícita no texto – afinal, há vida no nascituro – e na lei infraconstitucional, que define o aborto como crime. Esta conclusão deriva da análise dos debates ocorridos na Assembleia Constituinte a respeito da redação do artigo 5.º, feita por parlamentares já depois da apresentação da ADPF 442.

Mas, ainda que a Constituição não explicite o direito à vida “desde a concepção”, outros textos legais o fazem, e Rosa Weber o reconhece. Falamos, especialmente, do artigo 2.º do Código Civil, segundo o qual “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. Depois de reconhecer esta salvaguarda, e citar alguns outros direitos dados ao nascituro pela lei, no entanto, a ministra questiona, recorrendo a um sofisma: “o que ocorre no mundo jurídico se o nascituro, herdeiro ou donatário, não chegar a nascer? Não há produção de efeitos jurídicos, uma vez que o exercício dos direitos é condicionado ao seu nascimento com vida, quando ele adquire personalidade civil”.

 De fato, há muitas circunstâncias que podem fazer com que um embrião ou feto não chegue a nascer, como um acidente ou uma má-formação. Mas, se isso ocorre por meio do aborto voluntário, significa que já houve uma violação dos seus direitos, salvaguardados pela lei. O que a ministra propõe, no fim, é uma falácia: a lei põe a salvo os direitos do nascituro, mas ele só pode exercê-los se nascer vivo; por isso, não haveria problema em matá-lo antes de ele nascer.

Afastar o direito do nascituro à vida é um passo necessário para o ataque final: a afirmação de que a lei penal que criminaliza o aborto viola o princípio da proporcionalidade, e por isso teria de ser derrubada. 

A análise da proporcionalidade, assim, não seria feita em relação ao direito do nascituro à vida, mas em relação aos direitos da mulher à autonomia e à liberdade. Ocorre, no entanto, que os termos são tão vagos quanto incorretamente aplicados neste caso. A mulher tem autonomia sobre o próprio corpo, mas o filho, obviamente, não é parte do corpo da gestante; e de que liberdade, afinal, estamos falando? Da liberdade de matar um filho. No entanto, não existe “direito fundamental ao homicídio”. A lei dá às pessoas o direito de matar em legítima defesa um agressor injusto, e ao Estado o direito de aplicar a pena de morte em tempos de guerra, mas nunca, em nenhum momento da história brasileira, houve um “direito a eliminar um ser humano indefeso e inocente”. 

Como afirmamos anos atrás, “o raciocínio segundo o qual os artigos 124 e 126 do Código Penal ‘restringem um direito’ é tão absurdo quanto pensar que os artigos 155 e 157, que definem o furto e o roubo, restringem o direito à propriedade, como se houvesse um ‘direito a apossar-se do alheio’ que estivesse sendo sufocado pela lei”. Não há, portanto, nenhum sentido em aplicar a análise de proporcionalidade à criminalização do aborto.

O que se espera, agora, é que haja ao menos seis ministros capazes de apontar estes e outros equívocos da argumentação de Rosa Weber quando chegar o momento das discussões em plenário. Não há base científica, legal ou ética para que o Brasil permita a eliminação indiscriminada de seres humanos ainda por nascer, com ou sem limite de evolução gestacional. O que precisamos é de uma rede eficaz de apoio às gestantes para que sejam devidamente amparadas em seu momento de maior vulnerabilidade, tanto pelo Estado quanto pela sociedade. Esta, sim, é a marca de um país verdadeiramente civilizado.


Gazeta do Povo

Fernão Lara Mesquita - Tem muito mais Lulas que Zelenskis nos governos do mundo

Perfectly Frank 9-23-23

A volta da corrupção - Oposição leva o dobro de recursos no novo PAC do ex-presidiário

 

Rio de Janeiro, berço da base de apoio bolsonarista, governado por Cláudio Castro (PL), do partido do ex-presidente, levou R$342,6 bilhões (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)


Estados com governadores que declararam apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro levaram o dobro de recurso destinado pelo Novo Programa de Aceleração do Crescimento, o Novo PAC. Serão quase R$1,3 trilhão para essa turma. Os que fizeram um “L” nas eleições irão levar pouco mais de R$600 bilhões. Quem mais vai ver a cor do dinheiro do PAC será o Rio de Janeiro, berço da base de apoio bolsonarista, governado por Cláudio Castro (PL), do partido do ex-presidente: R$342,6 bilhões.

Cooptação

São Paulo, de Tarcísio de Freitas (Republicanos), ficará com a segunda maior fatia do PAC: R$179,6 bilhões.

Em família

Entre governos estaduais lulistas, Sergipe ganhou a sorte grande: R$136,6 bilhões. É lá que o neto de Lula tem uma boquinha no governo.

Raspa do tacho

O menor volume de grana do Novo PAC fica com o bolsonarista Gladson Cameli (PP), que derrotou o clã Viana no Acre: R$26,6 bilhões.


Com Diário do Poder

Propina para socialista Felipe Carreras (PSB) não surpreende pernambucanos - Desde o escândalo dos precatórios ali pelos anos 1990 a turma de Arraes comete traquinagens

 

Nos últimos 15 anos quase não houve grande evento em Pernambuco sem que a turma de Carreras na Casa Cheia estivesse por trás. - Foto: Cleia Viana/Agência Câmara.


Tem notórias ligações a empresas de apostas esportivas o deputado Felipe Carreras (PSB-PE), pivô do escândalo de suposta cobrança de propina de R$35 milhões para “pegar leve” com as “bets”. Por isso não causou surpresa em Pernambuco a denúncia contra Carreras, relator de projeto para regular o setor, que teria cobrado mala de dinheiro. Ele é sócio desde 2004 da Festa Cheia, cujos eventos têm sido patrocinados pelas “bets”, empresas de apostas objeto do projeto.

Homem de confiança

Carreras ainda é apontado em Pernambuco como o principal homem de confiança do prefeito do Recife, João Campos (PSB).

A ficha do distinto

Carreras foi secretário de Turismo na gestão de Geraldo Júlio, preposto do falecido Eduardo Campos no Recife, neto de Miguel Arraes. De resto, desde o escândalo dos precatórios, nos anos 1990, a turma do antigo cacique está sempre nas manchetes policiais

Evento da semana

Programado para este final de semana, o Samba Recife, da Festa Cheia, com Alexandre Pires, Belo, Mumuzinho etc, tem patrocínio da PixBet.

Quase monopólio

Nos últimos 15 anos quase não houve grande evento em Pernambuco sem que a turma de Carreras na Casa Cheia estivesse por trás.

Com informações do Diário do Poder

Gangues em guerra! Operação do governo petista de Jerônimo Rodrigues mata mais 6 na Bahia

Outros 15 suspeitos foram presos. Conflito já soma mais de 15 mortes


A ação contou com cerca de 400 agentes das polícias Civil, Militar, Federal e Rodoviária Federal. Reprodução/ PMBA.




Mais seis pessoas foram mortas e outras 15 tiveram mandados de prisão cumpridos em confrontos com policiais durante operação conjunta das forças de segurança da Bahia, chamada de ‘Saigon’, que tem o objetivo de deter grupo de criminosos suspeitos de assassinatos.

Tudo ocorreu na região de Águas Claras (Salvador) e em Feira de Santana (BA) na manhã desta sexta-feira (22). A ação contou com cerca de 400 agentes das polícias Civil, Militar, Federal e Rodoviária Federal.

Lucas Monteiro Caribé um policial federal, foi morto na semana passada durante operação em Salvador. Em sequência, pelo menos mais nove pessoas foram mortas pela polícia.   

Cada vez mais as forças policiais do Governo da Bahia, que há 17 anos é governado por petistas, vem sendo marcado por estímulo da violência policial. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública publicado recentemente apontam que 1.464 pessoas foram mortas pela polícia baiana em intervenções oficiais no ano de 2022, conseguindo superar, pela primeira vez o estado do Rio de Janeiro líder em todos os anos anteriores desde o início da contagem, registrou 1.330 assassinatos em 2022.  

O número de mortes na Bahia representa 22,7% do total de mortes praticadas por policiais em todo o Brasil, que foi de 6.430 mortes. 

Diário do Poder

sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Fernão Lara Mesquita - É preciso que haja um confronto de instituições

Indenizações milionárias, favores e capital estrangeiro: interesses por trás da queda do marco temporal

 



A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar o marco temporal para a demarcação de terras indígenas não tem apenas como efeitos a instabilidade jurídica e a possibilidade de desapropriação de milhares de terras produtivas. Com o aumento desnecessário dessas terras, centenas de obras públicas de infraestrutura em todo o país, que beneficiariam os próprios indígenas, deverão ser interrompidas ou adiadas. Esse cenário manterá as aldeias na pobreza, enquanto qualquer melhoria exigirá indenizações milionárias para ONGs (leia mais abaixo), muitas delas sustentadas por megafundações de capital estrangeiro.

Isso significa travar o desenvolvimento em quase 500 novas áreas do país, estagnando cerca de 30% do território nacional.

De acordo com uma ex-funcionária da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), que preferiu não se identificar, todas as obras necessitam de estudos de impacto ambiental que consideram sua proximidade a aldeias. “Isso costuma travar a obra ou gerar indenizações milionárias que o governo é obrigado a pagar ONGs que representam os índios”, explica, ao citar regras definidas pela Portaria Interministerial 060, de 2015.

Entre essas normas está a distância estabelecida no entorno da terra indígena a fim de garantir a conservação da região. No caso da implantação de ferrovias, portos, mineradoras ou termoelétricas, é considerado que a obra impacta um raio de até 10 km, enquanto obras em rodovias e hidrelétricas, até 40 km.

“Então, imagine a quantidade de territórios e de áreas ao redor que vão travar obras e exigir indenizações milionárias sem o marco temporal”, pontua a especialista, ao afirmar que a tese de que os indígenas têm direito somente às terras que eram ocupadas por eles na data de promulgação da Constituição, em 1988, evitaria essa demarcação excessiva, principalmente diante da imensa quantidade de novas demarcações em análise.

Dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apresentados no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) no início deste mês mostraram que há 487 reivindicações de novos territórios indígenas em todo o país aguardando aprovação pela Funai, e que outras 120 áreas estão em estudo para serem reivindicadas, a maioria nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste.

No total, essas novas terras equivalem a cerca de 117 milhões de hectares que, somados aos 119 milhões já destinados aos indígenas, chegariam a 27,8% de todo o território brasileiro, segundo o Observatório Jurídico do Agro.



Há 487 reivindicações de novos territórios indígenas em todo o país aguardando aprovação pela Funai, e outras 120 áreas estão em estudo para serem reivindicadas. Imagem: Observatório Jurídico do Agro


No entanto, os 14% do território nacional pertencentes aos índios atualmente já são suficientes para evidenciar como a política indigenista trava obras públicas, gera indenizações volumosas para Organizações não governamentais (ONGs) e interfere nas melhorias de infraestrutura, inclusive, para os próprios índios. “Só pra instalar energia elétrica aqui, temos que enfrentar uma série de burocracias”, afirma a líder indígena Ysani Kalapalo, do Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso.

De acordo com o ex-senador Telmário Mota, natural da comunidade indígena Teso do Gavião, em Roraima, a situação abrange centenas de obras, como construção de pontes em áreas que alagam durante vários meses do ano no Norte do país, pavimentação de estradas de terra em condições precárias e até reforma de escolas.

“A população consegue o investimento, inclusive para beneficiar o próprio índio, mas perde a oportunidade de fazer a obra porque não tem liberação da Funai e dos demais órgãos ambientais”, lamenta o economista e político, ao citar como exemplo a implantação do Linhão de Tucuruí, que demorou 12 anos para sair do papel devido aos pedidos de compensação da Associação Comunidade Waimiri-Atroari (ACWA).

Imagem do Ramal Sissaíma, no município de Careiro da Várzea, no Amazonas, que tem R$ 14 milhões disponível para a pavimentação, mas ainda não obteve licença ambiental para a obra. Foto: arquivo pessoal/Eduardo Barbosa


Indenização de R$ 90 milhões para liberar o Linhão de Tucuruí

Com o objetivo de interligar as capitais Manaus (AM) e Boa Vista (RR), o Linhão com 715 quilômetros de extensão precisa passar por 125 quilômetros de terras pertencentes aos indígenas. Com isso, a obra licitada em 2011 e com conclusão prevista para 2015 só foi começar este ano, em 2023.

Segundo Mota, o objetivo da instalação das torres de transmissão é integrar Roraima ao sistema elétrico nacional, já que o estado é o único que depende exclusivamente de energia proveniente de termelétricas, opção que encarece a conta de luz de todos os consumidores do país e que não é sustentável, pois depende do consumo de óleo diesel. No entanto, a negação das licenças ambientais pelos órgãos competentes e a briga na Justiça por uma indenização na casa dos R$ 180 milhões travaram a obra.

Apenas dez anos depois da licitação, o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro conseguiu aprovação do Plano Básico do Componente Indígena (PBA-CI) pela Funai e também a Licença de Instalação expedida pelo Ibama. Porém, a Justiça suspendeu a ordem de serviço e condicionou a liberação da obra ao pagamento de compensação milionária ao povo Waimiri-Atroari.


A própria Funai solicitou investigação do processo do Linhão

Em maio de 2021, o então presidente da Funai, Marcelo Teixeira, chegou a pedir investigação policial de funcionários da Fundação Nacional dos Povos Indígenas e também de membros da ACWA. No inquérito, o órgão informava que os Waimiri-Atroari e servidores da Funai estariam atuando para colocar “barreiras e entraves” à aprovação do projeto do Linhão.

Em nota de esclarecimento emitida pela Fundação em junho de 2021, o órgão explicou que era necessário investigar possível conflito de interesses no caso, já que existiria dentro da Funai estreita ligação familiar entre uma colaboradora de alto escalão e o fundador da associação que receberia a indenização milionária referente à obra. A mesma funcionária também seria parente de um dos advogados que representou a mesma associação no processo.

“Considerando que houve atuação de servidor da Funai que possui grau familiar próximo, em linha reta e colateral, a pessoas vinculadas à Associação Comunitária Waimiri Atroari (ACWA), incluindo participação na elaboração de documento técnico com sugestão de majoração em mais de 30% do valor da compensação dos impactos negativos não mitigáveis, que seriam pagos pelo empreendedor à ACWA, a apuração dos fatos se mostra essencial para a cabal elucidação do ocorrido”, informou a nota.

A hipótese informada violaria a Lei nº 12.813/2013, que proíbe “praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro, ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau”. Entretanto, o Ministério Público Federal do Amazonas pediu arquivamento do caso, e até hoje ninguém foi investigado.

As negociações continuaram e a associação chegou a recusar um acordo proposto no valor de R$ 50 milhões. O embate na Justiça continuou, e o valor pago pelo governo foi de R$ 90 milhões, dando início às obras em agosto de 2023.


Outros casos relatados na CPI Funai e Incra, em 2016

Além das indenizações exigidas para que obras como o Linhão de Tucuruí saíssem do papel, o ex-diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), ex-ministro do governo Bolsonaro e atual governador de São Paulo, Tarcísio Freitas, aponta outros “favores” solicitados por representantes dos indígenas durante as obras.

Em seu depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) Funai e Incra, realizado na Câmara dos Deputados em 2016, Tarcísio, que também é engenheiro e militar da reserva, relatou condições que eram impostas ao DNIT por representantes indígenas entre 2011 e 2015.

Segundo ele, ordens precisavam ser cumpridas na terra indígena dos Parakanãs, na rodovia Transamazônica (BR-230), por exemplo, para que obras nas estradas fossem concretizadas. “E sempre a posição era: ‘Cumpra-se! Tem que cumprir, tem que atender!’”, relatou, citando que o DNIT chegou a pagar a vigilância de uma aldeia “e que essa vigilância teria que ser feita pelos próprios indígenas”.

No depoimento, Tarcísio explica que os valores eram gerenciados pela Fundação dos Parakanãs, pois essa era a condição “para que a restrição da licença de instalação fosse retirada”. Além disso, ele cita que “na época foram pedidos R$ 1 milhão e pouco de repasse para a fundação” e que pagar o valor solicitado “era muito mais barato do que não fazer a obra”.

Já na BR-163, no Pará, a contrapartida para pavimentação da rodovia foi a abertura de outra estrada com 280 km de extensão entre a rodovia e a aldeia Kayapó. “Uma coisa pitoresca”, caracterizou o ex-diretor do DNIT, já que essa foi a exigência feita pela Funai para reduzir o impacto negativo da rodovia. “Será que isso faz sentido?”, questionou Tarcísio durante a CPI, ao citar ainda que a obra teve aumento de R$ 103 milhões devido aos estudos relacionados à área indígena afetada.

“Aí a gente começa a enxergar alguns interesses por trás disso. E, muitas vezes, os próprios indígenas são vítimas desses interesses, são usados por esses interesses”, continuou o ex-diretor. “De repente essas ONGs [estejam] atuando e agindo junto ao Ministério Público para não deixar que empreendimentos saiam e a gente dê um salto em termos de produtividade. Não sei se isso acontece, mas é uma teoria que pode vir à cabeça”, disse Tarcísio.


“Aí a gente começa a enxergar alguns interesses por trás disso. E, muitas vezes, os próprios indígenas são vítimas desses interesses, são usados por esses interesses”, afirma o ex-diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e atual governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas .


CPI das Ongs no Senado quer saber de onde vem o dinheiro e para onde vai

Essa e outras teorias envolvendo as Organizações não governamentais que representam os índios têm sido analisadas na CPI das ONGs, onde senadores buscam entender quem financia essas entidades, com quais valores e o que é feito com os montantes. “Sabemos que há entrada de capital estrangeiro, mas que isso não chega nas aldeias”, disse o senador Plínio Valério (PSDB-AM), presidente da CPI.

Então, “o que eles fazem com esse dinheiro? Eles gastam entre eles, e o que nos irrita ainda mais é a forma que essa gente desdenha do brasileiro”, afirmou o congressista na CPI, explicando que o aparente aumento na quantidade de indígenas no país é resultado do extermínio da nação mestiça. “Estão tornando os mestiços em indígenas para ocupar os locais que querem demarcar”.

No entanto, ele garante que essas demarcações não interessam ao índio. “O indígena que não é catequisado pelas associações vai dizer que o problema dele não é terra, mas políticas públicas”, pois eles já possuem território equivalente a cerca de 99 campos de futebol para cada um.

Residência do indígena Augusto Duarte, da etnia Mura, do Amazonas. "Vivemos em pobreza". Foto: Arquivo pessoal/Augusto Duarte| Arquivo pessoal/Augusto Duarte


De acordo com o indígena Augusto Duarte, da etnia Mura, do Amazonas, novas terras apenas prejudicam o povo indígena, que está abandonado dentro dessas áreas imensas. “Vivemos em pobreza”, afirma o homem ao mostrar a residência de sua família: um pequeno casebre de madeira e teto de palha. “Não queremos mais terras”, diz.

Assim como ele, a líder indígena Ysani Kalapalo, do Mato Grosso, concorda. Afinal, segundo ela, os indígenas já possuem grandes territórios, mas não têm liberdade para usufruir deles. “Não podemos plantar o que a gente quer” e para “tudo temos que pedir permissão à Funai, Ibama e ONGs”, relata em um vídeo nas redes sociais. “Parece que estamos vivendo dentro de uma prisão verde, é assim que enxergo a terra indígena”, finaliza.

A Gazeta do Povo entrou em contato com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. Outras entidades citadas na reportagem também foram procuradas, e o espaço segue aberto para respostas.


Raquel Derevecki, Gazeta do Povo


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Ao menos 4 generais do Alto Comando apoiaram intervenção; Bolsonaro descartou

 

Patriotas em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, antes das eleições 2022| Foto: Joédson Alves / EFE / Arquivo


Ao menos quatro generais do Alto Comando do Exército teriam sido favoráveis ao acionamento do artigo 142 da Constituição para o que consideravam o restabelecimento da ordem institucional no Brasil após as eleições de 2022. Dois deles discutiram essa conjuntura com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), entre novembro e dezembro do ano passado, segundo militares da reserva ligados ao caso. O então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, teria sido contra qualquer tipo de intervenção e o próprio Bolsonaro teria descartado a possibilidade após a consulta. Assim, dos 17 generais do Alto Comando, ao menos quatro seriam favoráveis.

A existência de generais favoráveis ao uso do artigo 142 da Constituição vai contra a afirmação do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, de que "em momento nenhum" as Forças Armadas se interessaram pela intervenção.

Segundo uma fonte com conhecimento das reuniões entre Bolsonaro e militares da cúpula das Forças Armadas, dois generais do Alto Comando teriam participado de duas reuniões envolvendo o então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, e o ex-presidente Bolsonaro no Palácio da Alvorada. Esses dois generais teriam se mostrado favoráveis ao uso do artigo 142.

O acionamento seria motivado por desmandos do Judiciário, por alegada falta de transparência e por desproporcionalidade no processo eleitoral - particularmente devido à concessão de menor tempo de propaganda eleitoral no rádio para Bolsonaro.

Eles interpretaram equivocadamente que o artigo poderia ser invocado para o restabelecimento da ordem institucional no país por meio de intervenção das Forças Armadas. Mas em nenhum momento teria havido intenção de dar um golpe de Estado não embasado por leis, segundo afirmou a fonte.

O debate sobre intervir ou não para restabelecer a ordem institucional no país foi levado posteriormente para uma reunião do Alto Comando do Exército, onde supostamente houve uma discussão de conjuntura que analisou diversos aspectos, como a segurança das urnas e a condução do processo eleitoral.

Além desses militares do alto escalão, uma parcela considerável de oficiais mais baixos na cadeia hierárquica e praças compartilhavam da opinião. Parte desses militares levava em conta informações, até agora não comprovadas por documentos, de que os próprios informes de inteligência do Exército sobre a conjuntura teriam sido amenizados por colegas que seriam contra o acionamento do artigo 142 da Constituição.

Fontes militares da ativa do alto escalão disseram à reportagem que houve muito descontentamento. Por isso seria plausível atribuir a percepção de que os informes teriam sido amenizados a percepções pessoais de quem era favorável ao uso do artigo 142.

A fonte ouvida pela Gazeta do Povo afirmou que até mulheres de generais que fazem parte do Alto Comando do Exército teriam frequentado os acampamentos que foram instalados em frente a unidades militares.

Contudo, o posicionamento final coube ao comandante do Exército, Freire Gomes, que decidiu pela não intromissão da instituição no processo político.


Ministro da Defesa acusou ex-comandante da Marinha de não estar do lado da lei

Na quinta-feira (21), o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, acusou o ex-comandante da Marinha Almir Garnier de não estar 100% ao lado da lei, afirmando que ele teria sido favorável a uma intervenção baseada no artigo 142 da Constituição.

A declaração foi feita depois que UOL e o Globo (não por acaso, integrantes do 'consórcio de imprensa' que defendeu a retomada da corrupção que Bolsonaro havia interrompido durante o seu governo, haja vista que estatais passaram a dar lucro - a administração pública era comandada por técnicos) publicaram que, em sua delação premiada, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, teria dito que o ex-presidente recebeu uma minuta de decreto para convocar novas eleições e fazer prisões depois do pleito presidencial que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a submeteu à análise de militares.

Segundo as reportagens, Cid teria dito que Garnier teria se manifestado favoravelmente ao teor da minuta. A informação, porém, ainda não foi confirmada por fontes oficiais e nem pelo advogado de Cid.

A reportagem apurou que essas informações causaram revolta nos círculos de apoiadores de Jair Bolsonaro. Isso porque o vazamento teria o objetivo de dar a ideia de que apenas o ex-presidente e Garnier teriam cogitado a possibilidade de acionamento do artigo 142. Segundo apoiadores, pelo contrário, muitas pessoas cogitaram a possibilidade, mas ela não foi levada adiante.

Havia uma interpretação equivocada entre eles que o acionamento do artigo 142 poderia ser feito dentro da lei, sem desrespeito à Constituição.


Exército teria que fazer plano para intervenção

Para uma intervenção baseada no artigo 142 da Constituição, o Exército teria que criar um documento chamado Diretriz de Planejamento Operacional Militar (Depom). Em tese, se tivesse sido elaborado, tal plano poderia trazer detalhes sobre o uso de unidades militares nas ruas para o alegado restabelecimento da ordem institucional.

Uma suposta troca de mensagens entre o coronel Jean Lawand Júnior e Cid, que está em poder da polícia, teria dado a entender que um plano dessa natureza teria sido feito pelo Comando de Operações Terrestres. O suposto documento nunca veio à tona.

Um membro da ativa do alto escalão do Exército disse à reportagem que pode ter havido uma confusão de informações, na medida em que o documento poderia se referir ao planejamento de uma operação de Garantia de Votação e Apuração, que é o apoio militar dado às autoridades eleitorais nos dias de votação.

Membros do Alto Comando do Exército ouvidos pela reportagem não descartam ter havido divergências sobre a possibilidade de acionamento do artigo 142 da Constituição. Eles destacam, porém, que essas discussões de conjuntura fazem parte do processo decisório e que, uma vez que o comandante tomou sua decisão final pela não intervenção, as vozes dissonantes cessaram. Por isso, não haveria hoje qualquer sinal de divisão política dentro da mais alta cúpula do Exército.


Forças Armadas se manifestam

Por meio de nota, a Marinha informou que não teve acesso ao conteúdo da delação de Cid e que eventuais opiniões individuais não representam o posicionamento oficial da Força. Confira a nota da íntegra:

“A Marinha do Brasil (MB) esclarece que não teve acesso ao conteúdo de delação premiada do Tenente-Coronel Mauro Cid. Além disso, esta Força Naval não se manifesta sobre processos investigatórios em curso no âmbito do Poder Judiciário.

Consciente de sua missão constitucional e de seu compromisso com a sociedade brasileira, a MB, Instituição nacional, permanente e regular, reafirma que pauta sua conduta pela fiel observância da legislação, valores éticos e transparência.

A MB reitera, ainda, que eventuais atos e opiniões individuais não representam o posicionamento oficial da Força e que permanece à disposição da justiça para contribuir integralmente com as investigações”.

Ao UOL, o Exército informou que tem colaborado com as investigações, que não comenta processos apuratórios em curso e que “pauta sua atuação pelo respeito à legalidade, lisura e transparência na apuração de todos os fatos que envolvam os militares”. Leia a nota do Exército:

"[O Exército] vem acompanhando as diligências realizadas por determinação da Justiça e colaborando com todas as investigações. E "pauta sua atuação pelo respeito à legalidade, lisura e transparência na apuração de todos os fatos que envolvam os militares".

Ao responder ao questionamento do UOL sobre a delação de Cid, o Exército respondeu que “a Força não se manifesta sobre processos apuratórios em curso, pois esse é o procedimento que tem pautado a relação de respeito do Exército Brasileiro com as demais instituições da República".



Luis Kawaguti, Gazeta do Povo