O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu em entrevista ao GLOBO que o fenômeno de proliferação de laranjas entre as candidaturas femininas da última eleição deve-se à interferência do Judiciário na interpretação sobre a aplicação dos recursos do fundo eleitoral. Em maio do ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que 30% do financiamento público dos partidos deveria ser destinado à candidatas mulheres (assim como os horários de propaganda eleitoral na televisão e no rádio).
— Toda vez que o Judiciário legisla, dá problema. Nós colocamos recursos para as mulheres no fundo partidário, de 5 a 15%, eu fui o relator. Nós ampliamos a participação das mulheres no programa semestral dos partidos, que agora acabou. E a Justiça resolveu pegar essa decisão nossa e levar como interpretação de que se o número de vagas é de 30%, o financiamento é 30%. Todos nós avisamos que isso seria problema — disse o parlamentar.
Maia fez referência à discussão sobre o fundo partidário que ocorreu na Câmara durante a minireforma eleitoral de 2015. Na ocasião, ficou decidido que seriam transferidos entre 5% e 15% do fundo às candidatas afiliadas às legendas, bem como a iniciativas ligadas à causa feminina. No ano passado, a Procuradoria-Geral da República ajuizou uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a revisão da medida. O argumento, acatado posteriormente pela Corte, era de que existência de um limite para a transferência de valores é inconstitucional.
Em uma segunda ponderação, Maia ressaltou que nem todas as campanhas de mulheres que tiveram poucos votos após receberem repasse expressivo do fundo eleitoral são irregulares. Ele avalia que a sociedade brasileira ainda não está preparada para o financiamento público e com doações exclusivas de pessoas físicas.
— Foi ruim gente não ter tido a coragem, nesse caso o Senado, de regular o financiamento de empresas. Acho que o brasileiro não está preparada para o financiamento de pessoa física, de a sociedade fazer doação. Não tem essa cultura. Mais uma vez, quem tem mais prestígio vai receber mais doações. E vai ter sempre a crítica. Não de desvio, mas porque recebeu mais, porque aquele doou dinheiro — afirmou o presidente da Câmara.
Porte de armas rural
Além de opinar sobre as candidaturas laranjas, Maia também demonstrou o que pensa sobre o porte de arma dentro de propriedades rurais. Ele disse entender que o decreto do presidente Jair Bolsonaro sobre a posse de armas, assinado em janeiro, teria resolvido a questão em relação a áreas urbanas, mas defendeu a necessidade de se fazer uma legislação para garantir o uso de armamentos em todo o perímetro de uma propriedade e não apenas na casa de uma fazenda, por exemplo.
— Acho que o Estatuto tem um debate fundamental, polêmico e difícil, mas que precisa ser feito. Acho que em relação ao urbano, o decreto do presidente resolveu, acabando com o poder discricionário da Polícia Federal que no estado A dava a posse e no B não. O grande debate que precisa ser feito é o porte rural. A posse rural não serve pra nada, porque é dentro da sede. E nós sabemos que se hoje há problemas de segurança nas cidades, imagine no campo — defendeu Maia.
Ele disse que na regulamentação deste tipo de porte é preciso fazer um debate profundo para se evitar a formação de "milícias" no campo.
— Qual o limite disso para não virar milícia armada? Não sei, porque não sou especialista. Mas tem que fazer esse debate. Qual a regulação? Aí eu não sou da área, não entendo e não me atrevo a falar. Mas acho que esse é um debate da agenda do presidente Bolsonaro que precisa ser feito — disse.
O presidente da Câmara defendeu o endurecimento de penas para o enfrentamento ao tráfico de drogas e de armas.
— Acho que o endurecimento da legislação é muito importante. É preciso uma legislação que sinalize para a sociedade que o crime não vai compensar no Brasil — disse Maia.
Ele afirmou que a tendência é que o projeto enviado pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, que trata do tema seja apensado a outro construído pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Mas ressaltou ainda não ter tomado essa decisão nem definido a tramitação das medidas.
— É muito difícil que um não seja apensado ao outro. No enfrentamento ao crime organizado, há muitas coisas em comum. Inclusive, alguns artigos o ministro Moro pegou do ministro Alexandre de Morais. Não me parece justo um projeto anterior, que deu origem a alguns artigos do posterior, ser suprimido para apoiar o posterior. Não é uma questão de autoria. É uma questão de enfrentamento ao crime organizado. É preciso analisar. Ainda não está definido. Estamos discutindo: se vai apensar ou não e a melhor tramitação. Se vamos ter comissão especial, debates com juristas antes, para que dê tempo para a Previdência andar antes — afirmou.