sábado, 29 de março de 2014

Sindicatos receberam R$ 3,2 bilhões de imposto em 2013, alta de 13%

Há 2.100 entidades à espera de aval do Ministério do Trabalho

 
Germano Oliveira - O Globo
 
 
Todos os 41,3 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira assinada terão desconto, compulsoriamente, na folha de pagamento deste mês de março, do valor de um dia de trabalho como contribuição sindical. É este dinheiro que sustenta os sindicatos no Brasil. No ano passado, a arrecadação foi de R$ 3,2 bilhões, rateados entre os 15.315 sindicatos. Uma alta de 13% frente a 2012. E neste ano, podem ser financiados também os 2.100 novos sindicatos que estão em fase de criação. Os próprios sindicalistas admitem que muitos são criados apenas para garantir os repasses das verbas do imposto sindical.

— São sindicatos de gaveta, abertos sem qualquer organização social e política. Em muitos casos, o trabalhador nem sabe que o sindicato existe. Todos por conta do imposto sindical — denuncia Wagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), principal central sindical do país.

O secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Manoel Messias, confirma que grande parte dos sindicatos em processo de legalização no ministério está de olho apenas na contribuição sindical.

— Desses 2.100 novos sindicatos, há os que estão sendo criados só para se obter o imposto sindical, mas 70% dos pedidos não deverão prosperar. Muitos estão com os processos no ministério há anos e poderão ser arquivados por falhas processuais ou até conflito de base sindical — minimiza Messias.

Ele explicou que entre os novos sindicatos estão 500 de trabalhadores rurais e 50 de pescadores, além de um grande número voltado para servidores municipais espalhados pelas 5.500 cidades brasileiras.

Todas as centrais sindicais recebem a contribuição sindical, incluindo a própria CUT. Wagner Freitas, no entanto, explica que a central não concorda com a cobrança.

— A CUT é contra a contribuição sindical, por considerar que o imposto, assim como toda a legislação trabalhista, é arcaica e não atende aos interesses dos sindicatos. O ideal seria que os sindicatos tivessem liberdade de associação e que os trabalhadores pudessem manter os sindicatos com as mensalidades associativas — diz.

O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, não só é contra a cobrança compulsória do imposto, mas chegou a recorrer à Justiça para deixar de receber a contribuição. A liminar, garantindo que o dinheiro não seria cobrado dos associados, vigorou de 1996 a 2005.

— Nesse período, ficamos sem cobrar o imposto, até que, em 2005, o Ministério do Trabalho conseguiu cassar a liminar e o imposto voltou a ser recolhido. O Ministério do Trabalho também tem interesse, pois fica com 10% do bolo. Nós, contudo, passamos a devolver esse dinheiro aos nossos associados. Só no ano passado, foram R$ 4 milhões — conta Rafael Marques, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

O presidente da Força Sindical, Miguel Torres, afirma que a entidade recebe o dinheiro e não é a favor de "se acabar simplesmente" com o imposto.

— Temos que ter alternativas, como uma contribuição estabelecida nas negociações salariais —diz Torres.
Sistema só existe no Brasil

O presidente licenciado da Força, deputado Paulo Pereira da Silva (Solidariedade-SP), também acha que precisa haver uma reforma para criar alternativas à cobrança. Segundo ele, os sindicatos não sobrevivem sem o imposto, mas é preciso que se deixe de criar tantos sindicatos no Brasil.

— Tem sindicato em que se juntam três pessoas, uma que faz o papel de presidente, outra de secretário e uma terceira de tesoureiro. Esses têm que acabar. O Ministério do Trabalho hoje só serve para dar carta de funcionamento para sindicato fantasma — reclama Paulinho.

Marques argumenta que metalúrgicos do ABC estão preparados para sobreviver sem o imposto, o que não acontece com a maioria.

— Temos 72 mil sócios, que representam 70% da categoria do ABC. Com essa alta taxa de sindicalização, não precisamos da contribuição compulsória. Vivemos da taxa associativa e também das taxas negociáveis nos acordos trabalhistas, que dá em torno de 4% do que conseguimos nas campanhas salariais. Temos outra receita também que é 6% de taxa negocial na participação de lucros e resultados. Esse é um modelo defendido pela CUT — explica

Especialistas, como José Pastore, dizem que nenhum outro país do mundo tem um sistema de financiamento com contribuição sindical obrigatória.

— A contribuição sindical é uma indústria de fazer dinheiro para sustentar os sindicatos, muitos criados só para obter essa contribuição compulsória. A legislação brasileira convida à criação de sindicatos. Como desde 2008, as centrais sindicais também passaram a receber a contribuição, houve um movimento de se estimular, de cima para baixo, a criação de novos sindicatos. Juntou a fome com a vontade de comer.

Autor do livro "Reforma sindical: para onde o Brasil quer ir?”, Pastore acha que a legislação que permite o imposto não muda por causa dos interesses existentes no Congresso.

— Os sindicatos elegem muitos vereadores, deputados e presidentes da República. A nossa legislação trabalhista tem 70 anos e não se consegue mudar devido aos interesses corporativistas.


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