segunda-feira, 31 de março de 2014

"Reformas econômicas modernizadoras” de Cuba: regime vai embolsar parte dos salários dos trabalhadores contratados

CUBA: "reformas econômicas modernizadoras” e pró-investimentos estrangeiros obscurecem fato abominável de que regime vai embolsar parte dos salários dos trabalhadores contratados



Blog Ricardo Setti - Veja

 
O Porto de Mariel, em Cuba, ampliado e modernizado com financiamento do BNDES: crucial para a "abertura econômica" da ditadura comunista (Foto: Reuters)
O Porto de Mariel, em Cuba, ampliado e modernizado com financiamento do BNDES: crucial para a “abertura econômica” da ditadura comunista (Foto: Reuters)


A papagaiada foi a de sempre, em regimes ditatoriais que pretendem exibir alguma fachada de democracia: os 612 deputados da Assembleia Nacional de Cuba aprovaram por unanimidade a nova lei de investimentos estrangeiros que, teoricamente, abre a economia da ilha para os capitais dos grandes centros.

Na verdade, tudo, como sempre, havia sido decidido pela meia dúzia de integrantes da cúpula do Partido Comunista, à frente o ditador Raúl Castro, 82 anos, e a medida rotulada de “histórica” visa, com investimentos de fora, injetar alguma modernidade no caquético aparelho produtivo cubano. O que funciona, hoje, na ilha, é o reduzido e controlado setor privado, que segundo dados oficiais, incluiria meio milhão de cuentapropistas, ou seja, pessoas que trabalham por conta própria em pequenos negócios.

A medida se soma à modernização e ampliação do porto de Mariel, financiada pelo Brasil, em torno do qual haverá uma espécie de “zona especial”, onde vai vigorar o regime capitalista, com livre circulação de moeda estrangeira e uma série de estímulos a investimentos, como ocorre na China.

Cuba quer atrair interessados em melhorar o setor agrícola e florestal, o comercio atacadista, ampliar e multiplicar as industrias, dinamizar os setores de energia, transportes, minas e construção, aprimorar o turismo e explorar com mais empenho petróleo em sua costa, diante das incertezas existentes quanto a continuar recebendo óleo a preços favorecidos pelo regime chavista da Venezuela que, como se sabe, faz água e enfrenta grave crise econômica.

Certos setores, porém, continuarão totalmente em mãos do Estado, como educação e saúde — ou seja, universidades ou hospitais estrangeiros privados de renome, por exemplo, não poderão, se quiserem, se instalar na ilha.

A Assembleia Nacional de Cuba "vota" o que a cúpula do Partido Comunista já havia decidido: abertura ao capital estrangeiro, mas controle na contratação de trabalhadores (Foto: Granma)
A Assembleia Nacional de Cuba “vota” o que a cúpula do Partido Comunista já havia decidido: abertura ao capital estrangeiro, mas controle na contratação de trabalhadores (Foto: Granma)

As medidas aprovadas são interessantes, e é preciso escarafunchar a nova legislação para encontrar, ali, o lado negro — as inventivas formas que o regime cria para explorar os trabalhadores cubanos.

Então, enquanto o regime chama a atenção para a isenção dos principais impostos por 8 anos a empresas estrangeiras que se instalarem na ilha, sistema que pode prosseguir se houver reinvestimento dos lucros, ou para regras que garantem segurança legal contra expropriações — se vierem a ocorrer, “por motivos de utilidade pública ou interesse social”, haverá indenização em dinheiro –, o ministro de Comércio Exterior e Investimentos Estrangeiros, Rodrigo Malmierca, deixou claro que não será autorizada a “livre contratação” de trabalhadores.

É o esquema dos médicos cubanos que vieram para o Brasil: a empresa estrangeira que quiser contratar um operário ou um engenheiro, por exemplo, deverá fazê-lo por meio do que Malmierca chamou “as entidades empregadoras do Estado cubano”. O que significa que, a despeito das promessas de que haverá negociação salarial para “estimular” os trabalhadores e tornar “eficientes” as empresas, o Estado vai embolsar parte do que os contratados receberão.

Como os “gatos” (agenciadores ilegais) de mão-de-obra no campo, no Brasil. Como se o Estado cubano fosse dono dos trabalhadores, e alugasse a terceiros o produto de seu esforço, deixando no ar um certo e revoltante ar de trabalho escravo.