quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Dilma e seus patéticos momentos. Ou: Manaus é a capital da Amazônia na Terra retangular

Blog Reinaldo Azevedo - Veja


Ai, ai… Dilma falou algumas coisas detestáveis sobre a Ucrânia e a Venezuela. Escrevi a respeito. No seu pior momento, sugeriu que a ditadura venezuelana tem de ser vista à luz de supostos avanços na saúde e educação. É um pensamento que se situa abaixo da linha da crítica.
Editorial desta quarta do Estadão,  muito sério — que chega a ser divertido —, destaca outro patético momento (em azul). Leiam. Volto em seguida.
*
Ela fala pelo Brasil
 
Até mesmo o lusófono presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, deve ter tido sérias dificuldades para entender os dois discursos da presidente Dilma Rousseff proferidos em Bruxelas a propósito da cúpula União Europeia (UE)-Brasil. Não porque contivessem algum pensamento profundo ou recorressem a termos técnicos, mas, sim, porque estavam repletos de frases inacabadas, períodos incompreensíveis e ideias sem sentido.
 
Ao falar de improviso para plateias qualificadas, compostas por dirigentes e empresários europeus e brasileiros, Dilma mostrou mais uma vez todo o seu despreparo. Fosse ela uma funcionária de escalão inferior, teria levado um pito de sua chefia por expor o País ao ridículo, mas o estrago seria pequeno; como ela é a presidente, no entanto, o constrangimento é institucional, pois Dilma é a representante de todos os brasileiros – e não apenas daqueles que a bajulam e temem adverti-la sobre sua limitadíssima oratória.
 
Logo na abertura do discurso na sede do Conselho da União Europeia, Dilma disse que o Brasil tem interesse na pronta recuperação da economia europeia, “haja vista a diversidade e a densidade dos laços comerciais e de investimentos que existem entre os dois países” – reduzindo a UE à categoria de “país”.
 
Em seguida, para defender a Zona Franca de Manaus, contestada pela UE, Dilma caprichou: “A Zona Franca de Manaus, ela está numa região, ela é o centro dela (da Floresta Amazônica) porque é a capital da Amazônia (…). Portanto, ela tem um objetivo, ela evita o desmatamento, que é altamente lucrativo – derrubar árvores plantadas pela natureza é altamente lucrativo (…)”. Assim, graças a Dilma, os europeus ficaram sabendo que Manaus é a capital da Amazônia, que a Zona Franca está lá para impedir o desmatamento e que as árvores são “plantadas pela natureza”.
 
Dilma continuou a falar da Amazônia e a cometer desatinos gramaticais e atentados à lógica. “Eu quero destacar que, além de ser a maior floresta tropical do mundo, a Floresta Amazônica, mas, além disso, ali tem o maior volume de água doce do planeta, e também é uma região extremamente atrativa do ponto de vista mineral. Por isso, preservá-la implica, necessariamente, isso que o governo brasileiro gasta ali. O governo brasileiro gasta um recurso bastante significativo ali, seja porque olhamos a importância do que tiramos na Rio+20 de que era possível crescer, incluir, conservar e proteger.” É possível imaginar, diante de tal amontoado de palavras desconexas, a aflição dos profissionais responsáveis pela tradução simultânea.
 
Ao falar da importância da relação do Brasil com a UE, Dilma disse que “nós vemos como estratégica essa relação, até por isso fizemos a parceria estratégica”. Em entrevista coletiva no mesmo evento, a presidente declarou que queria abordar os impasses para um acordo do Mercosul com a UE “de uma forma mais filosófica” – e, numa frase que faria Kant chorar, disse: “Eu tenho certeza que nós começamos desde 2000 a buscar essa possibilidade de apresentarmos as propostas e fazermos um acordo comercial”.
 
Depois, em discurso a empresários, Dilma divagou, como se grande pensadora fosse, misturando Monet e Montesquieu – isto é, alhos e bugalhos. “Os homens não são virtuosos, ou seja, nós não podemos exigir da humanidade a virtude, porque ela não é virtuosa, mas alguns homens e algumas mulheres são, e por isso que as instituições têm que ser virtuosas. Se os homens e as mulheres são falhos, as instituições, nós temos que construí-las da melhor maneira possível, transformando… aliás isso é de um outro europeu, Montesquieu. É de um outro europeu muito importante, junto com Monet.”
 
Há muito mais – tanto, que este espaço não comporta. Movida pela arrogância dos que acreditam ter mais a ensinar do que a aprender, Dilma foi a Bruxelas disposta a dar as lições de moral típicas de seu padrinho, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Acreditando ser uma estadista congênita, a presidente julgou desnecessário preparar-se melhor para representar de fato os interesses do Brasil e falou como se estivesse diante de estudantes primários – um vexame para o País.
 
Voltei

Pois é… Deixem o João Santana longe para ver… Dilma volta à sua natureza, assim como o rio sempre tenta retomar o seu curso. Eu nunca me esqueço do impacto que provocou em mim uma entrevista (ou algo assim) que Dilma concedeu ao apresentador Datena em abril de 2010. Ela ainda não havia feito “media training”.
 
Datena quis saber se ela acreditava em Deus — o petismo já estava preocupado em fabricar a imagem de uma candidata pia. Ela então despachou:

“Olha, eu acredito numa força superior que a gente pode chamar de Deus. Eu acredito e… E acredito, mais do que nessa força, se ocê (???) me permitir, acredito na força dessa deusa mulher que é Nossa Senhora.”
Heeeiiinnn?
 
Esse negócio de “força superior que a gente pode chamar Deus” pode ser qualquer coisa, né? Em certas circunstâncias, um vírus pode ser uma força superior — e, até onde se sabe, Deus não é. Maionese estragada também se torna força superior. A pessoa deixa de ser dona de seu destino. E cólica renal então? Até hoje, felizmente, só tive uma. Força superioríssima, se me permitem a graça! Luís Bonaparte, segundo Marx, acreditava que “a força superior” dos soldados era salsicha com alho.
 
Nada disso é Deus, acho… Mas o mais estupefaciente mesmo é Dilma chamar Nossa Senhora de “deusa”, fundando, assim, o catolicismo politeísta. Indagada sobre qual Nossa Senhora era de sua devoção, escolheu todas: de Aparecida, de Fátima, das Dores, a da Boa Morte… Arrematando com uma “Nossa Senhora de Forma Geral” — que é a padroeira dos políticos que não acreditam em Deus, mas fingem que sim para ganhar votos.
 
A Dilma de Bruxelas, som seus estranhos conceitos sobre geografia física e econômica e até sobre a botânica, fez lembrar aquela de abril de 2010. Embora nada vá superar — porque não haverá tão facilmente outro como ele na história deste país — as especulações de seu mestre, Luiz Inácio Apedeuta da Silva, ao fazer considerações físicas, metafísicas e extrafísicas sobre as vantagens de a Terra ser quadrada ou retangular. Não custa relembrar:
 

Se quiserem na minha interpretação, vai abaixo. Volto para arrematar.

Encerro
Manaus é a capital da Amazônia do planeta retangular. Os petistas ainda vão criar a sua própria física, a sua própria matemática, a sua própria biologia. Depois, claro!, de terem concluído a revolução moral que está em curso.