quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

"A pior petrolífera", por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

  • Na era chavista, num momento de alta demanda pelo óleo, a PDVSA conseguiu perder produção e reservas
O melhor negócio do mundo é uma companhia de petróleo bem administrada; o segundo, dizia Nelson Rockefeller, é uma petrolífera mal administrada. E o terceiro, acrescentou um gaiato brasileiro, é a Petrobras.

Seria a venezuelana PDVSA a quarta?
A gestão do negócio é um desastre. Na era chavista, num momento de alta demanda pelo óleo, a empresa conseguiu perder produção e reservas. Isso foi consequência de incapacidade gerencial, na medida em que os postos de comando da estatal foram preenchidos por políticos e militantes. Menos engenheiros, mais companheiros.

Mas como petróleo dá dinheiro mesmo com ofensas, o segundo grande desastre venezuelano foi na utilização das receitas da PDVSA. O que seria o certo? Investir primeiro na própria companhia, de modo a torná-la mais produtiva e mais rica — quando, então, pagaria mais dividendos e mais impostos para o caixa do governo. Com esse bom financiamento, o governo poderia fazer as políticas sociais que quisesse.

Chávez, porém, avançou no caixa da empresa. Convenhamos que era uma tentação irresistível para um político populista: todo mês, aquela montanha de dinheiro ali, dando sopa... Precisa comprar fogão para distribuir nas favelas? Manda a PDVSA comprar. Quem precisa de petróleo e faz fogão barato? A China. Negócio fechado.

Para Cuba e outros amigos, a PDVSA passou a entregar petróleo quase de graça e, ainda assim, pago com o trabalho de médicos e agentes do serviço secreto. Verdade que os médicos também são muito mal remunerados e os agentes, muito úteis para reprimir protestos. Mas o óleo continua saindo barato para os amigos e caro para a PDVSA.

Com tudo isso, não espanta que um dos maiores produtores e exportadores de petróleo do mundo tenha conseguido ficar sem dólares. O caos econômico em que o chavismo meteu a Venezuela é o desastre da PDVSA em escala nacional.

A Petrobras não é a PDVSA — qualquer um percebe isso. Mas, olhando no detalhe, parece que tem muita gente do governo querendo imitar os companheiros venezuelanos.

A estatal brasileira divulgou lucro em seu balanço na última terça. Ontem, as ações da companhia despencaram na bolsa. As ordinárias caíram abaixo dos R$ 13. Valiam mais de R$ 50 há apenas cinco anos.

Não é especulação de mercado. Reflete, por exemplo, a queda na produção nacional, embora existindo muito petróleo para ser explorado. Uma queda tão expressiva que se a produção subir 7% neste ano — conforme promessa da empresa —voltaria ao nível de 2010. Ou seja, a empresa está fazendo muito menos do que poderia. Por isso, vale menos.

A presidente da Petrobras, Graça Foster, ali colocada pela presidente Dilma, não critica a gestão anterior, do tempo de Lula. Mas tudo que ela faz e diz é, sim, crítica a seus antecessores. Diz que, para recuperar a companhia, está cortando custos e mudando sistemas de modo a ganhar mais eficiência e eliminar desperdícios. Feitos por quem?

Também criou um programa de prevenção a fraudes. Notaram a palavra “prevenção”? Pois é, por que não colocaram “combate” à corrupção? Porque seria um ataque direto aos antecessores, também petistas, como elas, Dilma e Graça.

Mas está claro para todo mundo que o programa foi anunciado quando apareceram denúncias fortes, inclusive no exterior.

O governo brasileiro não está avançando diretamente no caixa de sua petrolífera. Mas indiretamente, está. Ao reprimir os preços da gasolina e do diesel, para combater a inflação, o governo obriga sua empresa a importar por um preço e vender aqui mais barato. Prejuízo na veia, dívida em alta.
Nesse ambiente, manda a Petrobras ampliar seus investimentos, inclusive em refinarias alocadas politicamente, uma delas, a de Pernambuco, em sociedade com, ela mesma, a PDVSA.

Graça Foster diz, em resumo, o seguinte: OK, tivemos problemas, mas daqui em diante será diferente. Mas faz algum tempo que diz isso. E faz algum tempo que não consegue seus objetivos, como a crucial correção dos preços dos combustíveis.

E há detalhes, digamos assim, que inquietam. Descobriram que a Petrobras entrou com R$ 650 mil em patrocínios para o Congresso Nacional do MST — aquele em que os congressistas tentaram invadir o Supremo Tribunal Federal. Perguntada, a Petrobras disse que o dinheiro se destinava a uma mostra de cultura camponesa, parte do congresso, e que o patrocínio se alinha com o programa da estatal na direção de uma “produção inclusiva e sustentável”.

Petróleo “inclusivo e sustentável”? Nem a PDVSA conseguiria frase, assim, mais reveladora.





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