O Estado de São Paulo
As pesquisas eleitorais estão a indicar que os eleitores começam a mostrar
cansaço. Fadiga de material. Há 12 anos o lulopetismo impõe um estilo de
governar e de se comunicar que, se teve êxito como propaganda, demonstra agora
fragilidade. Toda a comunicação política foi centralizada, criou-se uma rede
eficaz de difusão de versões e difamações oficiais pelo País afora, os
assessores de comunicação e blogueiros distribuem comunicados e conteúdos a
granel (pagos pelos cofres públicos e empresas estatais) e se difundiu o "Brasil
maravilha", que teria começado em 2002. Ocorre que a realidade existe e às vezes
se produz o que os psicólogos chamam de "incongruências cognitivas". Enquanto os
efeitos das políticas de distribuição de renda (criadas pelos tucanos) eram
novidade e a situação fiscal permitia aumentos salariais sem acarretar
consequências negativas na economia, tudo bem. O cântico de louvor da propaganda
encontrava eco na percepção da população.
Desde as manifestações de junho passado, que pegaram governo, oposição e
sociedade de surpresa, deu para ver que nem tudo ia bem. A insatisfação estava
nas ruas, a despeito das melhorias inegáveis do consumo popular e de alguns
avanços na área social. É que a própria dinâmica da mobilidade social e da
melhoria de vida e, principalmente, o aumento da informação geram novas
disposições anímicas. As pessoas têm novas aspirações e veem criticamente o que
antes não percebiam. Começam a desejar melhor qualidade, mais acesso aos bens e
serviços e menos desigualdade.
O estopim imediato da reação popular foram os gastos da Copa, o custo do
transporte, a ineficiência, a carestia e a eventual corrupção nas obras
públicas. Ao lado disso, a péssima qualidade do transporte urbano, da saúde, da
educação, da segurança, tudo de cambulhada. Nada é novo, nem a reação provocada
por esse mal-estar se orientou, de início, contra um governo específico ou um
partido. Significou o rechaço de tudo o que é autoridade. Na medida em que o
governo federal reagiu propondo "pactos", que não deslancharam, e vestiu a
carapuça, a tonalidade política mudou um pouco. Mas o rescaldo dos protestos - e
não esqueçamos que eles têm causas - foi antes a criação de um vago sentimento
mudancista do que um movimento político com consciência sobre o que se quer
mudar.
Os donos do poder e da publicidade perceberam a situação e se aprestam a se
apresentar com máscaras novas. Só que talvez a população queira eleger gente com
maior capacidade organizacional e técnica, que conheça os nós que apertam o País
e saiba como desatá-los. Essa será a batalha eleitoral do ano em curso. O
petismo, solidário com os condenados do mensalão a ponto de coletar "vaquinhas"
para pagar as dívidas deles, porá em marcha seus magos para dizer aos eleitores
que são capazes da renovação.
E a oposição? Terá de desmascarar com firmeza, simplicidade e clareza truque
por truque do adversário e, principalmente, deverá mostrar um caminho novo e
convencer os eleitores de que só ela sabe trilhá-lo. Os erros da máquina
pública, seu custo escorchante, a incompetência política e administrativa estão
dando show no dia a dia. As falhas aparecem nas pequenas coisas, como na
confusão armada a partir de uma simples parada da comitiva presidencial em
Lisboa, e nas mais graves, como o inexplicável sigilo dos gastos do Tesouro para
financiar obras em "países amigos".
Isso abriu espaço, por exemplo, para o
futuro candidato do PSDB dizer, com singeleza: "Uai, pena que a principal obra
da presidente Dilma tenha sido feita em Cuba, e não no Nordeste, tão carente de
infraestrutura". Sei que há razões estratégicas a motivar tais decisões. Mas na
linguagem das eleições o povo quer saber "quanto do meu foi para o outro". E
disso se trata: em quem o eleitor vai confiar mais para que suas expectativas,
seus valores e interesses sejam atendidos.
Daí que a oposição deve concentrar-se no que aborrece o povo no cotidiano,
sem desconhecer os erros macroeconômicos, que não são poucos.
Quanto à insegurança causada pela violência e pelo banditismo, é preciso
reprimi-los e está na hora de o PSDB apresentar um plano bem embasado de
construção de penitenciárias modernas, inclusive algumas sob a forma de
parcerias público-privadas, como foi feito em Minas Gerais. É o momento para
refazer a Lei de Execuções Penais e incentivar os mutirões que tirem das prisões
quem já cumpriu pena, como também pôr fim, como está fazendo São Paulo, às
cadeias em delegacias e, ainda, incentivar os juízes à adoção de penas
alternativas.
Não será possível, sem negar eventuais benefícios de mais médicos, mostrar
que a desatenção às pessoas, as filas nos hospitais, a demora na assistência aos
enfermos, nada mudou? E que isso se deve à incompetência e à penetração de
militantes partidários na máquina pública?
Por que não mostrar que o festejado programa Minha Casa, Minha Vida tem um
desempenho ruim quando se trata de moradias para a camada de trabalhadores
também pobres, mas cuja renda ultrapassa a dos menos aquinhoados, teoricamente
atendidos pelo programa? Sobra uma enorme parcela da população trabalhadora sem
acesso à casa própria, tendo de pagar aluguéis escorchantes.
Isso para não falar de um estilo de governo mais simples, mais honesto, que
diga a verdade, mostre os problemas e não se fie no estilo "Brasil maravilha".
De um governo mais poupador de impostos, reduzindo-os para todos e não apenas
para beneficiar as empresas "campeãs" ou "estratégicas". As oposições precisam
ser mais específicas e mostrar como reduzirão os absurdos 39 ministérios, como
eliminarão o inchaço de funcionários e fortalecerão critérios profissionais para
as nomeações. Também chegou a hora de uma reforma política e eleitoral. Não dá
para governar com 30 partidos, dos quais boa parte não passa de legenda de
aluguel.
Em suma, está na hora de mudar e quem tem a boca torta pelo cachimbo da
conivência com a corrupção, o desperdício e a incompetência administrativa, por
mais que faça mímica, não é capaz dessa proeza. O passado recente teve suas
virtudes, mas se esgotou. Construamos um futuro de menos arrogância, com
realismo e competência, que nos leve a dias melhores.