Maíra Amorim - O Globo
Em aula magna na FGV, ele lista os cinco pontos mais importantes para construir a carreira: risco, foco, sonho, gente e eficiência
“Não gosto de dar palestra. Para velho não dou palestra, porque não adianta muito.” A frase dá uma boa pista sobre a aversão a aparições pela qual é conhecido Jorge Paulo Lemann, o brasileiro mais rico do mundo, dono de uma fortuna de R$ 52 bilhões, segundo a Forbes. Mas em maio o empresário abriu uma exceção e participou de uma aula magna para alunos da Escola de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio. Foi até lá, disse, para tentar inspirar os jovens a “fazer acontecer".
Lemann contou sua trajetória, desde o início, no esporte, passando pela criação do Banco Garantia, pela aquisição das Lojas Americanas e a compra da Brahma, que viria a se tornar o conglomerado AB InBev, atual maior grupo cervejeiro do mundo, e a criação da 3G Capital, que controla o Burger King — e na última semana adquiriu a rede de cafés canadense Tim Hortons. Tudo para exemplificar os cinco pontos que considera mais importantes na construção de um negócio ou carreira: risco, foco, sonho, gente e eficiência. Veja os destaques da aula:
RISCO É PARA SER TOMADO
“Não sou professor, não sou intelectual, não tenho muitas teorias complicadas. Deveria falar sobre coisas que eu aprendi, que são muito importantes na vida econômica, mas que não são muito discutidas nas escolas. A primeira é risco. Eu considero o risco uma parte importante da vida, não só na vida comercial, mas em geral. Tudo tem risco e as pessoas têm que tomá-lo. E tenho notado que, quanto mais a pessoa estuda, menos risco ela quer tomar. Quer transformar risco em formuletas matemáticas e acaba não tomando a decisão. A única maneira de aprender é ir treinando aos poucos. Quem não se arrisca não faz nada, e quem faz tudo igual aos outros ficará igual aos outros, o que, em geral, é medíocre. Acho que todo mundo tem que tentar ser excepcional e fazer algo especial e diferente.”
COM O NOME RUIM NA PRAÇA
“No meu caso, primeiro comecei trabalhando numa financeira com várias outras pessoas bem formadas. Nós nos achávamos o máximo, e a financeira foi à falência... Em 66, com 26 anos, tinha perdido tudo, meu nome estava ruim na praça, mas ainda tinha ofertas pra trabalhar em empresas grandes e optei por ficar no mercado financeiro. Não quis trabalhar num banco grande. Optei por correr risco e fiquei no mercado financeiro porque ainda achava que dava para arriscar, e que minha carreira seria mais rápida se eu ficasse numa empresa menor do que se eu fosse trabalhar num negócio muito grande.”
COM PENA DA GERAÇÃO ATUAL
“O segundo ponto está no foco. Hoje em dia tem muita informação circulando por aí. Neste mundo de internet, é informação pra tudo quanto é lado. Na minha época, era mais fácil, não tinha tanta informação. As opções eram muito menores das que existem atualmente, então eu fico com pena de vocês, porque tem tanta oportunidade, tanta coisa... Está tudo mudando tão rapidamente, que eu acho o foco algo essencial. Esse negócio de ficar fazendo um pouquinho disso, um pouquinho daquilo, não dá certo. Tem que escolher em que você vai focar e ir em frente.”
OS FANÁTICOS POR FOCO
“Todas as pessoas que eu conheci de grande sucesso sempre foram fanáticos por foco. O Sam Walton, que construiu o Walmart, só pensava em loja dia e noite. O próprio Warren Buffet, que hoje é meu sócio, é um sujeito super focado naquela formuleta. Ele faz negócios diferentes, mas sempre dentro da mesma fórmula e é aí que dá certo.”
O MELHOR TENISTA DO MUNDO
“A terceira coisa importante é ter um sonho grande, tem que ter meta puxada. Isso é extremamente importante, e vocês vão querer atrair outras pessoas pra trabalharem com vocês. As pessoas gostam de vir quando há um sonho maior. Eu sempre tive sonho, queria ser o melhor tenista do mundo, depois a melhor corretora, depois o melhor banco de investimentos, depois a melhor cervejaria do Brasil, depois a maior do mundo e por aí afora. Em alguns você chega lá, outros não, mas, nessa caminhada, você sempre vai se tornar uma pessoa melhor.”
MIL ENTREVISTAS POR ANO
“A quarta coisa que eu descobri lá em 1971, quando fiz o Banco Garantia, é a importância de gente, gente boa trabalhando com você. Tinha pouco capital, não tinha nome, então tinha que descobrir alguma maneira de ser competitivo no mercado financeiro. Decidi que atrairia as melhores pessoas possíveis para se juntarem a mim. Conseguimos atrair pessoas excepcionais e gastávamos um tempo enorme em procurar gente boa. Quando o Garantia era pequeno, com 30/40 pessoas, entrevistávamos mil pessoas ao ano, procurando as que realmente seriam excepcionais.”
EFICIÊNCIA EM QUALQUER LUGAR
“O quinto ponto é eficiência. Nosso espírito é que tudo pode melhorar ou ser feito melhor, em qualquer lugar para onde você olhe tem coisa para melhorar. E eficiência poupa tempo e dinheiro.”
AMBEV x PETROBRAS
“Na realidade, empresas como Petrobras e Vale são muito maiores do que a Brahma, mas a Brahma vale mais do que elas no mercado (dados de maio, já que na última quinta, a estatal valia mais que a Ambev) basicamente por causa dessa formuleta que eu contei: ter gente boa, um sonho grande, ser eficiente e ter disposição pra tomar risco.”
APOSENTADORIA? NEM PENSAR
“Não conheço nada melhor que estar tentando chegar lá e fazer alguma coisa bem. Me perguntam: ‘vai fazer 75 anos e vai parar?’ (o aniversário foi este mês). A última coisa que quero é parar, estou a fim de ficar tentando fazer.”