domingo, 31 de agosto de 2014

"Chaplin e Hitler", por Carlos Heitor Cony

Folha de São Paulo

Havia um trabalho subterrâneo para que o Departamento de Estado expulsasse Chaplin do território norte-americano.

A luta estava nesses termos quando estoura a guerra de 1939. Ele sabe que, mais uma vez, diversos interesses estão em jogo. Interesses econômicos, luta por mercados consumidores e zonas de influência --as motivações de sempre.

Os Estados Unidos mantinham-se em prudente cautela, sem tomar partido no conflito. O governo esperou dois anos, esperou pelo massacre de Pearl Harbor para tomar uma decisão. A questão é muito controversa e devemos admitir que Roosevelt lutava contra as forças ocultas que sempre são eficientes em horas assim. O estadista do New Deal tinha uma política nitidamente antifascista, mas era quase uma voz isolada clamando na Casa Branca.

Precisou que a própria história criasse as condições objetivas para a decisão --e é possível, segundo alguns, que o próprio governo de Roosevelt tenha cooperado, por omissão ou tática, na catástrofe de Pearl Harbor.

O lançamento de "The Great Dictator" ("O Grande Ditador") provocou cólera em Hitler. Foram empreendidas diligências diplomáticas entre Berlim e Washington e o embaixador Hans-Heinrich Dieckhoff, representante oficial de Hitler junto ao governo dos Estados Unidos, ameaçou precipitar certas represálias.

Àquela época, os Estados Unidos mantinham vastos mercados consumidores na zona centro-europeia. A economia e o futuro da nação exigiam prudência. Os horizontes da guerra não estavam delineados, a impressão dominante era que Hitler sairia vencedor, e em breve espaço de tempo. Desta forma, o filme de Chaplin foi interditado, em nome das boas relações entre Washington e Berlim. Só ano e meio depois --depois de Pearl Harbor-- o filme foi novamente liberado.