Traços específicos de personalidade podem ter grande impacto na renda dos trabalhadores após os 30 anos de idade.
Essa é uma das conclusões de um estudo recente da pesquisadora Miriam Gensowski, da Universidade de Copenhague, que será apresentado em São Paulo na próxima terça-feira (2), em seminário da Fundação Itaú Social.
O trabalho de Gensowski reforça uma linha de pesquisa sobre o efeito das chamadas habilidades não cognitivas, que tem ganhado fôlego. Esse campo olha além da inteligência medida pelo QI.
Ganhou força com estudos do Nobel de Economia James Heckman –com quem Gensowski estudou e trabalhou na Universidade de Chicago–, que buscam identificar e mensurar o impacto de traços de personalidade, como extroversão e amabilidade, sobre o desempenho escolar.
Editoria de arte/Folhapress |
O estudo de Gensowski se soma a outros que têm dado um passo além da escola e analisado também o mercado de trabalho.
O insumo usado pela economista é uma pesquisa iniciada entre 1921 e 1922 pelo psicólogo Lewis Terman com crianças de alto QI nascidas por volta de 1910.
A base de dados resultante da chamada "pesquisa de Terman" tem a vantagem de ter sido alimentada durante várias décadas até 1991, com atualizações constantes sobre a vida dos participantes (856 meninos e 672 meninas).
Gensowski decidiu, pela primeira vez, tentar estabelecer uma relação entre os salários dessas pessoas quando chegaram à vida adulta e características de sua personalidade (registradas com base em análises de professores e pais, assim como em autoavaliações).
Segundo a autora, para os homens, características como meticulosidade e extroversão têm impacto positivo significativo nos salários. E o efeito aumenta conforme o grau de escolaridade.
Homens um degrau mais conscienciosos do que a média com, no máximo, o ensino superior aumentaram seus ganhos ao longo da vida em US$ 233,3 mil.
Para aqueles com a mesma característica, mas nível de escolaridade maior (no mínimo mestrado), a renda extra foi de US$ 571,6 mil.
Cada degrau equivale ao que se chama em estatística de um desvio padrão, usado para medir distâncias dos resultados em relação à média.
"É possível que homens com maior escolaridade estejam em melhor posição para escolher as profissões que valorizem mais seus traços de personalidade", disse Gensowski à Folha.
A autora também encontrou efeitos positivos da extroversão sobre salários.
AMÁVEIS DEMAIS
Já a amabilidade teve impacto negativo sobre a renda dos participantes da pesquisa, o que indica que talvez pessoas com essa característica sejam menos agressivas em barganhas salariais ou escolham profissões com remuneração mais baixa.
Homens mais neuróticos tendem a ter perda salarial se possuem, no máximo, ensino superior, mas não são "punidos" em termos de rendimentos caso possuam escolaridade mais elevada.
Para Gensowski, uma das suas principais descobertas foi o fato de o efeito da personalidade sobre a renda só se materializar após os 30 anos.
"Talvez características de um funcionário, como extroversão e meticulosidade, tenham maior impacto sobre a produtividade de uma empresa uma vez que ele atinja uma posição hierárquica mais alta", diz a economista.
MULHERES
Os resultados da pesquisa de Gensowski para as mulheres de alto QI acompanhadas pela pesquisa Terman são mais inconclusivos e ruidosos.
Para a autora, isso se explica pela inserção muito menor das mulheres da geração analisada no mercado de trabalho. Mas ela acredita que, se o experimento fosse repetido atualmente, o resultado seria semelhante ao encontrado para os homens