sábado, 24 de junho de 2017

"Para que serve o Brics?", por Marcos Sawaya Jank

Money Sharma - 16.out.16/AFP Photo
Brazilian President Michel Temer, Russian President Vladimir Putin, Indian Prime Minister Narendra Modi, Chinese President Xi Jinping and South African President Jacob Zuma pose for a group photo during the BRICS Summit in Goa on October 16, 2016. Indian Prime Minister Narendra Modi hosted leaders of the BRICS emerging powers at a summit seeking to boost trade ties and help overcome the bloc's economic woes.
Líderes dos Brics posam para foto na reunião de cúpula em Goa, na Índia, em 2016


Folha de São Paulo

O mundo se tornou muito mais globalizado após 1990, quando a revolução das tecnologias de informação e comunicação provocou uma drástica redução da assimetria entre países desenvolvidos e economias emergentes.

A incrível consolidação das cadeias globais de valor transferiu fábricas, renda, empregos e conhecimento para as economias emergentes.

O PIB relativo dos países do G7 (EUA, Alemanha, Japão, França, Reino Unido, Canadá e Itália) caiu mais de 20 pontos percentuais em apenas duas décadas: de 66% para 43% do PIB mundial.

Esse é o indicador que melhor ilustra o sucesso da globalização, ao gerar convergência e maior equidade entre os países do planeta.

De um lado, nos países ricos, o padrão de vida da próxima geração tende a ser inferior ao da atual, gerando frustação e sentimentos antiglobalização.

Do outro, nos países em desenvolvimento, a próxima geração vai melhorar de vida. Surge uma nova e pujante "classe média" na China, na Índia e em algumas economias emergentes da Ásia, do Leste Europeu e da América Latina.

Essa "repaginação" do mundo está por trás da formação de novas coalizões de países que não seguem a lógica econômica, cultural e geográfica do passado, como aconteceu no G7 e na União Europeia.

O grupo dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) é um desses casos. Anteriormente chamados de países-baleia, os Brics detêm 24% da área do planeta, 42% da população e 23% do PIB mundial —ante apenas 10% em 1990.

O Brics é hoje um dos maiores engajamentos internacionais do Brasil, com grande atividade política e diplomática: diálogo estratégico, segurança internacional, cooperação no G20, o Novo Banco de Desenvolvimento do Brics e outros.

Todavia, nas áreas que poderiam gerar oportunidades mais concretas de integração, como comércio e investimentos, o resultado do Brics ainda é irrelevante.

Um ótimo exemplo é caso do agronegócio. No 7º Encontro dos Ministros da Agricultura do Brics, que ocorreu na semana passada em Nanquim, na China, o ministro Blairo Maggi propôs a criação de um grupo de trabalho para monitorar e apresentar propostas concretas para ampliar os fluxos de comércio e investimento do agronegócio entre os cinco membros.

O valor bruto da produção agropecuária dos Brics passou de 24% para 42% do total mundial desde 1960. Boa parte dos 200 milhões de pessoas que sairão do status de "insegurança alimentar" nos próximos anos reside nos países do Brics, particularmente na China e na Índia. Mas a relação entre importações e consumo de produtos agropecuários ainda é muito pequena, da ordem de 10%.

Maggi propôs ainda a criação de um Fórum Empresarial Agrícola do Brics, com o objetivo de apresentar soluções de parceria e investimentos cruzados entre as empresas. O ministro deu o seu recado de forma clara e precisa, mas a resistência dos demais membros em avançar no agronegócio é enorme.

Oito anos após o seu lançamento, não há benefício algum em ser membro do Brics em termos de menores barreiras e facilitação de comércio, negócios e investimentos.

No caso do agro, uma maior integração dos países do Brics, mesmo que administrada pelos governos, traria imensos benefícios para todos em termos de segurança alimentar, desenvolvimento sustentável e cooperação tecnológica. A complementaridade entre os países é enorme e poderia ser mais bem explorada.

Na última década, o Brasil apostou boa parte do seu cacife diplomático no Brics e, sem dúvida, ganhou maior estatura geopolítica global, em linha com as mudanças que estão ocorrendo no poder econômico, político e cultural do mundo.

Mas isso não basta. É preciso buscar um padrão de comércio e investimentos mais justo, aberto e complementar, com resultados que justifiquem as centenas de reuniões que o Brics já promoveu.