Admar Gonzaga. Foto: Daniel Teixeira/Estadão
Julia Affonso - O Estado de São Paulo
Filha de Elida Souza Matos, mulher do ministro da Corte eleitoral, prestou depoimento como testemunha; ela disse não ter presenciado agressões físicas, mas afirma ter ouvido gritos de Admar: ‘escrota’, 'quero que você saia de casa para eu te ver na sarjeta'
A filha de Elida Souza Matos, mulher do ministro Admar Gonzaga, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), afirmou em depoimento à polícia que o padrasto é ‘bastante ciumento’ e que nunca permitiu que a mãe estudasse. Segundo Erica Carla Souza Matos, o ministro usa o status do cargo ‘para subjugar’ sua mãe, que é dona de casa.
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A mulher de Admar registrou um boletim de ocorrência contra o ministro do TSE na sexta-feira, 23, por injúria e lesão corporal – violência doméstica. Exibindo um ferimento no olho, ela relatou ter sido agredida física e verbalmente por Admar.
Elida realizou um exame de corpo de delito. Horas depois, no entanto, ao voltar para casa, ela decidiu fazer uma retratação e pediu para arquivar o caso.
Erica Matos, a enteada de Admar, afirmou que mora com a mãe e o padrasto. “Informa que não presenciou as agressões físicas, contudo ouviu os gritos do autor que falava em voz alta. Salienta que ouviu as agressões verbais perpetradas pela autor, que dizia: ‘puta’, ‘vagabunda’, ‘eu quero que todos vejam a pessoa com quem convivo’, ‘escrota’, ‘quero que você saia de casa para eu te ver na sarjeta’. Destaca que o autor e uma pessoa contra/adora e que usa do seu status de ministro para subjugar a vitima que é dona de casa. Salienta que o autor e bastante ciumento e que nunca permitiu que a vitima estudasse.”
Admar Gonzaga é um dos ministros indicados pelo presidente Michel Temer (PMDB) para o TSE. O ministro votou contra o pedido de cassação da chapa Dilma-Temer no histórico julgamento na Corte Eleitoral. Seu principal argumento foi o de que, apesar de haver provas sobre desvios e irregularidades envolvendo recursos irregulares da Petrobrás para partidos políticos, não se pode afirmar “categoricamente” que estes recursos abasteceram a campanha eleitoral.
O boletim de ocorrência contra Admar foi registrado na 1.ª Delegacia de Polícia, em Brasília. Em seu primeiro depoimento, Elida contou que convive com o ministro há 11 anos com união estável formalizada em cartório desde 2009 e citou uma briga há sete meses na qual acionou a Polícia Militar. Na ocasião, relatou, ‘não formalizou o ato’.
“Informa que teve um problema com o autor (Admar) no passado e por conta disso o relacionamento ficou conturbado. Hoje, após um discussão, o autor despejou enxaguante bucal no seu corpo. Ato contínuo, o autor empurrou a vítima, pondo suas mãos no rosto dela”, relatou.
No depoimento, foi destacado que o olho direito apresentava lesões (inchaço e roxidão).
Elida prosseguiu. “Como se não bastasse, o autor lhe agrediu moralmente proferindo palavras e frases como: “prostituta”, “vagabunda”, “você não serve nem pra pano de chão”, “escrota”, “você não vale o que eu represento” e “quer acabar com minha carreira?”. É imperioso ressaltar que a vítima salienta que, além das agressões físicas e verbais, sofre pressão psicológica. Isso porque, como ela é dona de casa e depende do agressor para o seu sustento, o autor a subjuga, valendo-se do seu status de ministro do TSE. Salienta que o autor é bastante agressivo.”
No mesmo dia, Elida voltou à delegacia e pediu retratação e o arquivamento da investigação. Ela declarou que a discussão havia ocorrido na madrugada por ciúmes dela e ‘que, após os fatos, no calor do momento, a declarante procurou a Polícia Civil para efetuar o presente registro policial’.
“Após registrar a ocorrência policial e comparecer ao IML, a declarante dormiu em um hotel e, por volta das 10h retornou para a residência do casal, local onde conversou com o seu companheiro e com ele se reconciliou. Que tudo não passou de uma discussão de casal e que a mesma já foi superada; que, de livre e espontânea vontade retornou a esta delegacia para, como acima mencionado, esclarecer os fatos e requerer o sobrestamento do presente feito; que, em relação às medidas protetivas de urgência, anteriormente requeridas, a declarante esclarece que não tem mais interesse no deferimento das mesmas, pois já se encontra reconciliada com seu companheiro.”
Na terça-feira, 27, o ministro Celso de Mello, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), pediu manifestação da Procuradoria-Geral da República. Celso de Mello ressaltou que ‘a ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada’.
O ministro afirma em sua decisão que a retratação feita por Elida ‘não possui qualquer eficácia em relação ao noticiado delito de lesões corporais’. Cabe ao Ministério Público, afirmou Celso de Mello, ‘adotar as providências que entender cabíveis.
COM A PALAVRA, O ADVOGADO ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO, O KAKAY, QUE DEFENDE ADMAR GONZAGA
“Para nós, advogados da Elida e do Admar, o que interessa foi o pedido de retratação. Nós sabíamos que esse pedido chegaria no Supremo Tribunal e o ministro teria que enviar ao Ministério Público, então, nossa expectativa é que, embora a retratação evidentemente não sirva para determinar o arquivamento, que ela indique para o Ministério Público uma falta de justa causa e que o Ministério Público decida pelo arquivamento. Não me parece necessário e conveniente fazer comentários sobre depoimentos sendo que houve retratação posterior. Nossa expectativa é que isso influencie o Ministério Público, que tem o poder de denunciar e que ele determine o arquivamento por falta de justa causa.”