O presidente Michel Temer, durante entrevista exclusiva à Folha em Brasília, em maio |
LETÍCIA CASADO
CAMILA MATTOSO
Folha de São Paulo
CAMILA MATTOSO
Folha de São Paulo
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou o presidente Michel Temer e seu ex-assessor Rodrigo da Rocha Loures ao STF (Supremo Tribunal Federal), nesta segunda-feira (26), sob acusação de corrupção passiva.
Segundo Janot, o peemedebista foi o destinatário final de uma mala contendo propina de R$ 500 mil e de uma promessa de outros R$ 38 milhões em vantagem indevida, ambas da empresa JBS.
O intermediário das operações foi, segundo Janot, Rocha Loures, preso desde o dia 3 de junho e filmado pela polícia correndo com a mala contendo os R$ 500 mil. A informação de que a denúncia ligaria Temer à mala com propina foi antecipada pela Folha no último dia 11.
Janot pede que o presidente seja condenado a pagar R$ 10 milhões por danos morais à coletividade. Já o ex-assessor de Temer, R$ 2 milhões.
É a primeira vez na história brasileira que um presidente da República é acusado formalmente de crime no exercício do cargo.
Em novembro de 1992, Fernando Collor também foi acusado de corrupção pela PGR, mas na época estava afastado da Presidência e aguardava julgamento final de seu processo de impeachment no Senado, que ocorreria no mês seguinte. Collor acabou absolvido.
O procurador afirma que Temer "recebeu para si", por meio de Loures, a "vantagem indevida de R$ 500 mil ofertada" por Joesley Batista, sócio da JBS, e entregue na mala.
De acordo o procurador, o presidente recebeu os recursos "entre os meses de março a abril de 2017, com vontade livre e consciente" e "valendo-se de sua condição de chefe do Poder Executivo e liderança política nacional".
A PGR diz ainda que, "além do efetivo recebimento do montante espúrio mencionado", Temer e Loures "em comunhão de esforços e unidade de desígnios, com vontade livre e consciente, ainda aceitaram a promessa de vantagem indevida no montante de R$38 milhões".
A partir de agora, o ministro Edson Fachin, relator do inquérito no STF, deve decidir quando enviará a denúncia à Câmara dos Deputados, que precisa dar o aval para o Supremo decidir se abre ou não um processo contra o presidente. Para a autorização ser aprovada, são necessários os votos de pelo menos 342 deputados.
Se a ação penal for aberta, Temer se transforma em réu no Supremo, podendo então ser condenado ou absolvido ao seu final. A pena por corrupção passiva vai de 2 a 12 anos de prisão. O presidente tem negado as acusações.
Janot diz que Joesley Batista e Ricardo Saud, da JBS, não são alvos da denúncia em razão do acordo de delação premiada homologado pelo STF.
A denúncia por corrupção é baseada nas tratativas de Loures para receber os recursos da JBS e favorecer a empresa no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).
Segundo a PGR, houve "intervenção ilícita" dos denunciados para ajudar o frigorífico no órgão do governo. O procurador-geral afirma que "não há dúvida, portanto, de que o delito perpetrado pelos imputados Michel Temer e Rodrigo Loures, em comunhão de ação e unidade de desígnios, causou abalo moral à coletividade".
"Os crimes praticados à sorrelfa, valendo-se de seus mandatos eletivos, possuem alto grau de reprovabilidade", diz Janot.
Temer e Loures, ressalta o procurador, "desvirtuaram as importantes funções públicas que exercem, visando, apenas, ao atendimento de seus interesses escusos".
OBSTRUÇÃO
A PGR deve se debruçar ainda sobre uma possível denúncia por obstrução de Justiça contra o presidente.
Isso porque relatório final da Polícia Federal, entregue ao STF também nesta segunda, afirma que o presidente atuou para embaraçar investigações.
O documento diz ainda que Temer "deixou de comunicar as autoridades sobre suposta corrupção de membros do Judiciário e do Ministério Público".
Os delegados entenderam com base na gravação feita por Joesley Batista no Palácio do Jaburu que a "única interpretação possível" é de que o presidente incentivou a continuação de pagamentos para Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ex-presidente da Câmara, no sentido de que ele ficasse em silêncio – o ex-deputado está preso no Paraná desde outubro do ano passado.
Sobre Temer, a PF afirma ele atuou "por embaraçar investigação de infração penal praticada por organização criminosa, na medida em que incentivou a manutenção de pagamentos ilegítimos a Eduardo Cunha, pelo empresário Joesley Batista, ao tempo que deixou de comunicar autoridades competentes de suposta corrupção da Magistratura Federal e do Ministério Público que lhe fora narrado pelo mesmo empresário".
O procurador-geral afirmou que, na conversa, Temer ouviu de Joesley que o ex-presidente da Câmara estava sendo pago para não falar nada e sobre o assunto respondeu: "tem que manter isso, viu?", o que seria um aval.
Após a fala de Temer, Batista afirmou: "Todo mês", o que indica, segundo o empresário afirmou em seu acordo de delação premiada fechada com a PGR, acertos em dinheiro.
O relatório da polícia também seguiu na mesma linha, com a interpretação de que o diálogo no Jaburu significou o incentivo da compra do silêncio.