segunda-feira, 19 de junho de 2017

"Falsa alternativa", editorial de O Globo

Talvez não haja democracia em que não tenha ocorrido algum escândalo com o dinheiro da política. E se houver, é bastante provável que ainda venha a ocorrer. Mesmo na austera Alemanha, o ex-chanceler Helmut Kohl, com lugar na História por haver patrocinado a reintegração do país depois da falência do bloco soviético, sucumbiu a um dinheiro “não contabilizado” — no eufemismo lulopetista —, e encerrou a brilhante carreira como homem público.

A lista de casos deste tipo mundo afora é extensa. No Brasil sabe-se bem disso. Mas na vida pública brasileira há uma característica: existe sempre algum político e/ou partido em busca da fórmula perfeita e definitiva para acabar de vez com os males da política. Como se isso fosse possível. Desta cultura e costume decorrem mirabolantes e inexequíveis, por ilegais, propostas de Constituintes, por exemplo, e projetos vendidos como fórmulas mágicas como aqueles apetrechos apregoados por camelôs de esquina.

O combate à corrupção na política tem demonstrado enormes avanços no país, desde o processo do mensalão. E, no momento, com a evolução já da fase judicial do petrolão, este propinoduto bilionário escavado pela Lava-Jato.

Mas a cultura política brasileira do salvacionismo, do elixir milagroso, é sólida. Assim, em que pesem as lições que vêm sendo dadas no desmantelamento de esquemas corruptos e corruptores na política, em que surgem propostas de aperfeiçoamentos legais para conter as falcatruas neste universo, ainda há o delírio de fórmulas supostamente simples e definitivas.

Como a proibição do financiamento de campanhas por empresas — aprovada pelo Supremo — e a proposta da estatização completa das finanças da política. Completa, porque parte já é bancada pelo contribuinte — na formação do Fundo Partidário e no ressarcimento, pela redução de impostos, das emissoras de TV e rádio pelo horário de propaganda “gratuita”. Uma ironia.

Ora, está evidente que os mecanismos de formação de caixas 2 e de lavagem de dinheiro — há farta literatura sobre o tema nos autos da Lava-Jato — tornam a proibição total de recursos de pessoas jurídicas na política uma história da carochinha. Melhor seria rever a legislação que vigorava, para torná-la mais realista — um limite de percentual fixo do faturamento de toda empresa, independentemente do tamanho, era enorme erro, por exemplo —, além de uma legislação punitiva rigorosa e muito mais transparência no fluxo do dinheiro.

O PT se bate pelo financiamento público integral, sem qualquer preocupação com o peso já elevado da carga de impostos. Não há margem no orçamento familiar para mais gravames, muito menos a fim de financiar campanha de políticos que ele sequer conhece. Na verdade, esta bandeira lulopetista tem a ver com outro sonho partidário: a votação em lista fechada, para permitir o financiamento público integral. Resultará que a população ficará mais sobrecarregada por impostos e ainda perderá para os caciques partidários o poder de escolher o próprio candidato. Perda dupla.