Andrew Yates/Reuters | |
Jeremy Corbyn, líder do Partidos Trabalhista britânico durante campanha em Manchester |
DIOGO BERCITO - Folha de São Paulo
O Partido Trabalhista britânico deve receber o resultado das eleições da próxima quinta (8) e se olhar no espelho. O pleito será realizado sob o impacto dos ataques terroristas que ocorreram em Londres neste sábado (3)
A sigla de centro-esquerda que liderou o Reino Unido de 1997 a 2010 tem reduzido a vantagem em pesquisas aberta pelo rival Partido Conservador, da primeira-ministra Theresa May, mas pode amargar mais uma derrota.
Com isso, seria obrigada a reavaliar sua identidade.
Para seus detratores, o partido se tornou muito radical com a liderança de Jeremy Corbyn, 68, eleito sucessivamente em 2015 e 2016.
Ele empolga os militantes, propondo nacionalizações, um desmonte nuclear e impostos mais altos para os mais ricos. Mas não convence a cúpula do partido nem o restante do país, criando dúvidas sobre qual deve ser a vocação da sigla e quão à esquerda se posicionar.
Para o professor Adrian Pabst, da Universidade de Kent, a solução é amolecer. "A única maneira de mudar é a esquerda dura deixar o partido", afirma à Folha, referindo-se à ala radical de Corbyn. "Não existe lugar para eles no 'mainstream'."
Um empecilho à vitória trabalhista liderada por Corbyn, diz o professor, é que ele foi eleito por militantes que votam nas primárias para representar todo o partido, mas a opção não necessariamente é eficaz nas eleições gerais.
Ele é comparado ao americano Bernie Sanders, que concorreu à candidatura do Partido Democrata —mobilizava multidões de militantes, mas não venceu as prévias.
"Os ativistas são muito diferentes da maioria dos eleitores", diz Pabst. "Não convencem a todos porque não há coalizão de classes, e sim políticas para minorias."
Corbyn, para Pabst, fala a língua errada. "Ele não menciona temas que as pessoas querem ouvir, como o trabalho e a família", diz. O líder tampouco debate a nação —algo trivial, mas crucial.
Em um evento recente, Corbyn não cantou o hino nacional. Após o atentado em Manchester que deixou 22 mortos, ele deu a entender que o governo atraiu o ataque com sua política externa.
Tamanha é sua rejeição que uma pesquisa de abril mostrou que 36% dos eleitores trabalhistas queriam sua renúncia antes das eleições.
Esse cenário ajuda a explicar por que, mesmo com o avanço nas últimas semanas, o partido poderá perder.
Uma pesquisa do instituto Ipsos divulgada sexta (2) sugere que os conservadores vencerão com 45% dos votos, contra 40% dos trabalhistas. A sondagem foi feita de 30 de maio a 1º de junho, com 1.046 adultos, e margem de erro de 4 pontos percentuais. Os demais partidos somam 15%.
ÁGUA E VINHO
Peter Mitchell, vereador trabalhista em Liverpool, discorda dessas críticas. Não carece, diz, suavizar o discurso. "Corbyn tem um ideal mais radical do que a versão diluída dos outros líderes. Mas por que colocaríamos água em um bom vinho?"
Mitchell, membro do partido desde 1979, recebeu a Folha na Prefeitura de Liverpool, um dos bastiões trabalhistas. Todos os cinco parlamentares que representam a cidade -famosa pelos Beatles- são trabalhistas, assim como 80 dos 90 vereadores.
Parte dessa força vem do fato de a cidade ter sido especialmente afetada pela austeridade das últimas décadas. Mitchell, por exemplo, distribui comida em uma organização de caridade. "É vergonhoso, em uma grande economia com esta, pessoas terem de ser alimentadas", diz.
Ele reconhece que as previsões são desastrosas para seu partido, embora ache que a sigla possa surpreender.
Caso contrário, alerta, será preciso rever o trabalhismo com cautela. "Se perdermos, o partido pode rachar", diz. "Tentaram nos anos 80, criando o Partido Liberal-Democrata, e isso só dividiu o voto de esquerda. Foram anos para nos recuperarmos."
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Eleições gerais britânicas
Votação, antecipada pelo governo conservador, será em 8 de junho
Como funcionam
Parlamentares são eleitos por distrito (650, no total); portanto, a distribuição de assentos para cada partido não é proporcional à porcentagem de votos
Parlamentares são eleitos por distrito (650, no total); portanto, a distribuição de assentos para cada partido não é proporcional à porcentagem de votos
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Temas eleitorais
O que pode influenciar o voto
"Brexit"
O Reino Unido decidiu, em junho de 2016, deixar a União Europeia. Mas o "brexit" foi aprovado por apenas 52% dos votos, criando um debate público sobre o futuro do país. O Partido Conservador deve atrair quem concorda com a saída
O Reino Unido decidiu, em junho de 2016, deixar a União Europeia. Mas o "brexit" foi aprovado por apenas 52% dos votos, criando um debate público sobre o futuro do país. O Partido Conservador deve atrair quem concorda com a saída
Economia
O desemprego está em 4,6%, índice mais baixo desde 1975. Mas os salários crescem mais devagar que os preços
O desemprego está em 4,6%, índice mais baixo desde 1975. Mas os salários crescem mais devagar que os preços
PIB
0,2% foi o crescimento de janeiro a março de 2017, em relação ao mesmo período de 2016
0,2% foi o crescimento de janeiro a março de 2017, em relação ao mesmo período de 2016
Inflação
2,7% em comparação ao 0,5% anterior ao "brexit"
2,7% em comparação ao 0,5% anterior ao "brexit"
Segurança
País foi alvo de dois ataques terroristas neste ano. Em 22 de março, um homem matou cinco pessoas, incluindo um policial, na região do Parlamento, em Londre. Em 22 de maio, um homem-bomba deixou 22 mortos em um show da cantora americana Ariana Grande, em Manchester
País foi alvo de dois ataques terroristas neste ano. Em 22 de março, um homem matou cinco pessoas, incluindo um policial, na região do Parlamento, em Londre. Em 22 de maio, um homem-bomba deixou 22 mortos em um show da cantora americana Ariana Grande, em Manchester