terça-feira, 20 de junho de 2017

"Brasil, o país em que criminosos fazem o maior sucesso", por Clóvis Rossi

Folha de São Paulo


O Brasil é um país tão extraordinário que tudo o que já está muito ruim pode sempre piorar. Já se vivia um ambiente político apodrecido há bastante tempo, pelo menos desde a eclosão da Lava Jato (ou, para os mais realistas, desde que Cabral aportou por aqui).

Agora, no entanto, a putrefação ambiental fica ainda mais evidente no momento em que o presidente da República acusa o empresário Joesley Batista de ser "o criminoso notório de maior sucesso na história brasileira".

Que é criminoso, não resta dúvida. Ele próprio confessou crimes em série como o de comprar um cacho de parlamentares a ponto de gabar-se de ter a maior bancada no Congresso Nacional.

Que é um sucesso de bilheteria, tampouco se duvida. É talvez o maior retrato do que chamei de "capitalismo mafioso", característica do Brasil, em artigo publicado há exatamente um mês.

Danilo Verpa/Folhapress
Joesley Batista, dono da JBS, concede entrevista a Folha na sede da empresa em São Paulo.
O empresário e delator Joesley Batista, dono da JBS

Para quem não quer se dar ao trabalho de procurar, reproduzo parágrafos essenciais:

"Uma brilhante análise desse capitalismo mafioso está no artigo de Bruno Carazza para a Folha deste sábado (20 de maio). É imperdível de A a Z, mas vale ressaltar um trecho que generaliza corretamente:

'De acordo com as regras de funcionamento do nosso capitalismo de compadrio, o sucesso de boa parte de nossas grandes empresas foi construído mediante corrupção, sonegação de impostos e lavagem de dinheiro.

No melhor estilo 'rent seeking', nossos empresários investem em 'relações institucionais' em vez de bens de capital, tecnologia e produtividade da mão-de-obra'.

Acrescentei, à época e reafirmo agora: "Eu só trocaria 'capitalismo de compadrio' por 'capitalismo mafioso'. Os envolvidos, de um lado e outro do balcão, não são apenas compadres, são uma organização criminosa".

Não é coincidência que Joesley Batista tenha usado essa mesma expressão (organização criminosa) para se referir ao presidente Temer, na entrevista para a revista "Época".

É óbvio que Temer tem todo o direito de proclamar inocência até que se prove o contrário.

Mas como qualificar o presidente quando ele admite que recebeu na calada da noite, em sua própria residência, e sem registro na agenda esse "criminoso notório"? Seria um gesto de estadista?

A putrefação fica ainda evidente quando se sabe que outros líderes políticos que são ou foram relevantes na pátria degradada (Aécio Neves, Eduardo Cunha e Luiz Inácio Lula da Silva, para citar apenas os mais notórios) conviveram alegremente com o "criminoso notório".

Condenar os políticos por esse compadrio mafioso é necessário, mas é igualmente necessário não esquecer que "o sucesso de boa parte de nossas grandes empresas foi construído mediante corrupção, sonegação de impostos e lavagem de dinheiro", como escreveu Carazza.

Pior: justamente o que Temer diz ter sido o "de maior sucesso" está livre, leve e solto.

Não é um país extraordinário? Ou seria apenas ordinário?