Depoimentos dizem que Marcos Pereira, titular da Indústria, negociou repasse do caixa 2 da empreiteira em troca de apoio do partido à reeleição da chapa Dilma-Temer
BRASÍLIA - O ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, negociou um repasse de R$ 7 milhões do caixa 2 da Odebrecht para o PRB na campanha de 2014, segundo depoimento que integra a delação da empreiteira na Lava Jato. Os recursos, entregues em dinheiro vivo, compraram apoio do partido então presidido por Pereira à campanha de reeleição de Dilma Rousseff, que tinha Michel Temer como vice.
O dinheiro dado ao PRB fazia parte de um pacote maior, que envolvia também o apoio de PROS, PCdoB, PP e PDT à chapa governista. Ao todo, a Odebrecht colocou cerca de R$ 30 milhões na operação, como o Estado revelou em dezembro. O acordo é descrito, com diferentes pedaços da história, nas delações de Marcelo Odebrecht, ex-presidente e dono da empreiteira, e dos executivos Alexandrino Alencar e Fernando Cunha.
Sexto ministro de Temer citado na Lava Jato, na época Pereira tratou pessoalmente do assunto com Alexandrino, um dos 77 executivos da Odebrecht que fizeram acordo de delação já homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com as delações, Pereira esteve mais de uma vez na sede da Odebrecht em São Paulo para combinar como e a quem o dinheiro, entregue em parcelas, deveria ser repassado.
O ministro rebate as afirmações dos delatores. “Eu desconheço essa operação. Comigo não foi tratado nada disso”, disse. “Delação não é prova.”
Presidente licenciado do PRB, Marcos Pereira é homem forte no partido fundado por integrantes da Igreja Universal do Reino de Deus após o escândalo do mensalão. Ao Estado, ele contou que ajudava a arrecadar recursos para campanhas do seu partido, que tem 23 deputados, um senador e comanda a prefeitura do Rio, com Marcelo Crivella. A pasta da Indústria, embora tenha perdido poderes com Temer, continua sendo uma das mais relevantes do governo.
TV. O apoio do PRB e dos outros quatro partidos garantiu à chapa Dilma-Temer 2 minutos e 39 segundos a mais na propaganda eleitoral de televisão – totalizando mais de 11 minutos, ante apenas 6 minutos de Aécio Neves, o candidato do PSDB. O PRB recebeu R$ 7 milhões em troca de 20 segundos por dia de campanha.
Segundo os relatos dos executivos da Odebrecht, a empreiteira agiu a pedido de Edinho Silva, então tesoureiro da campanha de Dilma e hoje prefeito de Araraquara (SP), realizado num encontro com Marcelo e Alexandrino em São Paulo.
Feito o acerto, de acordo com os depoimentos, Alexandrino ficou encarregado de fazer com que PCdoB, PROS e PRB recebessem R$ 7 milhões cada um do departamento de propinas da Odebrecht. Fernando Cunha mandou R$ 4 milhões para o PDT. O Estado não conseguiu confirmar como foi a negociação com o PP.
Edinho Silva nega o acerto com a Odebrecht. “Não participei de tratativas com os partidos na época das composições. Eu ainda não era coordenador financeiro”, afirmou. Procurada, a Odebrecht informou que não iria se manifestar.
Os relatos de que houve compra de apoio partidário para a campanha Dilma-Temer poderão ser analisados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no processo que investiga abuso de poder político e econômico na campanha. O Estado apurou que o relator, ministro Herman Benjamin, decide nesta semana se vai requisitar os depoimentos, que estão na Procuradoria-Geral da República.
Outras Citações
Eliseu Padilha (PMDB) - Casa Civil
Cláudio Melo Filho, ex-executivo da Odebrecht, apontou Padilha como preposto de Michel Temer e do PMDB para receber valores, via caixa 2. Padilha negou ter arrecadado para o partido. Temer repudiou as declarações.
Moreira Franco (PMDB) - Secretaria-Geral da Presidência
Melo Filho citou tratativas com o ministro na área de aeroportos. Outro ex-executivo da Odebrecht, Paulo Cesena, também citou Moreira. O ministro disse que, como titular da Aviação Civil, sempre atuou “de acordo com as leis”.
José Serra (PSDB) - Relações Exteriores
Pedro Novis e Carlos Armando Paschoal, executivos da Odebrecht, relataram repasse de R$ 23 milhões, via caixa 2, à campanha presidencial de Serra em 2010. O chanceler negou irregularidades.
Gilberto Kassab (PSD) - Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
Paulo Cesena, da Odebrecht, mencionou doações de R$ 14 milhões para o ministro, em 2013 e 2014. Kassab afirmou que as doações recebidas foram legais.
Bruno Araújo (PSDB) - Cidades
Cláudio Melo Filho disse que mantinha “boa relação profissional e pessoal” com o então deputado, com quem tratou de temas como “política na Bahia” e “renovação dos contratos de energia no Nordeste”. Araújo disse que valores recebidos da empreiteira foram declarados à Justiça.