domingo, 26 de fevereiro de 2017

"Cúpulas resistem a democratizar partidos", editorial de O Globo

É sintomático que políticos recusem a acertada decisão da Justiça eleitoral de impedir que se eternizem intervenções dos caciques em diretórios regionais


Abaixa qualidade a que chegou a política no país tem causas múltiplas e se expressa também de várias formas. Nas raízes, há a proliferação excessiva de legendas, um incentivo ao toma lá dá cá do fisiologismo, por exemplo. Já entre as demonstrações da cultura de baixo clero que parece ter dominado o Legislativo, em todos os níveis — federal, estadual e municipal—, destacam-se conchavos despudorados na disputa por verbas e poder, apadrinhamentos em nomeações no Executivo com finalidades subalternas, entre outros inúmeros desvios de comportamento.

As articulações que resultaram na escolha de Osmar Serraglio para o Ministério da Justiça foram exemplares — no mau sentido. Por ser o novo ministro deputado paranaense pelo PMDB, bancadas do partido se dividiram. Não por questões de fundo, mas devido a razões paroquiais. Mineiros não gostaram da escolha apenas porque, acham, Minas estaria sub-representado no ministério Temer. E por isso alguns ameaçam votar contra a proposta da reforma da Previdência. Este é o nível.

Os partidos, na verdade, se tornaram instrumentos de caciques, cujos interesses costumam passar ao largo da agenda de temas fundamentais para a sociedade. Como a reforma previdenciária.

Neste sentido, é ilustrativa a manobra da Câmara, feita nas sombras, a fim de tentar aprovar, em regime de urgência, projeto de lei para impedir que a Justiça (TSE) aplique a lei eleitoral e casse o registro de legendas, caso tenham rejeitadas as prestações anuais de contas. Significa instituir uma exótica anistia prévia.

Outro dispositivo do mesmo projeto denuncia a maneira sub-reptícia com que agem cúpulas partidárias. Ele permite que se perpetuem comissões provisórias indicadas por dirigentes para intervir em diretórios. Trata-se de perenizar um instrumento ditatorial à disposição dos dirigentes.

Deputados começaram a se movimentar para perpetuar essas comissões, porque o Tribunal Superior Eleitoral baixou resolução com a finalidade de tornar temporário o funcionamento delas, a partir de 3 de março. Com a saudável intenção de desobstruir os canais de manifestação democrática dentro dos partidos. Por sinal, é gritante contrassenso que um dos símbolos da democracia, o partido, atue internamente sob o signo do autoritarismo. Mas é o que acontece. Reportagem do GLOBO contabilizou que 123 dos 270 diretórios dos dez maiores partidos se encontram sob essas comissões, sem prazo para serem suspensas.

Entende-se por que dirigentes se perpetuam nas direções nacionais de legendas. O PR é um símbolo neste aspecto. Tem todas as seções regionais sob intervenção. É por isso que o dirigente-mor do partido, Valdemar Costa Neto, sem mandato, continua com as rédeas da legenda. Mesmo quando esteve preso em regime fechado, condenado como mensaleiro. O projeto saiu de pauta, mas insistem em votar a parte das comissões.