Proteger sua credibilidade, mesmo decepcionando o mercado, foi um dos objetivos do Copom ao manter em 6,50% a taxa básica de juros em vez de reduzi-la para 6,25%. Esta explicação é um dos pontos mais notáveis da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). A decisão tomada há uma semana, contrária à previsão dominante entre analistas e operadores, havia sido recebida com acusações ao BC de haver falhado na comunicação. Sem polemizar, os autores da ata oferecem uma pequena lição sobre como devem ser as decisões de política econômica.
A expectativa de um novo corte de juros foi considerada nas discussões, segundo a ata: a comunicação recente de membros do Copom “parecia ter sido interpretada” como indício de mais uma redução da taxa. Um detalhe é especialmente importante: “parecia ter sido interpretada”. Se houve um problema, portanto, foi de interpretação. Mas o assunto foi discutido e a preocupação, descartada. Focar na melhor decisão possível em vista das informações disponíveis acabaria produzindo “maior credibilidade para a política monetária”.
As informações disponíveis incluíam, naquele momento, as pressões cambiais, a hipótese de um dólar a R$ 3,60 e, portanto, uma projeção mais alta de inflação. Esses detalhes, mencionados na ata, já haviam aparecido no informe divulgado pouco depois da reunião. As novas estimativas, baseadas também na hipótese de 6,50% de juros básicos, indicaram inflação em torno de 4% neste ano e em 2019. Não seria preciso, portanto, um novo corte da taxa para levar a inflação à vizinhança da meta oficial.
Ao escolher esse caminho, os membros do comitê mostraram prudência em dois sentidos. Em primeiro lugar, levaram em conta a mudança do cenário externo e seus possíveis impactos na inflação. Muito mais complicado – e desgastante – seria avançar no corte dos juros e em seguida recuar, se as condições se agravassem. Em segundo lugar, cuidaram de preservar a credibilidade da política monetária, mesmo ao custo de críticas imediatas.
Não se desviaram, no entanto, da linha indicada em entrevista pelo presidente Ilan Goldfajn: a decisão foi tomada com foco na perspectiva de inflação, desta vez afetada pela instabilidade cambial. Não se introduziu um novo fator no quadro das preocupações: o câmbio sempre esteve presente. A mudança foi o efeito atribuído a uma valorização mais ampla do dólar. Se a nova taxa ficará em torno de R$ 3,60 só se saberá mais tarde. De toda forma, o Copom fez sua lição de casa. Nem todos, no mercado, parecem ter feito a sua.
“O cenário externo tornou-se mais desafiador e apresentou volatilidade”, está escrito no terceiro parágrafo da ata. Desde o ano passado, o presidente do BC repetiu várias vezes, tanto no Brasil como em reuniões no exterior, a advertência: todos deveriam preparar-se para o fim de um cenário externo benigno.
Se a mudança estivesse associada a um aperto mais forte das políticas monetárias no mundo rico, pelo menos alguns efeitos seriam facilmente previsíveis. O mercado financeiro internacional ficaria menos acessível, fluxos de capital seriam desviados principalmente para os Estados Unidos, haveria pressões cambiais e provavelmente efeitos inflacionários. Algumas dessas consequências foram observadas nas últimas semanas. Um dos desdobramentos foi a busca de ajuda do Fundo Monetário Internacional pelo governo argentino.
A advertência continua válida. Maior empenho na execução de ajustes e reformas seria essencial como política preventiva no Brasil. Mas é muito difícil difundir em Brasília esse tipo de mensagem, especialmente em ano de eleições.
O Copom fez sua parte e a taxa básica deve ser mantida, segundo a ata, nas “próximas reuniões”. Ainda há, no mercado, quem fale da possibilidade de um novo corte, por causa da inflação baixa e da economia desaquecida. Pode ser, mas a má condição das contas públicas e a incerteza quanto a novas ações corretivas tornam arriscada uma política monetária mais frouxa. Milagres estão fora das atribuições do Copom.