terça-feira, 29 de maio de 2018

Pedro Parente: greve dos petroleiros é 'política' e não tem pauta reivindicatória



Presidente da Petrobras, Pedro Parente. Foto de Jorge William / Agência O Globo

Rennan Setti, O Globo




O presidente da Petrobras, Pedro Parente, classificou nesta terça-feira de "política" a greve dos petroleiros anunciada para amanhã e que exige sua demissão do cargo. Em teleconferência com analistas de bancos, o executivo disse que não existe uma pauta de reivindicações de natureza trabalhista no movimento.

- Não existe pauta reivindicatória, já que são reivindicações mais de natureza política do que de vantagens como remuneração. O acordo assinado no ano passado é válido por dois anos. Portanto, não há razões sobre o regime de trabalho envolvidas nessa discussão - criticou o executivo.


Parente afirmou que a estatal continuará livre para praticar seus preços para os combustíveis, independentemente da fórmula de compensação que for acordada com o governo após a concessão de subsídios aos caminhoneiros. Alvo de pressão por parte dos grevistas e dos próprios petroleiros, o executivo garantiu que o objetivo das negociações é preservar "o resultado financeiro da companhia". Parente informou que o governo deve publicar Medida Provisória (MP) e decreto até quarta-feira detalhando o modelo de ressarcimento à empresa por causa do subsídio de R$ 0,30 por litro de diesel.

Na teleconferência, Parente disse ser "possível que tenhamos alguma fórmula" para que a Petrobras estabeleça seus preços, mas ponderou que ainda não tem detalhes porque isso ainda é objeto de discussão.

- A gente está discutindo lá em Brasília como isso seria implementado. Mas eu não veria com surpresa que eventualmente tenhamos uma fórmula. Mas o mais importante é a nossa liberdade - contou.

EXECUTIVO ADMITE ARRANHÃO NA CREDIBILIDADE

Pedro Parente buscou ressaltar junto aos analistas que a estatal não tem a capacidade para influenciar as flutuações do petróleo e do dólar e, portanto, precisa ajustar seus preços para fazer frente a elas. O executivo aproveitou para tirar da Petrobras a responsabilidade de absorver as perdas com a desvalorização do real, mencionado que "quem tem poder para influenciar o câmbio no Brasil é o Banco Central, que tem bala para isso."

- Teremos, sim, liberdade para aplicar o preço de acordo com as variações de mercado. Não temos o poder de influenciar a cotação internacional do petróleo nem do cambio. Quem tem poder para influenciar o câmbio no Brasil é o Banco Central, que tem bala para isso. Está mantida nossa prerrogativa de definir preço, independentemente da periodicidade. Mas o decreto ainda está em elaboração no momento - afirmou Parente. - O governo diz que, qualquer que seja a metodologia aplicada, o conceito de nossa política de preços seria respeitado. Qualquer que seja a sistemática aplicada, buscamos que ela não seja diferente da aplicação da política que colocamos em vigor.

Mesmo ressaltando que sua liberdade de praticar preços será mantida, Parente lembrou os analistas que "a empresa hoje é muito melhor do que há dois anos, três anos, e isso não se deve exclusivamente à política de preços." Diante dos rumores que circulam de que poderia deixar o cargo de presidente da Petrobras diante da pressão, o executivo procurou destacar outras medidas de sua gestão, como redução do endividamento da Petrobras, alongamento e redução do custo da dívida e cumprimento de metas de redução de custo.

Estranhamente, os analistas dos bancos não perguntaram a Pedro Parente se ele continuará firme no cargo. (Jornalistas não puderam fazer perguntas, apenas ouvir a teleconferência). Em vez disso, os analistas repetiram diversas vezes durante a conversa elogios à gestão de Parente que, para se fazer mais claro, preferiu falar em português e, não, em inglês, como fizera na semana passada.

Mesmo sem ter sua permanência no cargo questionada pelos analistas, Parente admitiu que a discussão pública sobre a crise está "muito personalizada em mim". O executivo também reconheceu que a credibilidade da Petrobras foi arranhada pela crise.

- Não tenho dúvidas de que a visão que se tem hoje da empresa é pior do que há duas semanas. Basta olhar o valor de mercado da empresa - ponderou. - Mas identificou-se a origem do problema de forma equivocada na empresa. A Petrobras não é uma ilha dentro do Brasil.

O executivo disse que outra marca de sua gestão foi aumentar a independência da empresa e reduzir a interferência política sobre ela. Ele citou o fato de que nove dos 11 membros do conselho de administração da Petrobras são independentes. Mas ele observou que "não é segredo para ninguém que, sendo a Petrobras uma empresa de controle estatal, as eleições têm enorme influencia." O presidente afirmou que, diante disso e da crise com a greve, seu papel é defender "os argumentos da empresa" de forma racional.

- Não temos como não reconhecer que os holofotes se voltaram intensamente para a empresa e temos que nos despir de emocionalidade e expor os argumentos da empresa - disse.

Mesmo tendo sido insuficiente para conter a greve e a sangria das ações da Petrobras na Bolsa, Parente defendeu sua decisão de ter reduzido e congelado o preço do diesel por 15 dias na semana passada. Segundo ele, esse passo foi essencial para proporcionar o diálogo entre governo e grevistas. Mas o executivo admitiu que tratou-se de decisão "polêmica":

- A empresa iniciou dando sua contribuição, mesmo sabendo que ele seria polêmica. Precisávamos ali ter a coragem de fazer o movimento que permitisse as conversas entre governo e grevistas. Tivemos responsabilidade e coragem.

ENCOLHIMENTO DE R$ 126 BILHÕES

Até o fechamento do pregão de segunda-feira, a Petrobras perdeu R$ 126 bilhões em valor de mercado desde o começo da greve dos caminhoneiros, na semana passada, uma queda de 34,6% na cotação de suas ações. Somente na sessão de segunda, o tombo dos papéis foi de mais de 14%. Isso fez a estatal chegar ao fim do pregão valendo R$ 242 bilhões, derrubando o principal índice da Bolsa, o Ibovespa. Para analistas, a Petrobras perde valor na mesma proporção que aumenta o temor dos investidores de que a estatal volte a ser usada politicamente pelo governo. Após o derretimento de ontem, as ações da estatal tentam uma recuperação nesta terça-feira, operando em alta de mais de 7% e levam o índice de referência Ibovespa para o terreno positivo.

Esta é a segunda vez em seis dias que Parente convoca analistas de bancos, sobretudo estrangeiros, para explicar a posição da Petrobras nessa crise. Na primeira vez, na última quinta-feira, o presidente da Petrobras afirmou que, para mudar a política de preços da companhia, o governo teria que mudar sua diretoria. De acordo com o executivo, porém, o governo assegurou a estatal naquela ocasião que não tem essa intenção e que, portanto, não há razão para que ele deixe o cargo.

Ontem, segunda-feira, Parente enviou carta aberta aos funcionários da Petrobras na qual afirmava que paralisações e pressões para a redução de preços representam um retrocesso que pode prejudicar consumidores, a empresa e, em última instância, a sociedade brasileira. O apelo de Parente ocorreu depois de ospetroleiros decidirem aderir ao movimento dos caminhoneiros e anunciarem que vão cruzar os braços por 72 horas a partir de quarta-feira. Na pauta de reivindicações estão a redução dos preços de combustíveis e, também, a saída de Parente do comando da Petrobras.