A quadrilha que ora está sendo denunciada na Operação Lava Jato, da Polícia Federal (PF), é integrada por gente que participou dos mais importantes escândalos nacionais desde pelo menos 1997, conforme relatou reportagem do Estado. A reincidência desses veteranos mostra que a predação ao erário se tornou para muitos deles um meio de vida - e que eles agiram movidos pela certeza de que a Justiça nunca os puniria para valer.
O elo entre quase todos os casos é o doleiro Alberto Youssef, principal acusado na Lava Jato. Figura conhecida no mundo dos recentes episódios de corrupção e de desvio de dinheiro público, Youssef enriqueceu "sem nunca ter uma atividade lícita", conforme afirma o Ministério Público Federal. Ele é tido como o coordenador do esquema de lavagem de dinheiro para legalizar recursos obtidos por meio de fraudes e de pagamento de propinas na Petrobrás entre 2009 e 2014. Calcula-se que sua expertise tenha sido usada para branquear algo em torno de R$ 10 bilhões.
A trajetória de Youssef começou no escândalo do Banestado (Banco do Estado do Paraná), revelado em 2003. Por meio de depósitos de doleiros em contas de laranjas e nas CC5 (contas criadas para facilitar transferências legais para o exterior), o esquema naquele banco público transferia para paraísos fiscais dinheiro oriundo de narcotráfico e de corrupção. O gerente de câmbio que operou os negócios chamou a atenção na época para a "permissividade" do Banco Central, que transformou o Banestado num paraíso de doleiros - entre eles Youssef -, que teriam movimentado R$ 30 bilhões.
Para não ser condenado à prisão, Youssef fez acordo de delação premiada em 2004, em que admitiu diversos crimes contra o sistema financeiro e os cofres públicos. Mesmo com o compromisso de colaborar com a Justiça e, assim, reduzir a punição, Youssef continuou a atuar. Além de montar uma rede com doleiros, políticos, servidores e empresários para operações de câmbio fraudulentas, suspeita-se que ele tenha tido participação no escândalo do mensalão, por meio da corretora Bônus Banval. Segundo Marcos Valério, pivô do mensalão, o dono da corretora é Enivaldo Quadrado, sócio de Youssef e que também foi preso na Operação Lava Jato.
A quadrilha que atuou na Petrobrás inclui mais nomes conhecidos de outros escândalos. Um deles é o do doleiro Raul Henrique Srour, que atuou com Youssef no Banestado. Ele é acusado agora de fraudar identidades para realizar operações de câmbio. Srour já havia sido citado pela CPI que investigou o escândalo dos precatórios, em 1997.
Outra veterana envolvida no caso da Petrobrás é Nelma Kodama, doleira que também é ligada a Youssef. Ela foi investigada na CPI dos Bingos, na CPI dos Correios e na Operação Anaconda, que apurou um esquema de venda de sentenças judiciais.
A lista da Lava Jato cita ainda Rafael Angulo, que foi condenado por envolvimento em esquema de remessa ilegal de cerca de US$ 700 milhões ao exterior entre 2004 e 2006, na chamada Operação Curaçau. Angulo também trabalhou para Youssef.
Outros mencionados são os notórios Carlinhos Cachoeira e Pedro Paulo Leoni Ramos. O bicheiro Cachoeira, preso em operação contra o crime organizado em Goiás em 2012 e que tinha extensas ligações com o mundo político, movimentou dinheiro em uma das empresas de fachada de Youssef, conforme a investigação da Lava Jato.
Já Pedro Paulo Leoni Ramos, o "PP", foi investigado pela PF em inquérito sobre fraudes em fundos de pensão em 2013 e agora é suspeito em razão de suas relações com Youssef. Um cunhado de "PP", Roberto Figueiredo, também está envolvido na Lava Jato - ele já havia sido preso pela PF na Operação Navalha, que desbaratou esquema de corrupção na contratação de obras do PAC, em 2007.
É provável que a Lava Jato venha a incluir ainda mais nomes conhecidos do submundo das negociatas - gente que não foi punida quando deveria e que, confiante, parece ter se organizado como uma ampla rede dedicada a roubar o quanto puder dos cofres públicos.