Parlamentares terão mais R$ 16,4 bilhões para acomodar suas emendas - em geral paroquiais e clientelistas - à proposta de Orçamento do próximo ano, se for aprovada a reavaliação de receita apresentada pelo relator do projeto, senador Romero Jucá. Engordar a projeção da receita é parte de uma tradição bem conhecida. Nenhum projeto de lei orçamentária enviado pela Presidência da República é bastante grande para atender aos interesses de senadores e de deputados. São, com frequência, interesses eleitorais.
As emendas incluídas no documento aprovado nem sempre resultam em desembolsos, porque a liberação de recursos depende do Executivo. Mas a mera inclusão da despesa no texto final pode ser politicamente rendosa para o congressista. Ele pode, pelo menos, alardear essa façanha a seus eleitores. Não pode garantir se a verba será liberada pelo Tesouro, mas essa é outra etapa do jogo.
No sistema brasileiro, o Executivo tem amplo arbítrio sobre a liberação de verbas, quando se trata de despesas discricionárias. Os congressistas têm batalhado para tornar obrigatório pelo menos o pagamento de uma parte das emendas. Além disso, a proposta de adoção do orçamento impositivo é frequentemente retomada, mas sem sucesso até agora.
Orçamento impositivo pode ser adequado a outros países. No Brasil, só dará certo quando a boa gestão do dinheiro público estiver em posição muito mais alta na escala dos valores políticos. Além disso, como só o Executivo é considerado responsável pelo equilíbrio financeiro do Estado, sua preponderância na administração orçamentária ainda é defensável. Isso tem, naturalmente, um custo político: o poder de arbitrar a liberação de verbas é, com frequência, usado em benefício de partidários e de aliados, além de servir como instrumento de pressão e de barganha.
Os parlamentares conhecem todos esses detalhes, mas, ainda assim, a produção de emendas pode ser politicamente útil e para isso é bom garantir uma boa projeção de receitas. Não importa muito se o ano seguinte, segundo os especialistas, será de estagnação ou de prosperidade econômica. Sempre se pode dar - e sempre se tem dado - um jeitinho para engordar a arrecadação prevista na lei.
Para mudar a projeção inscrita no projeto de Orçamento para 2015, o relator elevou de 5% para 6,3% a inflação estimada, mas conservou o crescimento econômico de 3% calculado pelo pessoal do Executivo. De fato, as projeções do mercado financeiro indicam para o próximo ano uma alta de preços acima de 6%. Mas o crescimento da produção, de acordo com a maior parte das estimativas, será pouco superior a 1%. Não é fácil, portanto, justificar uma expectativa de arrecadação mais otimista que a apresentada no projeto do Executivo.
O ritual só foi um pouco diferente, neste ano, porque o relator apresentou a reestimativa sem depender do trabalho de uma comissão formada especialmente para avaliar a receita. Talvez se ganhe algum tempo, mas, ainda assim, é grande o risco de se chegar ao ano-novo sem uma lei orçamentária aprovada no Congresso. Isso já ocorreu várias vezes - e de novo no caso do Orçamento-Geral da União de 2014. Envolvidos nas eleições, deputados e senadores deixarão de lado ainda por um bom tempo a maior parte da atividade legislativa.
De toda forma, quem assumir o governo em janeiro terá de se preparar para condições financeiras muito difíceis. Se a economia continuar estagnada, como indica a maior parte das projeções, a receita tributária será insuficiente. Será preciso, já se sabe, reforçar as contas públicas com receitas especiais. Já se fala em um novo programa de refinanciamento de dívidas tributárias (Refis) para atrair contribuintes em atraso.
Por enquanto, o Executivo ainda procura meios para fechar o Balanço Fiscal de 2014. Os técnicos da Receita Federal cortaram duas vezes a estimativa de arrecadação deste ano. Há alguns meses ainda se apontava um resultado 3% superior ao do ano passado, descontada a inflação. Pela estimativa divulgada nesta semana, a variação ficará em apenas 1%. Mas até essa expectativa parece, neste momento, um tanto otimista.