A inflação continua longe da meta de 4,5%, mesmo com o recuo nas últimas
semanas, mas o Banco Central (BC) resolveu pagar para ver e manteve em 11% a
taxa básica de juros, a Selic. Foi um lance de risco, embora sem surpresa para o
mercado. Os sintomas de fraqueza da economia devem ter sido levados em conta,
assim como os sinais de arrefecimento de alguns grupos de preços, especialmente
da alimentação. A nota divulgada na quarta-feira à noite, bem menos explícita,
menciona "a evolução do cenário macroeconômico e as perspectivas para a
inflação".
Se essa explicação for mais que uma formalidade, a tradução deve
mesmo corresponder àqueles fatores, com peso possivelmente maior para os
indícios de anemia econômica. A acomodação da política monetária, depois de nove
altas da Selic, atende pelo menos em parte ao interesse eleitoral da presidente
Dilma Rousseff. Mas será este o momento de interromper o combate à alta de
preços?
A resposta deve ter sido complicada. A decisão foi unânime, de acordo com a
informação oficial, mas a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) durou
cerca de quatro horas. O resultado só saiu perto das 9 da noite, mais tarde que
de costume. A conquista da unanimidade exigiu, tudo indica, um enorme esforço de
convencimento. Mas um sinal de insegurança foi mantido no comunicado: "O Copom
decidiu, por unanimidade, neste momento, manter a taxa Selic em 11% a.a., sem
viés". A expressão "neste momento" foi o detalhe mais citado pelos analistas do
mercado financeiro, ao comentar a nota.
Menos de 24 horas depois de encerrada a reunião do Copom, mais uma pesquisa
confirmou o arrefecimento - pelo menos temporário - das pressões inflacionárias.
O Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M)caiu 0,13% em maio, depois de ter
subido 0,78% em abril, segundo informou a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Os
preços por atacado recuaram 0,65% e esse foi o principal determinante do
resultado geral. Mas a boa notícia é muito limitada.
A evolução do índice de preços ao consumidor, o segundo maior componente do
IGP-M, foi muito menos favorável, embora também tenha aumentado menos que no mês
anterior. A variação passou de 0,82% em abril para 0,68% neste mês, graças à
elevação menor dos preços da alimentação, do vestuário e dos transportes.
O alerta parece claro: os preços no varejo vêm acompanhando muito de longe o
recuo dos preços no atacado. Além disso, uma taxa mensal de 0,68% está muito
longe de corresponder aos objetivos da política de combate à inflação. Acumulada
em 12 meses, essa taxa resultaria em 8,47%. Algo parecido tem ocorrido com o
indicador usado como referência oficial para a política de metas, o Índice de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
O IPCA-15, prévia do resultado de maio, subiu
0,58%, bem menos que no mês anterior (0,78%). Mas um aumento de 0,58% ao mês,
acumulado em 12 meses, corresponderia a 7,19%, um número muito acima da meta e
até do limite da margem de tolerância, de 6,5%. Analistas do mercado têm
projetado taxas menores para os próximos meses, mas com repique a partir de
agosto.
Segundo as avaliações mais otimistas, o recuo da inflação será mais amplo e
mais duradouro do que isso. O arrefecimento dos preços, de acordo com essas
avaliações, já mostra o efeito dos aumentos de juros desde abril do ano passado.
Esse efeito seria visível na menor expansão do consumo e na desaceleração do
setor de serviços.
Pode ser, mas o entusiasmo dos consumidores ainda tem sustentado aumentos de
preços bem acima do alvo da política monetária. O crédito ainda cresce, embora
menos velozmente que nos anos anteriores, e o desajuste das contas federais
continua alimentando a demanda.
Ao mesmo tempo, a oferta industrial permanece em marcha lenta, por falta de
investimento produtivo nos últimos anos. Isto deve aparecer mais claramente na
divulgação, hoje, do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre.
Apostar na redução desses desajustes nos próximos meses é certamente
arriscado. O Copom resolveu arriscar. Terá disposição para recuar, se for
preciso, antes das eleições?