André Miranda - O Globo
- Servidores param suas atividades nesta terça-feira por 24 horas e prometem paralisação por tempo indeterminado para o dia 12 de maio
- Para MinC, competição, que começa em 12 de junho, seria oportunidade de aumentar frequência de turistas nos museus federais
Nesta terça-feira, quando visitantes de todo o Brasil não conseguirem acesso a instituições como o Museu Imperial, o Museu Nacional de Belas Artes, o Museu da Inconfidência ou a Biblioteca Nacional, uma velha frase dita em forma de anedota fará todo o sentido: “Imagina na Copa!”.
Da imaginação para a realidade, os servidores do Ministério da Cultura (MinC) fazem uma paralisação de 24 horas nesta terça como uma preparação para uma greve por tempo indeterminado a partir de 12 de maio, exatamente um mês antes do início da Copa do Mundo. Suas reivindicações são as mesmas de uma década atrás, quando uma greve interrompeu todas as atividades do ministério durante cem dias: reajustes salariais, a implantação de um plano de cargos e incorporação de gratificações. De 2004 em diante, houve novas greves em 2007 e 2011, sempre com as mesmas pautas e sempre levando a promessas do governo, nem sempre cumpridas — por exemplo, o Plano Especial de Cargos da Cultura e Gratificação Específica de Atividade Cultural, que seria instituído pelo projeto de Lei 11.233, de 2004, nunca saiu do papel.
— A gente entende como uma política sistemática de esvaziamento do ministério. Fica claro que a cultura não é prioridade para o governo, há um histórico de descumprimento de acordos — explica Lia Jordão, vice-presidente da Associação de Servidores da Biblioteca Nacional. — Por isso acreditamos que haverá uma adesão geral dos servidores à greve.
Procurado, o MinC não comentou o impacto da greve sobre a Copa do Mundo e nem o que poderá ser feito para evitá-la: a pasta apenas respondeu, por e-mail, que já tem agendada reunião com os servidores nesta quarta-feira, dia 30, e que mantém conversas com o Ministério do Planejamento, órgão do governo responsável por autorizar reajustes salariais.
Mas, caso se confirme, a greve pode deixar fechadas instituições como o Museu da República, o Museu Imperial, o Museu Nacional de Belas Artes, a Chácara do Céu e o Museu Histórico Nacional (RJ); o Museu Lasar Segall (SP); o Museu da Inconfidência, o Museu do Diamante e o Museu do Ouro (MG); o Museu da Abolição (PE); o Museu Solar Monjardim (ES); e o Museu Victor Meirelles (SC). Pode, ainda, interromper outras atividades do ministério.
— Nós fizemos uma assembleia na sexta-feira em Minas Gerais, com os servidores dos Instituto Brasileiro dos Museus (Ibram), Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) e Funarte, e a maioria decidiu seguir a agenda nacional da greve — conta Matheus Guerra Cotta, arquiteto do Iphan em Minas. — Todos vão se ausentar de seus locais de trabalho, e estamos preparando material para o dia 12.
Graças à Copa do Mundo no Brasil, a expectativa do Ministério do Turismo para este ano é que 7,2 milhões de estrangeiros visitem o país, 1,2 milhão a mais do que no ano passado. Seria, portanto, uma oportunidade de aumentar a ocupação dos museus e dos equipamentos culturais brasileiros, uma perspectiva que vem sendo trabalhada pelo próprio MinC.
Há exatamente uma semana, a ministra da Cultura, Marta Suplicy, e o presidente do Ibram, Angelo Oswaldo, participaram de uma audiência pública na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado para prestar contas das ações do ministério no ano passado. Na ocasião, Oswaldo disse que o governo vem investindo nos museus por causa da Copa. “No ano passado, a Embratur patrocinou uma pesquisa durante a Copa das Confederações analisando o fluxo de turistas. E 50% optaram pelos museus como local de emprego do tempo”, disse o presidente do Ibram.
Só que, com a possibilidade de uma greve, os 30 museus administrados pelo Ibram ao redor do Brasil ficariam fechados durante a Copa. Um problema parecido ocorreu em 2007, quando o Rio de Janeiro recebeu os Jogos Pan-Americanos: uma greve de 73 dias organizada pelos servidores do MinC impediu que os turistas que vieram à cidade durante a competição pudessem conhecer os museus federais.
— Desde a greve de 2004, o governo faz promessas que não cumpre. Então, como este é um ano de Copa no Brasil e de eleições, vamos voltar a fazer pressão, para que eles ao menos façam o que se prometeu no passado — diz André Sesquim, assessor de Comunicação do Museu Solar Monjardim, em Vitória, Espírito Santo. — E não será uma greve imposta. Cada unidade do país está fazendo sua assembleia e definindo como vai ser a adesão.
O cronograma dos servidores do MinC prevê duas etapas antes do início da greve por tempo indeterminado, em 12 de maio. A paralisação de hoje, de 24 horas, será acompanhada por piquetes e assembleias, com o objetivo de mobilizar a população em prol da causa. Depois, nos dias 7 e 8 de maio, haverá uma nova paralisação, desta vez de 48 horas.
— Será um processo em etapas. No Museu da República, por exemplo, vamos deixar o jardim aberto nesta terça-feira, mas vamos distribuir panfletos para que as pessoas entendam o que está acontecendo. Já nos dias 7 e 8, nem o jardim será aberto — explica André Andion Angulo, presidente da Associação dos Servidores do Ibram e titular do Departamento de Educação e Cultura da Confederação Nacional dos Servidores Federais.
A mobilização para a greve (O MinC tem atualmente 3.884 servidores em exercício) começou no início deste mês e teve como marco um ato de servidores do Museu Imperial, em Petrópolis, entidade histórica aberta ao público desde 1943. A instituição recebe 400 mil visitantes por ano, mas, de acordo com uma carta assinada por seus servidores, seu quadro está reduzido “a 39 servidores, sendo apenas 16 da área técnica para cuidar do acervo de cerca de 200 mil documentos textuais, 7.800 objetos museológicos, além de 11 imóveis”.
— A situação do Museu Imperial hoje é que ele está na mão de empresas terceirizadas e temporárias. São muito poucos servidores — diz Márcio Miquelino, bibliotecário do museu. — Por isso, fizemos uma assembleia e vamos aderir à greve.