sábado, 10 de junho de 2017

TV alemã acusa doping no futebol brasileiro e cita o pentacampeão Roberto Carlos

Roberto Carlos na Copa de 2002
Roberto Carlos durante jogo do Brasil contra a Inglaterra, na Copa do Mundo de 2002, (Ricardo Correa/Placar)

Com Veja e Estadão Conteúdo

ARD é a mesma emissora que há três anos denunciou o escândalo de doping no esporte russo


A emissora alemã ARD, a mesma que há três anos denunciou o escândalo de doping no esporte russo, revelou neste sábado a existência de um esquema de dopagem envolvendo atletas brasileiros, incluindo ex-jogadores da seleção brasileira de futebol. O ex-lateral Roberto Carlos foi citado na reportagem como um dos clientes do médico Júlio César Alves, um dos protagonistas do suposto esquema.
Em 2014, a ARD revelou a forma pela qual o governo russo promovia o doping de seus atletas, o que levou o Comitê Olímpico Internacional (COI) a banir o atletismo da Rússia dos Jogos de 2016, no Rio de Janeiro. Desta vez, a investigação é focada no doping no futebol brasileiro e no esporte nacional.
Apresentando-se como agente estrangeira de jogadores de futebol em busca de anabolizantes, a equipe de TV entrou em contato com uma rede de abastecimento clandestina e chegou até mesmo a visitar uma fábrica de anabolizantes. Um dos médicos que prometia fornecer o material era Julio Cesar Alves, de Piracicaba (SP).
Ao conversar com o grupo alemão, sem saber que falava com jornalistas, ele teria revelado como seus produtos abasteciam jogadores, como Roberto Carlos. Com uma câmera escondida, o grupo ouviu do médico ofertas por clenbuterol e a orientação aos clientes para deixar de tomar o produto 15 dias antes de uma competição para evitar serem pegos em um exame de doping. Alves ainda promete a eles dez doses da substância eritropoietina. Na visita, o pacote de produtos saía por 10.500 reais, que poderiam ser pagos em quatro vezes.
Uma das atletas pegas no doping no Brasil foi a corredora Eliane Pereira, que seria cliente de Alves. Aos jornalistas, ela garante que não sabia o que médico receitava e tomava acreditando que era algo legal. Mas admite que ele ensinava como escapar dos testes e que teve um encontro com um “grande ídolo” da seleção brasileira no consultório do médico. Eliane, porém, se recusa a dar seu nome.
Pego numa gravação, Alves insiste que já forneceu seus produtos a dois jogadores da seleção. “Eu tratei de Roberto Carlos. Ele chegou a mim com 15 anos”, disse. De acordo com a ARD, documentos de uma investigação no Brasil também apontariam o envolvimento do ex-lateral, mas procuradores disseram desconhecer o caso.
Procurado pela ARD, o ídolo do Real Madrid e da seleção brasileira disse que não faria nenhum comentário, e também não se pronunciou em suas redes sociais até o momento. Depois de revelada a denúncia, o médico Alves se recusou a confirmar suas declarações.
Importação – De acordo com a investigação, parte dos produtos no mercado brasileiro é importada. Em Assunção, no Paraguai, o grupo de jornalistas chegou a ser levado a uma fábrica de anabolizantes. No encontro, os empresários confirmaram que vendiam anabolizantes e que seu principal mercado era o setor de futebol do Brasil, em grandes quantidades. “Vendemos para todos os esportes, como atletismo”, disseram.
“Há pessoas ainda que compram para jogadores que querem ainda atuar quando são mais velhos, entre 34 ou 35 anos ou para aqueles que tiveram alguma lesão”, explicou um deles, segundo quem o produto é enviado para Brasil e Argentina. “Dois ou três fisioterapeutas de clubes brasileiros compram isso aqui para seus jogadores em fase de recuperação de lesões, em um momento que não pode ser detectado em exames de doping.”
A reportagem aponta que as falhas nos controles seriam amplas no Brasil. Uma das investigações da Agência Mundial Antidoping (Wada, na sigla em inglês) ocorre justamente com empresas que são terceirizadas no Brasil para realizar os testes. Numa gravação telefônica que está de posse da Wada, uma delas deixa claro que o organizador de um torneio pode escolher quem ele quer testar.
A emissora falou também com Luis Horta, ex-chefe de planejamento da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD), que denunciou as autoridades brasileiras por terem impedido exames fora de competições com atletas nacionais na preparação para a Olimpíada do Rio.
De fato, por meses, os atletas brasileiros deixaram de ser testados fora de competições, e ex-responsáveis acusam o Comitê Olímpico do Brasil (COB) de fazer pressão para que os atletas não fossem examinados na preparação final para os Jogos de 2016. “Antes dos Jogos Olímpicos, estávamos sob pressão para não realizar testes de doping sem aviso prévio”, disse Horta. “Sob pressão do Comitê Olímpico do Brasil”, esclareceu. “Eu percebi que eles não têm o mesmo objetivo. Eles querem medalhas, medalhas, medalhas. Limpas ou não”, atacou.
De volta ao seu país de origem – Portugal -, Horta afirmou não se sentir seguro no Brasil. “Existem instituições que são um estado dentro de um estado.” Marco Aurelio Klein, ex-responsável no Ministério do Esporte, também denunciou o abandono de parte do controle para a Olimpíada. Segundo ele, o último controle de doping sem aviso prévio ocorreu no início de julho de 2016, mais de um mês antes dos Jogos começarem.