FLAVIA LIMA - Folha de São Paulo
Parte dos economistas de mercado já prevê inflação abaixo de 3% em 2017, movimento inédito e que pode levar os preços medidos pelo IPCA a encerrar o ano pela primeira vez abaixo do piso estabelecido pelo Banco Central desde que o regime de metas foi criado, em 1999.
Embora ainda seja cedo para cravar o número, confirmada a trajetória, será também a primeira vez na história do regime de metas que o presidente do Banco Central terá que escrever uma carta aberta ao ministro da Fazenda justificando o descumprimento da meta abaixo do piso, e não acima do teto.
A meta de inflação é de 4,5%. O intervalo de tolerância, que era de dois pontos percentuais para cima ou para baixo desde 2006, caiu neste ano para 1,5 ponto.
Para os analistas mais certeiros nas previsões de curto prazo consultados semanalmente pelo BC para o Boletim Focus, a inflação vai ficar em 2,94% no ano, segundo a mediana das estimativas. Há cinco semanas seguidas, esse grupo (chamado de Top 5 de Curto Prazo) revê para baixo as projeções para a inflação.
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Quando a pesquisa é ampliada para os cem analistas consultados pelo BC para o Focus, o resultado não é o mesmo (previsão de alta de 3,48%), mas a tendência também é de queda. Há uma semana, a mediana geral indicava alta de 3,64% para 2017.
Segundo economistas, os preços administrados como os de energia elétrica, gás e gasolina, além da supersafra de alimentos, vêm surpreendendo positivamente.
Esses dois grupos (alimentos e preços administrados), diz Rodrigo Melo, da Icatu Vanguarda, estão levando o mercado a prever uma deflação do IPCA em junho, a primeira desde 2006.
Mas o quadro benigno pode ser afetado por choque no preço do petróleo, falta de chuva ou até pelo contágio do câmbio pela crise política, diz Leonardo Costa, da Rosenberg Associados (um dos que estão no Top 5 do BC).
"Mas ainda acho que o risco maior é de a inflação terminar o ano abaixo de 3%."
Nos 12 meses até maio, a inflação ficou em 3,6%, o menor patamar desde 2007.
O inusitado disso tudo é que, em 18 anos, a meta de inflação foi descumprida em 2001, 2002, 2003 e 2015 -nunca por ficar abaixo do piso. Em todos os anos, coube ao presidente do BC explicar por que os preços ficaram acima do teto da meta, como fez Alexandre Tombini em 2015, quando o índice ficou em 10,67%.
Ironia do destino, dizem economistas, é que, confirmado o cenário, o atual presidente do banco, Ilan Goldfajn, deve usar o choque de preços administrados para explicar a inflação mais baixinha. Como fez Tombini, mas com sinais trocados.