O cearense Roberto Amaral, presidente do PSB de Marina Silva, decidiu adiar para 13 de outubro — uma segunda-feira, 13 dias antes do segundo turno eleitoral —, a sua maior aposta política da temporada: a imposição de uma nova direção ao partido, com 29 integrantes e mandato até dezembro de 2017.
A eleição havia sido convocada pelo Diário Oficial, de forma emergencial, para a tarde de amanhã no salão L’Orangerie do Hotel Mercure, no Ibirapuera, a 500 metros do edifício da Bienal de São Paulo. Sob pressão, o presidente do PSB recuou, parcialmente.
Seu roteiro, porém, está traçado. Se tudo sair como prevê, Amaral chegará à reta final da eleição com absoluto controle sobre o PSB.
Essa eleição interna é extemporânea. Surpreendeu muitos líderes por duas razões.
Primeiro, porque o mandato dos atuais dirigentes — inclusive a presidência de Amaral — só termina em dezembro.
Depois, porque aparentemente não há motivo justificável para se antecipar um embate partidário dessa natureza. Ainda mais numa época em que todos, supostamente, deveriam estar empenhados na campanha da candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva — caso ela chegue ao segundo turno.
Na essência, o movimento de Amaral e seu grupo não tem nada de casual. É produto da paradoxal situação vivida por um pedaço da cúpula do PSB, que se sente ameaçada pelas possibilidades da candidata e pela “nova política”, por mais abstratos que sejam o conceito e sua evangelização.
Marina representa a melhor chance que o PSB já teve de chegar ao centro do poder, desde a fundação em 1947. No entanto, a cúpula do partido se esforça numa luta contra a própria candidata.
A experiência anterior do PSB com candidato próprio numa disputa presidencial ocorreu em 2002. Foi quando Amaral anunciou uma revisão dos “compromissos programáticos” face à “realidade objetiva” do partido.
Resultado: com a unidade e o empenho que hoje parecem rarefeitos, o PSB se transformou em alegoria da candidatura presidencial de Anthony Garotinho, ex-governador do Rio.
Naufragaram no primeiro turno, com 17,8% dos votos contra 46,4% de Lula e 23,1% de José Serra. Garotinho ajudou na eleição da maioria dos 22 deputados federais, salvando a organização com a garantia de acesso ao dinheiro do Fundo Partidário e um mínimo de participação na propaganda no rádio e na televisão.
Três meses depois da derrota, em dezembro, fez-se um novo acordo com o PT. E Amaral, ex-coordenador do programa de governo de Garotinho, virou ministro da Ciência e Tecnologia de Lula.
Com Dilma Rousseff, a burocracia do PSB manteve laços firmes. Amaral, por exemplo, recebeu designações remuneradas em conselhos do BNDES e de Itaipu. Provou sua fidelidade no planejamento da campanha no Rio. Arrastou o PSB para a aliança com o candidato petista ao governo estadual, Lindbergh Faria, contrariando Eduardo Campos e Marina Silva, que haviam optado pelo deputado Miro Teixeira (PROS).
A frieza e equidistância exibida durante toda a campanha pela cúpula do PSB em relação à sua candidata presidencial despertou o interesse do PT. Foram discretas as conversas das últimas duas semanas, sob supervisão de Lula.
Na perspectiva petista para o segundo turno, a exposição dessa fratura na base da adversária ajudaria à construção da imaginária “inviabilidade” de um governo Marina Silva, por déficit de representação político-partidária.
A “contribuição” desse grupo de controle do PSB refratário à própria candidata seria, na visão petista, mais que providencial. Significaria um primeiro passo na direção do projeto que seduz muitos caciques no cenário de reeleição de Dilma Rousseff: reconstrução das alianças para viabilizar o “volta, Lula” no pleito seguinte, em 2018, fechando um ciclo de duas décadas no poder — sonho interrompido do PSDB, proeza inédita no Brasil pós-ditadura.
A súbita convocação da eleição no PSB, na reta final da disputa presidencial, alegrou a cúpula do PT, que acabou a semana celebrando a ascensão de Dilma nas pesquisas.
Tudo dominado. Só ficou faltando mesmo combinar o resultado desejado com 60% do eleitorado. É quanto somam os que ainda se mantêm distantes da presidente-candidata.