É desastrosa para as finanças públicas a decisão do presidente Michel Temer de não mais adiar para 2020 o reajuste dos vencimentos dos funcionários do Executivo inicialmente programado para o próximo ano. A desistência do presidente de editar medida provisória suspendendo os aumentos em 2019 é também péssima para os contribuintes, para o necessário ajuste das contas públicas que o próximo presidente da República terá de conduzir e, consequentemente, para o desempenho da economia.
Apesar da grave crise fiscal que ameaça paralisar atividades de importantes órgãos federais, e por isso exige medidas drásticas de contenção de despesas, o presidente Michel Temer parece ter se rendido a pressões corporativas. A mais notória delas foi feita pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que aprovaram uma proposta orçamentária para 2019 com aumento de 16,38% nos próprios vencimentos, com impacto em cascata sobre outros salários do Poder Judiciário. Além de confirmar que manterá o reajuste dos servidores em geral, Temer informou que estão em fase adiantada os estudos para a concessão do aumento pedido pelos ministros do STF.
Agindo desse modo, o presidente da República tenta, segundo se informa, reduzir seu desgaste político. Que desgaste, no entanto, poderá ser mais corrosivo para um governante em fim de mandato, com baixíssimo prestígio popular, do que o causado por uma decisão que denota tibieza na gestão de recursos do contribuinte?
O adiamento do reajuste - que foi proposto no Congresso, mas não aprovado, durante a tramitação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2019 - era considerado essencial pela equipe técnica dos Ministérios da área econômica. A medida propiciaria uma redução de gastos com a folha de pessoal que abriria espaço para a cobertura de despesas essenciais de custeio para as quais não há recursos. O aumento generalizado para o funcionalismo federal torna ainda mais difícil para o futuro governo a tarefa de cumprir a meta fiscal e de respeitar o teto dos gastos públicos.
A falta de coragem dos políticos para lidar com temas que podem causar alguma reação negativa em ano eleitoral havia ficado clara no mês passado, quando da votação do projeto de LDO no Congresso. A matéria submetida a votação era o substitutivo do senador Dalírio Beber (PSDB-SC), que, entre outros itens, acrescentara à proposta original do Executivo a proibição da concessão de reajustes aos servidores e a criação de cargos no serviço público no próximo ano. A proposta foi derrotada, mas os problemas continuam do mesmo tamanho.
Os gastos com pessoal compõem a segunda maior despesa primária do governo, superados apenas pelas despesas com a Previdência Social. Neste ano devem alcançar R$ 302,5 bilhões, o que representa 22% de toda a despesa primária. Um reajuste de acordo com o IPCA do ano anterior (ou seja, de 2017, que ficou em 3,5%), como tem ocorrido, implica aumento de R$ 10,6 bilhões na folha. Considerados apenas os servidores do Executivo, o reajuste implica gastos adicionais de R$ 6,9 bilhões.
Com o recuo do governo, os técnicos da área econômica concluem uma nova versão do projeto de lei de Orçamento da União para 2019 - que deve ser enviada ao Congresso até amanhã - na qual, obviamente, recursos anteriormente destinados para outras finalidades terão de ser reduzidos, para cobrir os gastos adicionais com o funcionalismo.
Já neste exercício os Ministérios pedem R$ 10,2 bilhões para cobrir seus gastos essenciais, mas a folga contabilizada pelo Tesouro é de apenas R$ 666 milhões. Dinheiro de outras áreas está sendo remanejado para cobrir cerca de R$ 1,4 bilhão de despesas consideradas de emergência. Para 2019, a falta de previsão de recursos orçamentários já preocupava órgãos responsáveis por programas e projetos essenciais, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), responsável por bolsas de pesquisa científica, e o IBGE, que prepara o Censo Demográfico 2020. Como eles ficarão?