O esforço de muitos analistas em traçar cenários pós-eleitorais tem trazido uma curiosa “mediana” de previsões, especialmente entre economistas que já viram de tudo (começando pelo Plano Cruzado). Cofres públicos vazios, dívida pública subindo e quebradeira geral dos Estados “inevitavelmente” levarão a reformas para lidar com a crise fiscal. Candidatos carimbados como “reformistas”, segundo essas previsões, farão mais rápido o necessário. Até mesmo os “populistas” agirão na direção “correta”, pois reconhecem a bomba fiscal.
A velocidade relativa com que uns e outros atacarão os gastos públicos permite até previsões numéricas. Assim, a eleição de um “reformista” sugere um dólar de R$ 3,40 no meio do ano que vem. Se for um populista, dólar de R$ 4,60. A taxa de inflação sob um “reformista” permaneceria em 4,5%; um “populista” a levaria para 8%. E assim por diante com juros e crescimento do PIB que, dependendo do otimismo quanto à recuperação do consumo das famílias, poderia até chegar a uns 3% já em 2019.
Não critico economistas por raramente acertarem previsões; com jornalistas acontece o mesmo. O que sempre me fascina no raciocínio deles é a pouca margem que atribuem à estupidez humana na tomada de decisões – no caso do Brasil, não fazer nada relevante frente à questão fiscal (uma “não decisão” a cargo de humanos) equivale a uma das posturas mais estúpidas possíveis. E, a julgar pelo andar da carruagem político-eleitoral, até mesmo bastante provável.
Da mesma maneira, não posso criticar quem, confrontado com o cenário difuso e nebuloso do momento atual da corrida eleitoral, se apega a “inevitabilidades”, a coisas que “terão” de acontecer. É uma forma de tornar a imprevisibilidade menos imprevisível. E, também, em confiar que decisões coletivas claramente prejudiciais aos interesses de um país (especialmente de prazo mais dilatado) acabam sendo evitadas. Mas é bom considerar Brexit, Trump e o apoio popular à greve dos caminhoneiros. Não era para acontecer, mas aconteceu.
A ideia da “inevitabilidade” de um futuro risonho para um País com tantos recursos e tamanho é tão arraigada quanto a noção de que o tempo trabalharia a nosso favor. Ela mascara o fato (traduzido em estatísticas muito eloquentes) de que na comparação com economias mais avançadas estamos estagnados há mais de uma geração, e estamos ficando velhos. Populistas no Brasil e não só os de esquerda desenvolvem a ficção política de que o País foi feliz e bem sucedido em algum ponto do passado – no caso do PT, nos 13 anos que nos amaldiçoaram por muitos mais.
É a falta de compreensão do papel das pessoas e das ideias que elas abraçaram na confecção do desastre no qual fomos jogados que explica amplamente a popularidade de um criminoso condenado e cumprindo pena de prisão, chefe de um dos maiores esquemas de corrupção da recente história do planeta. A eleição dos governos do PT não era “inevitável” do ponto de vista histórico, nem a adoção de seus postulados desastrosos de economia inclusive por parte relevante do empresariado, interessado em protecionismo, subsídios e anabolizantes para o consumo.
A pergunta abrangente que me parece relevante neste ponto da corrida eleitoral é a de averiguar se há forças comprometidas com o rompimento da estagnação política e econômica atuais, não apenas na configuração tosca do “deixa que eu chuto”. Vai ser necessário enfrentar e derrotar parte do nosso jeito de ser – patrimonialismo, corporativismo e regionalismos – para libertar o que poderíamos ser: inovadores e criativos. Também acho que uma vitória de “reformistas” é menos pior para nosso futuro. Mas é pouco.
O Estado de S.Paulo