Para entender as consequências da greve dos caminhoneiros, é preciso saber quem pagará a conta das concessões negociadas com o governo. Como procuro explicar a seguir, o custo social dessas concessões é muito superior ao custo que resultaria do repasse do preço dos combustíveis aos fretes.
A causa primária da greve foi, sem dúvida alguma, o forte reajuste do preço do óleo diesel verificado nas últimas semanas, reflexo da alta mundial do preço do petróleo e da desvalorização do real.
Em mercados competitivos, altas de custos são repassadas a preços. No caso dos caminhoneiros, no entanto, há dois motivos que fizeram com que, ao menos em parte, o aumento do preço do diesel levasse à compressão da rentabilidade dos transportadores.
O primeiro motivo é a política de preços da Petrobrás. Os transportadores acertam o preço do frete com seus clientes com antecedência, mas o preço do diesel vinha sendo elevado diariamente, inviabilizando o repasse do aumento de custo ao preço do frete. O segundo motivo é a própria situação da economia brasileira. Num contexto de alto desemprego e demanda fraca é difícil repassar aumentos de custos para os preços. Essa não é, no entanto, uma situação exclusiva do setor de transporte de cargas, e sim de toda a economia brasileira.
Neste cenário, é compreensível o descontentamento dos caminhoneiros, que resultou na greve. Mas isso não justifica o formato assumido pela greve e muito menos seus resultados.
Por um lado, a greve tem claramente uma dimensão oportunista, com os caminhoneiros aproveitando o clima geral de revolta contra a política e a corrupção e a insatisfação com a situação da economia para defender interesses corporativistas.
Por outro lado, o bloqueio de estradas, a vedação à passagem de transportadores que não querem aderir à greve e a interrupção do fornecimento de bens essenciais, como insumos hospitalares são inadmissíveis em um Estado e Democrático de Direito. Tal situação é agravada pelo fato de que a paralisação é estimulada por donos de empresas de transporte insatisfeitos com a redução de sua rentabilidade, o que caracteriza locaute e é ilegal.
Por fim, e principalmente, as concessões negociadas pelos caminhoneiros com o governo têm um elevado custo social, muito superior ao custo que resultaria do repasse do aumento do preço do diesel aos fretes.
A redução de tributos e a subvenção à Petrobrás, adotadas para reduzir o preço do diesel, jogaram para os contribuintes um aumento de custo que deveria ser absorvido pelo setor privado. Segundo o ministro da Fazenda, este custo deverá ser de R$ 13,5 bilhões em 2018, quase metade do orçamento total do programa Bolsa Família para 2018. De fato, o custo fiscal das concessões aos caminhoneiros será ainda mais elevado, por conta do ressarcimento das concessionárias de rodovias pela redução da receita com o pedágio dos caminhões.
Outras concessões feitas aos caminhoneiros, como a fixação de um preço mínimo para o frete e a garantia de uma porcentagem mínima dos fretes da Conab para os transportadores autônomos, reduzem a competição no mercado de fretes. Quem pagará a conta serão os consumidores em geral, por meio de um custo de frete maior que o que resultaria da livre operação do mercado.
A única medida razoável do pacote negociado com o governo é o estabelecimento de um prazo mínimo (de 30 dias) para a revisão do preço do diesel, o que aumenta a previsibilidade para os caminhoneiros.
No agregado, no entanto, o resultado das concessões feitas aos caminhoneiros é a redução da competição no setor e a transferência para os contribuintes de um problema de aumento de custo que seria resolvido de forma muito mais eficiente no âmbito privado. Se no Brasil imperassem regras iguais para todos - inclusive no âmbito tributário - seria muito mais difícil para um setor tornar o País refém sem que ficasse claro que os benefícios concedidos a esse setor são arcados por toda a sociedade.
* DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL