O pior passou, mas ainda não se pode dizer que o país está se recuperando. Há propostas do governo que podem reduzir as despesas públicas, mas não há garantia de aprovação. Os juros vão baixar em algum momento no futuro, porque a inflação está caindo em todos os cenários, mas a taxa ainda está acima do teto da meta e assim terminará o ano.
Estas são algumas das conclusões que estão no relatório de inflação divulgado ontem. O documento foi vistoriado pelos economistas e jornalistas com a intenção de verificar se já há sinais de mudança de estilo com o novo presidente do Banco Central. Um dos repórteres falou na entrevista coletiva que parecia ser o mesmo BC. Quem estava respondendo as perguntas era o diretor que está deixando o cargo depois de uma longa carreira na instituição, Altamir Lopes, e que de fato lembra mais continuidade.
No mercado se usa as definições de “falcão” e “pombo” para indicar uma direção mais dura ou mais branda no controle dos instrumentos de política monetária. E ontem as lupas usadas para ler o tedioso relatório tinham o objetivo de saber que tipo de ave será Ilan Goldfajn. Quando era economista-chefe do Banco Itaú ele previa queda das taxas de juros em pouco tempo. Os analistas concluíram que ele está um pouco mais falcão do que se imaginava, pela firmeza no compromisso de chegar ao centro da meta no ano que vem.
Outra conclusão a que alguns economistas chegaram é que não houve muita mudança no tom porque há incertezas demais no país. Se as medidas fiscais forem aprovadas, se o impeachment for aprovado, se o governo Temer se fortalecer o cenário é um. Do contrário, o quadro econômico vai refletir mais instabilidades da conjuntura política.
O relatório, como sempre, projeta números para a inflação a cada trimestre nos cenários de referência e de mercado. Nos dois, a taxa é declinante. O índice que chegou a 10,6%, no pico ocorrido em 2015, está em queda e deve chegar ao fim do ano em 6,9% ou 7%. No final do ano que vem estará, segundo os dois cenários, em 4,7% ou 5,5%. Confira no gráfico. O surto inflacionário está sendo vencido. As taxas subiram em parte pela correção das tarifas de energia após um período de baixa artificial da eletricidade e da gasolina.
O choque cambial e os eventos climáticos provocados pelo “El Niño" elevaram a inflação de alimentos no ano passado e começo deste ano. Mas esses efeitos vão se dissipar, disse o Banco Central. De fato, o dólar que chegou a R$ 4,19, caiu fortemente e ontem foi negociado a R$ 3,30. O “El Niño” passou e há chance de um “cenário mais benigno” para os alimentos. A menos que, explicou o BC, “La Niña” afete a produção de grãos no hemisfério Norte, elevando os preços.
Mas, como disse o relatório de inflação divulgado ontem, o cálculo é de que as medidas propostas para limitar o crescimento do gasto à inflação do ano anterior vão sim reduzir as despesas públicas. Em três anos, elas devem cair entre 1,5 a 2 pontos percentuais do PIB. Em 2015, o gasto havia chegado a 19,6%. Pode parecer pouco, mas é uma inversão de tendência relevante. Nos últimos anos as despesas só subiram em relação ao PIB.
As melhores notícias vêm da frente externa. Apesar de o ambiente ser de crescimento fraco, com queda do ritmo chinês, e agora os novos sustos em relação à União Europeia e o Reino Unido, o Brasil mudou completamente os números das contas externas. O déficit em transações correntes teve uma redução “expressiva”, definiu o BC. Caiu de 4,42% do PIB, nos doze meses até maio de 2015, para 1,7% em maio de 2016. A economia não vai exatamente bem, mas parar de piorar já dá algum alívio nesse biênio horroroso vivido pelo Brasil.
(Com Marcelo Loureiro)