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O CEO da GE diz que a falta de clareza do governo brasileiro emperra a produtividade, dificultando os negócios, mas acha que vale a pena ficar e esperar por tempos melhores
Foram interessantes, no conceito chinês, ou seja, duros, os treze anos do americano Jeffrey Robert Immelt, 58 anos. à frente da sétima maior companhia do planeta, a General Electric (GE). Fazia apenas apenas quatro dias que ele estava no cargo quando terroristas da Al Qaeda derrubaram as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, em 11 de setembro de 2001. A crise financeira e econômica de 2008 quase custou o braço financeiro do grupo, salvo por Washington e por uma volumosa injeção de recursos da própria GE. O Brasil, sua aposta mais recente, emperrou sob as contradições do dilmismo na economia. Mas ele tem fé em que as coisas melhorem por aqui. Fundada em 1878 pelo inventor da lâmpada, Thomas Edison, a GE é hoje uma empresa que fatura 150 bilhões de dólares por ano fabricando desde geladeiras e fomos de micro-ondas até turbinas de jatos comerciais, locomotivas e usinas nucleares. Em visita ao Brasil, o terceiro maior mercado da GE depois dos Estados Unidos e da China, Immelt falou a VEJA. Quando o senhor visitou o Brasil pela primeira vez, em 2011, previam-se alto crescimento econômico e um afluxo de investimentos, que não se confirmaram. O Brasil frustrou suas expectativas? Estou nesse negócio há tanto tempo que raramente me surpreendo ou me frustro com momentos de volatilidade. O Brasil certamente enfrenta muitos desafios, mas continua sendo uma boa oportunidade. É um país que precisa de tudo: eletricidade, aviação, locomotivas, petróleo, infraestrutura. Para nós, vale a pena esperar esse ciclo de baixa passar e permanecer aqui, mesmo crescendo menos do que esperávamos. E, se alguém desistir, tomamos o seu lugar. Sabe por quê? Porque é justamente nas dificuldades que os bons negócios se forjam. O senhor gosta de atuar nas crises? Não é bem isso. Na verdade, gostaria que as coisas fossem mais simples, que eu fosse o rei do mundo e fizesse tudo acontecer do meu jeito. Seria ótimo se pudesse dizer a cada primeiro-ministro ou presidente como agir e eles me respondessem: "Oh, Jeff, essa é uma grande ideiam, vamos fazer exatamente como você sugere!". Só que não é assim que funciona. Acho, por exemplo, que a economia brasileira deveria e poderia estar crescendo pelo menos 5% ao ano, mas não está. Que medidas o senhor tomaria para chegar a esse crescimento? Daria mais clareza ao cenário econômico. Se as políticas governamentais fossem mais transparentes e previsíveis, haveria no Brasil muito mais investimentos de longo prazo, em infraestrutura, o que traria ao país mais produtividade e crescimento. O Brasil não é nem de longe tão produtivo quanto poderia ser. Ajudaria muito se os acordos entre governo e empresários fossem mais simples. Veja o setor de energia. É preciso ter coerência na política de subsídios para que empresas e consumidores saibam quanto pagarão pela eletricidade. O senhor discutiu isso com a presidente Dilma? Estive com ela há seis meses, e, claro, discutimos isso. O que ela disse? Concordamos sobre o diagnóstico. Agora falta fazer. A Petrobras, seu principal cliente no Brasil, exige 65% de conteúdo nacional de seus fornecedores. O senhor considera essa exigência um grande problema? Se eu estivesse no comando da Petrobras, não abriria mão do conteúdo nacional. O que o Brasil pede não é inédito, e existem regras semelhantes em diversos países. A princípio, não há nada de errado nisso, desde que o restante da economia seja produtivo e compense a elevação dos custos adicionais de atender à exigência de conteúdo nacional. Aí é que está o problema do Brasil, pois os custos de eletricidade aqui são altos e os portos, de difícil acesso. Se tudo funcionasse bem, o conteúdo nacional não seria um peso excessivo. O senhor adquiriu traquejo para lidar com a classe política? Em 2011, fiz parte de um conselho criado pelo presidente Barack Obama para discutir a competitividade da economia, e ali ficou muito claro para mim quanto a política é diferente dos negócios. Foi interessante enxergar as coisas sob essa outra perspectiva, de dentro. Vejo duas atitudes típicas dos homens de negócios diante dos políticos. A primeira é mais impositiva, na linha: "Eis o que você deve fazer". A outra é mais construtiva:"Olhe o que eu faria se fosse você". A maioria dos empresários prefere a primeira opção. Eu fico com a segunda. A GE vem priorizando as vendas de produtos para infraestrutura e energia em detrimento do mercado doméstico e de crédito. Foi a crise de 2008 que precipitou essa virada? Sempre achei que esse fosse o melhor caminho. Óleo e gás, eletricidade, aviação e locomotivas são negócios com grande potencial de crescimento, em que estão as melhores oportunidades. Mas é verdade, sim. que a crise nos forçou a acelerar essa transição. Ela fez minguar a importância do braço financeiro na GE. E, francamente, acredito que esse baque foi a melhor coisa que nos aconteceu. A crise o pegou de surpresa? Todos ficamos espantados com sua rapidez e severidade. Era até possível ver uma recessão chegando, mas, quando os mercados encolheram fortemente, o choque foi generalizado. Felizmente, tínhamos ativos sólidos na parte industrial e conseguimos injetar cerca de 40 bilhões de dólares e salvar a GE Capital, o braço financeiro do grupo. Do ponto de vista pessoal, como foi aquele momento? Tenho muitos amigos brasileiros que hoje são CEOs. Eles contam que se tornaram executivos melhores nos anos 90, depois de sobreviver à hiperinflação e suas consequências. As crises ensinam a perceber melhor os riscos. No caso da GE, a crise também nos ajudou a tomar grandes decisões, como a compra da Alstom (multinacional francesa de energia e transporte) e o aumento de investimentos em pesquisa e desenvolvimento. A crise nos fez mais ousados. A GE comprou a Alstom quando a empresa já estava sendo investigada por corrupção. Não via isso como um problema? Não. Já compramos outras companhias que foram alvo de investigação parecida. Ficamos à vontade para fazer esse tipo de aquisição porque sabemos conduzir as coisas direito. Assim como naqueles casos, o que quer que tenha acontecido na Alstom será apurado e solucionado. O risco de investir em países emergentes é muito maior mesmo do que em mercados mais estáveis? Não considero maior, só diferente. Lembre-se de que a crise financeira começou em Wall Street, não no Rio de Janeiro. Daí termos ficado mais dispostos a investir em países como o Brasil. É nos emergentes que estão as maiores oportunidades. Então, por que ficar seguro e confortável em Connecticut (sede da GE), se não há negócios a fazer por lá? A complexidade e o desafio dos mercados emergentes nos dão vantagens competitivas relevantes em relação às empresas menores. Temos fôlego para atravessar os altos e baixos dessas economias. A GE está expandindo seu braço de óleo e gás em um momento em que os preços estão em queda. Como essa nova realidade afetará os negócios? A indústria de óleo e gás é interessante. Qualquer projeto leva de cinco a sete anos para concretizar-se. Ainda assim, olhamos para o preço do petróleo todo dia, imaginando qual será no dia seguinte. Nestes últimos tempos, com a economia europeia estagnada, os estoques superam o consumo e a Opep, organização dos maiores produtores, atravessa um momento crítico. Tudo isso abala o mercado. Mas acredito que, quando mais de 1 bilhão de pessoas ao redor do mundo entrarem na classe média e começarem a dirigir seu carro, a demanda por petróleo e derivados voltará a crescer, e o preço vai subir. Se o barril continuar ria faixa de 80 ou 90 dólares, a grande maioria dos projetos ainda será economicamente viável. O senhor acredita que o fenômeno americano do óleo e do gás de xisto seja sustentável? Sem dúvida. Na verdade, se juntarmos Estados Unidos, Canadá e México, veremos que eles podem, em breve, formar uma região energeticamente autossuficiente. Isso muda de forma radical o jogo global, que é hoje muito diferente de quando eu estava começando. Se me dissessem naquele tempo que, mesmo com turbulências simultâneas na Rússia, na Venezuela e no Oriente Médio, os preços estariam em queda, eu não acreditaria. Foi o crescimento da produção americana que causou a reviravolta e derrubou os preços. A GE investe muito e há bastante tempo em energias renováveis, mas elas não estão avançando tão rapidamente como se esperava. Quando acha que terão um espaço significativo? Fontes de energia como a eólica e a solar continuam crescendo, mas ainda são extremamente dependentes de subsídios governamentais. Aos poucos, os preços vão caindo a patamares mais competitivos. Desde que entramos no ramo de energia eólica, há uma década, o custo do quilo-watt-hora passou de 31 centavos de dólar para 4 centavos. O que falta mesmo são formas eficientes e baratas de armazenar a energia. Ninguém será realmente grande nesse negócio sem resolver tal questão. Quanto tempo o senhor acha que levará até isso acontecer? Vai depender do ritmo de desenvolvimento dos carros elétricos. Se a Tesla e outras fabricantes avançarem rapidamente, o custo das baterias deverá diminuir. Quando as soluções digitais que mudaram radicalmente para melhor diversos setores industriais começarão a fazer diferença na vida das pessoas? Isso já está ocorrendo. Está se valendo dessa revolução quem pega um avião que utiliza um software para poupar alguns minutos de viagem ou faz um exame radiológico em um laboratório que armazena as imagens na nuvem. Todo avanço só faz sentido quando beneficia o consumidor. Nossa meta agora é criar redes sociais que unam diversas indústrias e nas quais elas possam trocar informações e aumentar a eficiência. Tudo isso terá impacto sobre o consumidor final. A GE enfrenta competição forte nessa área? Nosso diferencial vem do fato de que conhecemos melhor os equipamentos do que os outros. O mercado de software pode estar dominado, mas são poucos os que, como nós, sabem aplicá-lo aos equipamentos. Há mais tecnologia em uma máquina do que em um software. E nós entendemos mais de máquinas do que os concorrentes. O senhor previu que a mão de obra terá peso cada vez menor no custo dos produtos. Isso foi entendido como uma previsão de que empresas americanas na China voltariam a fabricar seus produtos nos Estados Unidos. Faz sentido? Faz todo o sentido. Quando há um alto grau de tecnologia e inovação envolvido, é possível, sim, ser competitivo fora da China. Hoje, produzimos muito nos Estados Unidos — e funciona. Um dos segredos para achar um bom lugar para investir é despir-se de preconceitos geográficos e encontrar maneiras de baixar os custos de produção. O Brasil pode muito bem um dia entrar na rota da competitividade. Sua ideia de limitar o mandato do próximo CEO da GE a quinze anos levou à especulação de que, há treze anos no cargo, o senhor estaria vislumbrando a aposentadoria. É verdade? Faz parte da cultura da GE os CEOs se manterem no posto por um longo período, para que sejam capazes de realizar mudanças significativas. Embora não tenha data para sair, estou o tempo todo preparando a minha sucessão. Sei bem que, se não tiver um bom desempenho, poderei ser demitido. Essa ideia funciona como um motor para mim e os outros. Todo mundo tem de provar sua competência todos os dias — e sou eu quem mais precisa mostrar serviço. A GE investiu 300 milhões de dólares em Eike Batista, a quem o senhor já considerou um dos maiores empreendedores do mundo. Foi um erro? Só posso desejar ao Eike toda a sorte do mundo. |