Alexandre Rodrigues - O Globo
Entre 2001 e 2014, custo de pensões e aposentadorias passou de 19,9% para 22,7% da despesa total do governo
Há mais de dez anos que os gastos do Ministério da Previdência Social crescem acima da média do total de recursos do Orçamento da União. Entre 2001 e 2014, o volume autorizado para aposentadorias, pensões e benefícios aumentou 120%. Eram R$ 182,6 bilhões há 13 anos, em valores de 2013, e chegaram a R$ 402,1 bilhões em 2014. No mesmo período, o gasto total do governo cresceu 93%, de R$ 918,4 bilhões para quase 1,8 trilhão. Com isso, a Previdência toma cada vez mais espaço no Orçamento. Representa hoje 22,7% de tudo o que o governo gasta. Em 2001, essa parcela era de 19,9%.
Os dados fazem parte das séries históricas que compõem o Mosaico do Orçamento, uma plataforma interativa aberta na internet desenvolvida pela Diretoria de Análise de Políticas Púbicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV/DAPP) que permite visualizar o destino dos gastos públicos.
Atualmente, de cada R$ 5 gastos pelo governo, R$ 1,13 vai para aposentados e pensionistas. Quase 97% dos R$ 402,1 bilhões autorizados este ano para o Ministério da Previdência são verbas carimbadas para o pagamento de benefícios, que independem da decisão do ministro.
Isso ajuda a explicar porque o PMDB tenta trocar a pasta por outra, com mais recursos livres, no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. O atual ministro, Garibaldi Alves (PMDB-RN) já descreveu a Previdência como um “abacaxi”.
Outra pasta com gastos obrigatórios crescentes, a Educação ultrapassou o Ministério da Defesa e assumiu a terceira posição entre os maiores orçamentos da Esplanada. Entre 2011 e 2014, a dotação do MEC subiu 186%, de R$ 34,8 bilhões para R$ 99,7 bilhões. A fatia no Orçamento subiu de 3,8% para 5,6%. Já o Ministério da Saúde, o segundo maior orçamento do governo, conseguiu elevar seus gastos em 88%, de R$ 56,8 bilhões para R$ 107,2 bilhões, mas ficou estacionado em 6% do total dos gastos públicos.
Ministérios com menos gastos obrigatórios acabam desfavorecidos na disputa por recursos. Apesar da ofensiva internacional iniciada pela diplomacia do governo Lula, as pastas da Defesa e de Relações Exteriores viram suas fatias caírem desde 2001. A participação da primeira caiu 5,6% de para 4,2%. O Itamaraty, que tinha apenas 0,23% em 2001, agora tem menos ainda: 0,13% do Orçamento. O número ajuda a explicar as queixas recentes de servidores sobre atrasos no pagamento de aluguéis no exterior.
Juntas, as verbas de Saúde, Educação, Defesa e Relações Exteriores somam 70% do que gasta a Previdência sozinha. Como O GLOBO revelou ontem, esse protagonismo da Previdência só é ofuscado pelos encargos financeiros da União, como juros e amortizações da dívida, que consomem 23% do Orçamento deste ano (cerca de R$ 410 bilhões).
Enquanto a presidente Dilma Rousseff anuncia mudanças na política econômica que podem resultar na queda dos juros e do endividamento no longo prazo, o ritmo do crescimento dos gastos com a Previdência e a demografia indicam que a conta dos benefícios vai pesar cada vez mais.
Especialista em finanças públicas, o economista Fabio Giambiagi diz que a situação é preocupante porque o contingente de idosos na população aumenta de forma acelerada — quase 4% ao ano, o dobro do crescimento médio da economia nos últimos anos. Ou seja: gastos com benefícios tendem a crescer mais do que a arrecadação de impostos.
Segundo Giambiagi, em 1988, quando a Constituição foi promulgada ampliando o acesso à Previdência, a despesa do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) era o equivalente a 2,5% do Produto Interno Bruto. Seu sucessor, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), gasta hoje perto de 7,5% do PIB.
Para Giambiagi, que estuda a Previdência há duas décadas, a explosão dos gastos pode ser explicada por três fatores. O primeiro é a política de valorização do salário mínimo, referência da correção dos benefícios. Outro problema: a aposentadoria precoce, que leva o país a usar parte dos impostos com pessoas ainda em idade produtiva — e deixar de investir em Infraestrutura, por exemplo. Em terceiro lugar, ele cita os critérios de extensão dos benefícios para dependentes:
— Temos o regime de pensões mais generoso do mundo. Quem não se aposenta por idade se aposenta muito cedo. Uma mulher de 20 anos que se casa com um senhor de 80 e fica viúva no mês seguinte vai herdar uma pensão integral por 60 a 65 anos. É um caso extremo, mas o fato de a legislação permitir um disparate desses é a prova cabal da incúria com que os recursos públicos são tratados no Brasil.