sábado, 20 de maio de 2017

Ruy Castro: "A guerra da brotolândia"

Reprodução
Tom Jobim e Elis Regina
Tom Jobim e Elis Regina


Uma das qualidades de "Elis", o filme de Hugo Prata sobre Elis Regina, agora em DVD, é que o que foi deixado de fora da vida da cantora daria para fazer outro filme. Há, por exemplo, a conspícua ausência de Tom Jobim na história. Algum desentendimento com a família Jobim? É a única explicação para não se mostrar Tom e Elis em "Águas de Março", um momento mágico na carreira de ambos.

Outras pessoas decisivas na trajetória de Elis também ficaram ocultas por elipse: o produtor Roberto Jorge, que a levou ao Beco das Garrafas; Edu Lobo, um de seus primeiros amores e compositores; Solano Ribeiro, o criador dos festivais e também namorado; o jornalista Walter Silva; o casal Laurinha e Abelardo Figueiredo, seus amigos; o costureiro Dener; o produtor Roberto Menescal; muitos mais. E teria sido engraçado mostrar Elis, 1,54m, tentando ofender Claudette Soares, 1,49m, chamando-a de "Tampinha!".

O pai de Elis, Romeu, aparece de forma não muito lisonjeira. Pela amostra, pode-se imaginar o que não fariam de sua mãe Ercy, detestada pelos amigos da filha por se meter em tudo, até no que não lhe competia. Para Ronaldo Bôscoli, ela era "uma lavadeira que pariu um canário".

Para mim, a principal omissão do filme se refere ao que aconteceu a Elis antes de sua "chegada ao Rio", no dia 1º de abril de 1964. Elis vinha regularmente ao Rio desde 1961, para lutar (contra sua vontade, espero) pelo trono de rainha da brotolândia, deixado vago por Celly Campello. Suas adversárias, com quem disputava as páginas da "Revista do Rádio" e os auditórios da TV Rio e da Rádio Mayrink Veiga, eram Wanderléa, Rosemary e Meire Pavão. Nessa fase, Elis gravou quatro LPs ruins —o que é muito para ser ignorado.

Wanderléa ganhou a disputa pela brotolândia. Em troca, Elis se tornou a maior cantora do Brasil.