JERUSALÉM - O presidente Jair Bolsonaro anunciou neste domingo, 31, a criação de um escritório de negócios em Jerusalém. A decisão, segundo o governo brasileiro, significa que a mudança da embaixada de Tel-Aviv foi temporariamente descartada, mas ainda é analisada. A nova representação brasileira não terá caráter diplomático.
Embora tenha sido menos do que Binyamin Netanyahu desejava, o premiê israelense parece ter saído satisfeito. “É um primeiro passo para que a embaixada chegue a Jerusalém”, disse.
No fim da noite, o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, não quis dizer as razões que levaram Bolsonaro a recuar - ao menos temporariamente - de uma promessa de campanha. No entanto, é notória a pressão de países árabes, que representam um importante naco das exportações brasileiras, especialmente de carne bovina e de açúcar.
Pressionado a detalhar a relação brasileira com os palestinos, que reclamaram de tratamento desigual do Brasil, Rêgo Barros disse que o governo brasileiro está à disposição para negociar uma possível viagem à Cisjordânia. “Temos a possibilidade de visitá-los quando convidados e quando há interesse em visitá-los”, disse o porta-voz, que se esquivou sempre que foi questionado sobre o reconhecimento da Palestina.
A chancelaria palestina afirmou neste domingo que convocaria para consultas seu embaixador no Brasil, Ibrahim Mohamed Khalil Alzeben, por considerar uma "flagrante violação da legitimidade internacional" o anúncio da abertura do escritório de negócios brasileiro em Jerusalém.
"É uma agressão direta ao povo palestino e seus direitos, bem como uma aprovação à pressão americana e israelense", afirmou o chanceler Riad Malki, segundo a agência palestina de notícias Wafa.
Neste domingo, Netanyahu soube aproveitar bem o primeiro dos quatro dias da visita de Bolsonaro a Israel. O premiê tem uma eleição apertada, na semana que vem, e pode perder o cargo para o ex-comandante das Forças Armadas, o general Benny Gantz, líder da legenda de centro-direita Partido Azul e Branco. Portanto, imagens ao lado do presidente de umas das maiores economias do mundo ajudam na reta final.
Logo cedo, Netanyahu foi ao Aeroporto de Tel-Aviv receber Bolsonaro - nos dez anos em que está à frente do governo israelense, ele só havia repetido esse gesto cinco vezes, para os presidentes americanos Barack Obama e Donald Trump, para os papas Bento e Francisco, e para o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi.
Transferência de embaixada é estudada
À noite, os dois se reuniram no gabinete de Netanyahu, um bunker cercado de seguranças em Jerusalém. A imprensa brasileira teve acesso aos jardins do quartel-general do premiê e esperou até que os dois aparecessem para uma declaração conjunta. Foi uma ação coreografada. Em horário nobre, por volta de 20 horas (14 horas no Brasil), Bolsonaro e Netanyahu apareceram e trocaram amabilidades.
Cortesias
“Sejam bem-vindos a Jerusalém, capital do Estado de Israel”, disse Netanyahu, o primeiro a falar. “Prezado irmão Netanyahu, é uma honra poder voltar a Israel”, respondeu Bolsonaro. Após dez minutos de gentilezas, Bibi deu o verdadeiro tom do encontro. Pediu licença, dispensou a tradutora e deu um recado em hebraico.
Jornalistas israelenses explicaram depois que o discurso sisudo de Netanyahu era um ataque ao general Gantz, seu rival nas urnas, que teria acusado o Mossad (serviço secreto israelense) de vazar informações à imprensa de que seu telefone havia sido grampeado. “Netanyahu usou Bolsonaro como uma plataforma para promover sua campanha em horário nobre”, disse ao Estado Emmanuel Navon, cientista político israelense da Universidade de Tel-Aviv.
Acordos
Bolsonaro e Netanyahu também assinaram cinco acordos de cooperação nas áreas de defesa, serviços aéreos, prevenção e combate ao crime organizado, ciência e tecnologia e um memorando de entendimento sobre segurança cibernética.
Durante a declaração, Bolsonaro e Netanyahu também reiteraram o reconhecimento de ambos os países de Juan Guaidó, autodeclarado presidente interino da Venezuela, como “líder legítimo” do país. Os dois governos se comprometeram em apoiar o povo venezuelano na luta contra o regime de Nicolás Maduro, no poder desde 2013.
Cristiano Dias e Célia Froufe, Jerusalém