BEUNOS AIRES — O kirchnerismo foi sacudido nesta quarta-feira por uma nova onda de detenções de ex-funcionários e empresários vinculados aos governos de Néstor e Cristina Kirchner (2003-2015) e, mais uma vez, o homem por trás do escândalo é o juiz Claudio Bonadio, que já indiciou a senadora e ex-presidente em outro caso e pediu até mesmo sua detenção (impossibilitada pela imunidade parlamentar). Desta vez, Bonadio atuou num processo sobre o suposto pagamento de propinas milionárias a ex-funcionários por parte de grandes empreiteiras com operações no país.
A prisão que provocou maior comoção na Argentina foi a de Roberto Baratta, que era braço direito do então ministro do Planejamento Julio De Vido, atualmente detido por outro caso de corrupção. No próximo dia 13 de agosto, a própria Cristina, hoje senadora, deverá prestar depoimento sobre as denúncias nos tribunais portenhos.
Também foram presos Rafael Llorens, ex-subsecretário Legal de Planificação Federal, e os empresários Gerardo Ferreyra, da empresa Electroingenieria, e Javier Sánchez Caballero, da IECSA. Na mídia local, o caso está sendo chamado de “Lava-jato argentina”.
As investigações surgiram a partir de reportagens em jornais locais sobre uma suposta rede de pagamento de propinas relacionada a obras públicas. O caso cresceu com o depoimento da ex-mulher do chofer de Baratta, que confirmou que seu marido andava com sacolas de dinheiro que eram distribuídas em diferentes lugares, principalmente da província de Buenos Aires. O chofer, Oscar Bernando Centeno, foi detido recentemente. De acordo com sua ex-mulher, quando as sacolas de dinheiro eram transportadas Baratta estava no carro, junto com Centeno.
O cargo de Baratta era secretário de Coordenação do Ministério do Planejamento. O funcionário era o homem de maior confiança de De Vido, que, por sua vez, sempre integrou o círculo íntimo dos Kirchner. Sua relação mais forte era com Néstor Kirchner, mas após a morte do ex-presidente, em outubro de 2010, De Vido continuou à frente da pasta.
O vínculo com Cristina sempre foi tenso, tanto que a senadora e ex-presidente jamais expressou solidariedade a seu ex-ministro desde que foi preso, em 2017. Em entrevista à média local, Cristina chegou a dizer que “não ponho minhas mãos no fogo por De Vido nem por ninguém”.
O grupo de colaboradores do ex-ministro sofreu um golpe forte em 2016, quando o ex-secretário de Obras Públicas, José López, foi preso após ser visto jogando uma mala com dinheiro dentro de um mosteiro na Grande Buenos Aires. López continua detido.
A situação de Baratta é complicada, já que as declarações da ex-mulher de seu chofer ampliaram e deram maior sustento à acusação. O ex-funcionário conseguira recentemente algumas vitórias na Justiça em outros casos de corrupção, mas desta vez não conseguiu escapar da prisão.
A ex-mulher de Centeno entregou ao juizado de Bonadio uma série de documentos com anotações sobre a suposta rede de pagamento de propinas. Já foram realizadas 34 devassas ordenadas pelo juiz, que levaram à onda de detenções desta quarta. O caso poderia atingir a ex-presidente, ainda às voltas com outras investigações judiciais e com a firme intenção de tentar uma nova reeleição em 2019.
Janaína Figueiredo, O Globo