A união exótica do não capital com o não trabalho
A TV Globo realizou ontem o debate final — antes do primeiro turno — entre os candidatos aos governos dos Estados. Assisti, é evidente, ao de São Paulo. Pois é… A ditadura ainda em vigência da Lei Eleitoral obriga a que se tratem em pé de igualdade os que podem ser eleitos e aqueles que dão traço nas pesquisas. É um absurdo que as TVs e as rádios sejam impedidas de confrontar as ideias, opiniões e propostas dos que efetivamente têm alguma chance de vencer a eleição — e o mesmo vale para a disputa presidencial.
Em São Paulo, participaram do embate oito candidatos: além do tucano Geraldo Alckmin, do peemedebista Paulo Skaf e do petista Alexandre Padilha, havia lá mais cinco candidatos de si mesmos: Walter Ciglione (PRTB), Gilberto Natalini (PV), Gilberto Maringoni (PSOL) e Laércio Benko (PHS). Um show de horrores e, com frequência, de picaretagem política — e não só dos nanicos.
Na verdade, foi a frente dos “seis contra um”. Exceção feita a Ciglione, que não participou da tropa, todos os outros se uniram para atacar Alckmin e o governo de São Paulo. E o fizeram com tal fúria que o resultado pode ter sido contraproducente. Chegava a ser engraçado ver Skaf e Padilha a implorar a chance de um segundo turno para que possam, nas suas palavras, governar o estado mais dinâmico do país etc. e tal. Mas como pode haver alguma qualidade nas terras paulistas se, segundo eles próprios, tudo por aqui está errado?
Skaf e Padilha estavam mais afinados do que O Gordo e o Magro. Um é presidente licenciado da Fiesp sem ser empresário, e o outro é membro do PT sem ser trabalhador. Assim, deu-se a união da falta de capital com a falta de trabalho. Coisa que não pareceu espantar Maringoni, o socialista do PSOL mais ortodoxo do que embalagem de Emulsão Scott
Ter de ouvir um petista e um peemedebista a dar aula de combate à corrupção depois do que sabemos da Petrobras, controlada pelo PT e pelo PMDB, é para estômagos fortes. Ouvir de Padilha lições sobre segurança pública — dados os desastres colhidos na área por seu partido no país e nos Estados em que é governo — seria de gargalhar não fosse o tédio.
E o tal Laércio Benko, de uma legenda chamada PHS? Resolveu atacar a Sabesp, que, segundo ele, distribuiu dividendos aos acionistas, em vez de investir em água. É uma afirmação tecnicamente estúpida. A empresa é uma Sociedade Anônima. Graças a Deus, está na Bolsa e é cobiçada por investidores, o que lhe garante recursos para investir — o mesmo acontece com outras empresas públicas de capital aberto. Parte desses dividendos, diga-se, vem para o próprio governo, que os reinveste. Maringoni, o esquerdista, claro!, pegou carona na bobagem — afinal, ele é um socialista. Mas Padilha e Skaf fizeram o mesmo. E eles sabem que se trata de uma asnice. Mas e daí? Era o vale-tudo.
A nota surrealista, no entanto, era outra: era estupefaciente ver a tropa toda a sustentar que, naquela hora, faltava água na torneira dos paulistas. E, como é sabido, não faltava. Das 1.200 cidades com crise de abastecimento no país, só oito estão no Estado — em áreas em que a Sabesp não atua. Uma delas é Guarulhos, cujo sistema é municipalizado. A cidade é administrada pelo PT há 14 anos.
E a nota que ultrapassou o limite do escândalo factual foi dada por Padilha. Segundo o petista, o sistema de concessões de estradas do governo federal é superior ao vigente em São Paulo. É mesmo? Atenção! Este estado tem 9 das 10 melhores rodovias do país. Querem mais? Nada menos de 93,7% dos 6.252 km sob concessão privada foram considerados ótimos ou bons em 2013; 6% foram tomados como regulares, e apenas 0,3% eram ruins. Esses números são meus? Não! Da CNT, a Confederação Nacional dos Transportes.
Já o governo federal tentou três marcos regulatórios para fazer suas concessões e deu com os burros n’água. Conseguiu juntar o ruim ao desagradável: antes, havia estradas federais com buraco e sem pedágio. Hoje, existem estradas com buraco e com pedágio.
Segundo todas as pesquisas, Alckmin venceria hoje a disputa no primeiro turno. Acho que o debate demonstrou por quê.