quinta-feira, 30 de outubro de 2014

O PMDB e os presidente do Senado e da Câmara podem ter todos os defeitos do mundo, mas não são liberticidas como o PT

Blog Ricardo Setti - Veja


E merecem o reconhecimento por se oporem com firmeza ao decreto bolivariano de Dilma, que caiu na Câmara

(Fotos: Jane de Araújo/Agência Senado :: Rodolfo Stuckert/Agência Câmara)
Renan Calheiros, presidente do Senado, e Henrique Alves, presidente da Câmara: dando livre curso à tendência do Congresso de dizer “não” ao decreto dos “conselhos populares”(Fotos: Jane de Araújo/Agência Senado :: Rodolfo Stuckert/Agência Câmara)

Já perdi a conta das vezes em que critiquei neste blog o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
Pois tenho que dar a mão à palmatória a ambos em razão da parede que estão ajudando a erguer para impedir a existência legal do decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014, pelo qual a presidente Dilma criou um tal “Sistema Nacional de Participação Social” — na prática, instituindo “conselhos populares” à moda de países bolivarianos, à margem das instituições de representação popular criados pela Constituição e que constituem uma ameaça a mais do PT à democracia.
Henrique Alves foi quem colocou em votação, anteontem, terça, 28, o projeto de decreto legislativo que derruba os “conselhos populares”. De forma mesquinha, setores do lulopetismo atribuíram o gesto do presidente da Câmara como uma desfeita ao Planalto e ao ex-presidento Lula, que, na eleição para governador do Rio Grande do Norte, em que Alves era candidato do partido nacionalmente aliado ao PT, apoiaram seu adversário do PSD, Robinson Faria, que acabaria sendo eleito.
Foi mais do que isso. Henrique Alves, com a experiência de quem é deputado há onze mandatos consecutivos, sabia desde o início que a Câmara, a despeito de vergar-se ao lulopetismo em uma série de temas, abrigava uma forte oposição ao decreto bolivariano. Ele próprio chegou a expressar reservas à medida.
(Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
Ministro Gilberto Carvalho, que Augusto Nunes chama de “coroinha de missa negra”: ironizando o Congresso e levando contravapor do presidente do Senado (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
Quanto a Renan, presidente do Senado, suas declarações desta quarta-feira não deixam muita margem a dúvidas sobre de que lado está. Ele anunciou, sem meias palavras, que a Casa vai derrubar o decreto do governo e deu como certo que os senadores vão acompanhar a decisão da Câmara e aprovar a resolução que anula o decreto. “Já havia um quadro de insatisfação com relação a essa matéria”, afirmou. “O decreto ser derrubado na Câmara não surpreendeu, da mesma forma que não surpreenderá se for — e será — derrubado no Senado”, disse.
Notem este “e será”. O próprio Renan, em conversas privadas com interlocutores, deixa clara sua oposição e sua má-vontade contra o decreto de Dilma, mas, matreiro, nega que a decisão da Câmara seja um sinal de insatisfação pós-eleitoral na base parlamentar governista. “Essa dificuldade [de aprovar o decreto] já estava posta antes das eleições, apenas se repete. Essa questão da criação de conselhos é conflituosa, não prospera consensualmente no Parlamento e deverá cair”, previu.
Como não podia deixar de ser, o ministro Gilberto Carvalho, o “Gilbertinho” — ex-seminarista que meu amigo Augusto Nunes costuma chamar de “coroinha de missa negra” –, que, de acordo com o decreto, seria o coordenador desses conselhos bolivarianos escolhidos a dedo, sem eleição, chiou, e ironizou a Câmara dos Deputados. “É uma vitória de Pirro”, sentenciou a caixa-preta de Santo André, “quando (sic) o Congresso, de maneira persistente, insistente, acabou criando um decreto legislativo que derrota o decreto da presidente”.
E acrescentou: “Nada mais anacrônico, contra os ventos da história, nada mais do que uma tentativa triste de se colocar contra uma vontade irreversível do povo brasileiro, que é de participação”.
Quem é o ministro para dar lições ao Congresso? Ele não foi eleito para nada, vive há anos e anos dependurado na administração pública por ser do PT, não tem mandato, não dispõe de eleitores, não representa ninguém — quem sabe, algo dos “movimentos sociais” do qual é o interlocutor do governo, sempre passando a mão na cabeça de entidades como o MST quando enveredam pela baderna.
Em resposta ao ministro, Renan sapecou:
– Mais uma vez o ministro Gilberto Carvalho não está sabendo nem do que está falando.
Então, para concluir, eis o que penso sobre o episódio e o que ele revela.
O PMDB pode ter todos os defeitos do MUNDO. Já critiquei o partido noprimeiro post publicado neste blog, em sua inauguração, quando chamei o partido de “uma jiboia faminta e insaciável, acostumada, há décadas, a triturar e digerir aliados – e a querer mais, sempre mais”. É uma coligação de interesses regionais, é um conjunto de caciques, não tem ideologia definida, não tem um projeto de Brasil, quer participar (e o faz) de todos os governos — seja de que tendência for –, é em grande parte fisiológico, quer sempre uma “boquinha” etc etc etc.
Mas tem uma grande, enorme qualidade para quem erige, como os democratas, a liberdade como supremo bem: o partido, em toda a sua existência, nunca propôs nada que arranhasse os direitos e garantias individuais, a liberdade de expressão de pensamento, a liberdade de organização, a liberdade de manifestação, a liberdade de imprensa.
Renan Calheiros e Henrique Alves têm folhas corridas políticas bastante acidentadas, para dizer o menos — mas, igualmente, jamais atentaram contra as liberdades públicas no exercício de suas funções.
Já o PT é um partido com setores de forte corte stalinista, um partido hegemônico, que pretende estender os tentáculos sobre as instituições,um partido com vocação liberticida.
Só para lembrar: em 2004, o lulalato tentou emplacar um Conselho Federal de Jornalismo idealizado por jornalistas domesticados e destinado a “orientar, disciplinar e fiscalizar” o exercício da profissão e a atividade do jornalismo — censurá-lo, em suma –, recuando diante da enorme reação do Congresso e de vários setores da sociedade.
Em 2010, gestou um projeto autoritário e proto-fascista de criar uma estatal Agência Nacional de Comunicação (ANC) proposto pelo então ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, que previa a aplicação de multas por programação considerada “ofensiva, preconceitosa ou inadequada ao horário” transmitidos por emissoras de TV e rádio e era tão ruim que recebeu o contra até de entidades alinhadas ao PT, como a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).
Até hoje continua insistindo em calar a imprensa, como vimos em vídeo que já publiquei e republiquei e que trago de novo para os amigos do blog, em que o deputado José Guimarães, vice-presidente do partido, acusa a mídia de ter “passado dos limites” e que eles, petistas, terão que “reagir a essa ação orquestrada [da imprensa] que tem como único objetivo prejudicar o PT”.
Confiram: