sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Os 54 milhões que votaram em Dilma acreditaram na propaganda de que vivem na Finlândia, que tudo é perfeito e que nem roubalheira existe

Com Blog Ricardo Setti - Veja




(Foto: Ricardo Matsukawa)
Com a reeleição de Dilma Rousseff (PT), a festa foi grande, mas todos os brasileiros perderam, diz o leitor Mauro Pereira (Foto: Ricardo Matsukawa)
E OS FINLANDESES FORAM ÀS URNAS!
Post do amigo do blog Mauro Pereira
POST DO LEITORO resultado da eleição presidencial não se destacou apenas pela campanha eleitoral que o precedeu e que deixará como lembrança a sombria constatação de que ficará marcada nos anais de nossa história política como uma das mais sórdidas e rasteiras que a sociedade brasileira já testemunhou.
Deixou transparecer, também, um insólito fenômeno quase imperceptível mostrando que embora vivamos sob a égide da mesma bandeira e da mesma Constituição, dois povos distintos conviveram simultaneamente durante um pequeno lapso temporal realidades antagônicas nos grotões desse imenso território verde e amarelo.
De um lado, seduzidos pela notável capacidade de convencimento da candidata reeleita, 54 milhões de brasileiros e brasileiras acreditaram que eram finlandeses e que viviam na Finlândia, um dos países mais desenvolvidos do mundo e, por causa disso, reverenciado internacionalmente pelo elevado padrão de vida que oferece à sua população, além de se sobressair como uma das nações com os menores índices de corrupção do planeta.
Entorpecidos pela sensação inusitada, os lapões tupiniquins foram às urnas e não desperdiçaram a oportunidade de extravasar a extensão do seu contentamento com o poder central, outorgando à sua presidente mais um mandato de quatro anos.
E nem poderia ser diferente, afinal estavam convictos de que habitavam uma nação onde a miséria praticamente inexiste, o índice de criminalidade é ínfimo, a média do salário dos trabalhadores permanece consolidada bem próxima de três mil dólares mensais e a imensa maioria é valorizada com empregos decentes, tudo isso assentado em um crescimento econômico vigoroso e constante.
Em reconhecimento a números e dados de tamanha envergadura, decidiram, então, que tinham a obrigação moral de retribuir com o voto aos benefícios advindos do bem elaborado plano habitacional que assegura a praticamente 100% da população o acesso à casa própria, ao privilégio de terem à disposição um primoroso programa de assistência médica e hospitalar e à constatação de que os aposentados são homenageados com a contrapartida do salário digno.
Orgulham-se de seus governantes que durante todo o mandato conservaram intacto o imaculado manto da honestidade mantendo-o impermeável à prática nefanda da corrupção e que com habilidade reservada somente aos grandes estadistas conseguiram consolidar, sem precisar lançar mão da excrescência da cooptação ou de qualquer outra ilicitude, uma maioria sólida no Congresso Nacional suficientemente capaz de garantir a implementação de ousado e moderno projeto de governo concebido para atender as justas demandas do seu povo.
Não fazem questão de disfarçar o ufanismo incontido que lhes eleva a autoestima ao revelarem ao mundo a inatacável retidão de caráter de seus representantes no Executivo Federal, cujo exemplo de ética se evidenciou ao coibirem com veemência o uso da máquina do Estado no desenrolar da campanha não permitindo que o eleitor fosse achacado com a ameaça da perda de benefícios sociais caso votasse no candidato adversário e ameaçando, inclusive, exonerar qualquer ministro que se atrevesse a tirar proveito de sua privilegiada condição para angariar vantagens eleitorais.
A fulgência desse cenário resplandecente apascenta suas consciências, uma vez que seus idosos são venerados, seus jovens têm garantido o acesso a uma educação de altíssimo padrão e suas crianças podem manifestar todo o saudável esplendor de sua morenitude nórdica, preservadas que são por uma intransponível malha protetora que as mantém incólumes à ação maléfica de fossas cépticas imundas, distantes de águas apodrecidas e salvas das barbáries da exploração sexual e do trabalho infantil.
Do outro lado, restou aos 51 milhões de miscigenados brasileiros orgulhosos dessa mistura, além de manifestarem sua brasilidade, assistirem com indisfarçável ponta de inveja a justa festa da vitória que recepcionou a madrugada inebriante iluminando-a com a exuberância dos fogos de artifícios que riscaram os céus da avatárica República Federativa da Finlândia dos Trópicos.
Felizmente, me mantive imune à sedução e, como prêmio, não fui convidado para essa comemoração!
Tomo por óbvio que, a bordo do trem-bala que a acomodou, essa multidão ainda viaja pelos trilhos da insolitude e curte inebriada as últimas paisagens dessa aventura pelo interior gelidamente ensolarado da Finlândia tropicana que se refugiou; entretanto, não me parece desonesto presumir que superada a festança, o êxtase se dissipará e a grande maioria dessa procissão composta por brasileiros que jamais tiveram o menor contato com o significado da palavra cidadania será remetida de volta à dura realidade que a cerca, obrigando-a a encarar novamente, e com a mesma submissão, a crueza do cotidiano que a mantém refém da chantagem oficial, vítima da pilantropia inescrupulosa do governante de plantão e escrava de sua triste ignorância.
Talvez na próxima eleição apareça alguém hábil o suficiente para reunir outros 54 milhões de eleitores e fazê-los sentirem-se finlandeses outra vez, nem que seja por um curto espaço de tempo. Quem sabe?
No Brasil real, lamentavelmente, entre brancos, nulos e abstenções feriram-se todos.