Por que os brasileiros vão realmente sentir falta de Gisele
DOM PHILIPPS - THE WASHINGTON POST
Jornalista norte-americano investiga o fenômeno Gisele Bündchen e a importância da modelo para o Brasil. "Ela é o Brasil como o país gostaria de ser visto"
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À primeira vista, a carreira fulgurante da top model Gisele Bündchen não é muito brasileira. A top, que se aposentou das passarelas aos 34 anos de idade em 15 de abril, em um evento midiático, exerce a profissão com mentalidade e eficiência condizentes com as raízes germânicas de sua família. Amigos, profissionais do setor e colegas usam termos como "pontual", "investimento seguro" e "bem educada" para descrevê-la - palavras raramente associadas a modelos, moda ou até ao Brasil impulsivo e tropical.
No entanto, os brasileiros podem reivindicá-la como sua. "Gisele é o que mais representa o Brasil no exterior. É Pelé, carnaval e Gisele", diz Fernanda Tavares, modelo brasileira baseada em Nova York que é amiga dela desde que elas começaram suas carreiras juntas, há 20 anos. As colônias alemãs no sul do país onde Gisele cresceu são parte de um colorida colcha de retalhos de imigração, que inclui as comunidades libanesa e japonesa de São Paulo. Embora algumas mulheres brasileiras considerem a modelo alta e magra demais, muitas se identificam com seu charme fácil, ainda que poucas tenham seu cabelo loiro e seus olhos azuis.
Gisele valoriza a família, o que cai bem na sociedade conservadora do país, em que onde muitos veem a família como a única instituição na qual se pode confiar. Saudável, mas sexy, Gisele é o Brasil como o país gostaria de ser visto. E os brasileiros celebram seus sucessos internacionais. "Ela é um ícone para os que trabalham com moda", afirma a modelo Michelli Provensi. "Foi ela que colocou a moda do Brasil no mapa. Não foram os estilistas, foram as modelos."
Segundo a revista Forbes, há muito tempo Gisele vem sendo a modelo mais bem paga do mundo(ganhou 386 milhões de dólares desde 2001). Em entrevista à TV, o marido dela, o jogador de futebol americano Tom Brady, contou que o casal pretende transmitir aos filhos os valores familiares da cidade pequena em que ela cresceu. Gisele foi criada junto com cinco irmãs em Horizontina, no Rio Grande do Sul. Seus pais ainda falam alemão, embora pertençam à quinta geração do clã no Brasil. O aeroporto do município foi nomeado em homenagem ao avô de Gisele, Walter, um ex-prefeito. Seu pai, Valdir, é um sociólogo que escreve livros de autoajuda."A família é a fortaleza em que tudo é ensinado", disse ele em uma entrevista em 2013 para a revista Donna.
Patrícia, irmã gêmea da modelo, é uma de suas empresárias. Outra irmã, Graziela, é juíza federal. "Gisele é bem estruturada, muito educada e com valores familiares fortes", diz Mônica Monteiro, que foi agente de Gisele durante os 12 primeiros anos de carreira. "Ela era muito magrinha, muito cabeluda e muito engraçada. Tinha uma pele muito bonita. Mas o que mais notei foi essa felicidade dela. Gisele nunca tinha visto uma revista, pois vivia numa cidade muito pequena, sem acesso à moda.Mas a menina aprendeu rápido como posar, como se comportar e como falar com clientes. Em oito meses, sua carreira estava decolando. "Ela perguntava: 'O que eu tenho de fazer para ser uma top model?'. E eu respondia que ela precisava vender mais”, conta Mônica. "Gisele nasceu com um curso de marketing na cabeça."
As mudanças cíclicas na moda também trabalharam a seu favor. O fato de ela ser chamada de "modelo do ano" na capa da Vogue americana em 1999 marcou o fim da era "heroína chic", caracterizada por modelos magrelas e pálidas. "O mundo estava precisando de cores e felicidade e a Gisele, sexy, natural e bronzeada, representou isso", afirma Mônica. Como muitas mulheres brasileiras, Gisele é dona de uma sensualidade confiante e natural, que atrai os homens sem desagradar as mulheres, o que muitas marcas descobriram ser uma combinação poderosa. No Brasil, ela vendeu de tudo, de xampu a televisão a cabo.
"Tudo que Gisele faz, vende", afirma a jornalista Joyce Pascowitch. "Ela representa à perfeição a mulher brasileira contemporânea. Alguém que trabalha e tem família”, emenda Daniella Bianchi, diretora da consultoria Interbrand. E, apesar de viver com a família em Boston, Gisele nunca poupa elogios a seu país natal. "Não há lugar no mundo em que eu me sinta melhor do que no Brasil", ela disse à revista de celebridades Contigo no ano passado. "Eu moro nos Estados Unidos por muitos anos. Gosto de lá, mas é muito diferente da maneira como eu fui criada e do meu modo de ser.Não sei como explicar, mas quando chego aqui, relaxo mais. O Brasil é o meu lar."
Tradução de Celso Paciornik