Jailton de Carvalho - O Globo
Ao detalhar corrupção na estatal, depoimento do ex-diretor já é considerado marco do combate à impunidade
A decisão do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa de contar o que sabe sobre a corrupção na estatal e devolver cerca de R$ 80 milhões à Justiça é considerado um marco no combate a impunidade. Esse é o acordo de delação premiada com potencial de maior impacto da história dos processos criminais do país.
É a primeira vez que um réu do porte do ex-diretor da Petrobras concorda em devolver aos cofres públicos tanto dinheiro e confessar a prática de crimes que podem complicar a vida de nove grandes empreiteiras e de, pelo menos, 30 políticos de expressão nacional: deputados, senadores, um ministro e três governadores.
O acordo, obtido a partir de uma difícil negociação conduzida por seis procuradores da República responsáveis pelas investigações da Operação Lava-Jato, deve consolidar a delação premiada como poderoso instrumento de investigação de organizações criminosas, e abrir caminho para que outros réus, nessa e em outras ações criminais, façam esse acordo.
Os efeitos já estão em curso: um mês após Costa começar a falar, o doleiro Alberto Youssef, chefe de uma das maiores lavanderias de dinheiro do país, também decidiu colaborar com o Ministério Público Federal.
- Esse é o acordo de delação de mais largo espectro - diz o procurador regional da República, Alexandre Camanho.
Antes de Costa se render ao cerco da força-tarefa da Lava-Jato, os tribunais brasileiros registravam duas grandes delações, uma de Youssef e outra de Durval Barbosa, ex-secretário de Assuntos Institucionais do Distrito Federal. Mas nenhuma delas chegou perto da do ex-diretor da Petrobras quando se compara o volume de recursos envolvidos e o potencial de impacto político. Recentemente, Youssef foi condenado justamente por não ter respeitado o acordo anterior com a Justiça.
NAS DELAÇÕES ANTERIORES, ESCÂNDALOS LOCALIZADOS
Em 2004, fisgado no escândalo do Banestado, Youssef revelou parte do funcionamento da máquina de lavagem, ajudou na condenação de outros doleiros e, ao final, devolveu à Justiça a módica quantia de R$ 1 milhão. Barbosa entregou pelo menos 38 vídeos de deputados, deputados distritais e até do ex-governador José Roberto Arruda recebendo dinheiro de origem ilegal, no caso conhecido como mensalão do DEM.
Ao longo da delação, o ex-secretário do Distrito Federal abriu mão de bens e de R$ 4 milhões em espécie. Ao todo, os bens devolvidos valeriam cerca de R$ 100 milhões. Mas as consequências criminais e políticas do caso acabaram restritas a personagens locais.
Na série de depoimentos que prestou, Costa apontou o envolvimento de 30 políticos e de grandes empreiteiras com desvios de dinheiro da Petrobras. Disse que recebeu da Odebrecht, no exterior, US$ 23 milhões. E que ganhou US$ 1,5 milhão para não atrapalhar a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras, em 2006. A artilharia de Costa atingiu PT, PMDB e PP, além das cúpulas da Câmara e do Senado. Integrantes dos três partidos, segundo ele, recebiam propina de empreiteiras com contratos com a Petrobras.
Costa disse ainda que recebeu R$ 500 mil do presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Parte das acusações, mantidas em sigilo como parte do acordo de delação premiada, acabaram se tornando públicas quando, na última quarta-feira, Costa teve que prestar depoimento em um dos processos que responde na 13ª Vara Federal de Curitiba.
- Se for tudo verdade o que ele disse, a casa cai - diz uma das autoridades do caso.
Costa decidiu fazer o acordo em 21 de agosto. Uma semana depois começou uma série de cem depoimentos. Procuradores do MPF e delegados da PF tiveram que fazer revezamento para interrogar, absorver e dar andamento ao grande volume de informações do ex-diretor da Petrobras. Em cada depoimento, Costa falou de uma irregularidade relacionada a políticos e empreiteiras.