Ninguém imaginou que a chegada de Bolsonaro ao poder seria tranquila. Além de toda a controvérsia que a precedeu, pontuada por uma tentativa de homicídio (lamentada por alguns pelo desfecho fracassado), havia (há) a presença, inédita, de filhos com mandato.
Família e poder costumam ser uma relação problemática; família de políticos, mais ainda. Em regra, quem tem mandato responde pelos problemas que cria (ou em que é envolvido) – exceto, claro, quando se trata de alguém cujo pai é presidente da República.
Tudo o que disser ou fizer, ainda que credenciado pelo voto popular, cai no colo do pai-presidente. E aí a encrenca fica maior do que é. Se o filho parlamentar nada diz, descumpre seu mandato; se diz, suas palavras passam a ser as do pai, ainda que delas divirja.
O governo Bolsonaro lida com essa encrenca, que, mesmo num contexto de normalidade, traria complicações. Num contexto em que padece de implacável má vontade da grande mídia e de inimigos invisíveis dentro da máquina administrativa, o desastre é inevitável.
Não há saída para isso. A saída seria não entrar. Como entrou, terá que aprender a lidar com o problema, que esta semana se agravou, mais uma vez, em função de uma situação que envolve seu filho, o senador eleito pelo Rio, Flávio Bolsonaro.
Foi a semana em que o governo cumpriu três compromissos de campanha: regulamentou a posse de armas, deu início à abertura da chamada caixa preta do BNDES e formalizou seu não reconhecimento à ditadura bolivariana de Nicolas Maduro, da Venezuela.
O que prevaleceu nas manchetes, no entanto, foi a acusação de que Flávio Bolsonaro teria pedido ao STF que interviesse para blindá-lo, via foro privilegiado, de uma investigação do Coaf, que envolve movimentação financeira suspeita de um ex-assessor seu, Fabrício Queiroz, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Flávio nega os termos em que a notícia foi veiculada. Sustenta que não pediu blindagem alguma, nem para ele, nem para Queiroz. Teria apenas denunciado uma irregularidade: a quebra de seu sigilo bancário, desde julho do ano passado, sem autorização judicial.
Se assim é, trata-se de fato de ilegalidade. Mas, seja como for, o conteúdo da ilegalidade já circula, posto no ar ontem, no Jornal Nacional. Detalhes de sua movimentação bancária foram expostos, sem que lhe tenha sido dado o direito prévio de explicar-se.
Tudo o que disser, diante dos números, estará (já está) sob suspeita. Mas o alvo, óbvio, não é ele: é o pai.
O Coaf investigou movimentação financeira de assessores de 23 deputados estaduais do Rio, mas só quebrou o sigilo bancário de Flávio Bolsonaro – e só os dados dele chegaram à imprensa.
As maiores movimentações suspeitas são de assessores de parlamentares do PT e Psol. Mas, para além da necessária investigação – e ela deve ocorrer e enquadrar eventuais infratores, inclusive, se for o caso, o filho do presidente -, o que se quer é criar um imbróglio político para o novo governo.
Se ele for inocente, é questão para o futuro. No presente – e é isso que importa -, já está sentenciado e condenado. E o pai-presidente politicamente atingido.
Ruy Fabiano é jornalista
Com Blog do Noblat, Veja