segunda-feira, 19 de agosto de 2019

"Tão cedo, o Brasil não se livra da fama de ser o país dos alvarás"

Tão cedo, o Brasil não vai se livrar da pecha de ser o país dos alvarás. Mesmo que o Senado aprove a flexibilização na emissão, dispensando os negócios de baixo risco, a medida não terá impacto imediato. “Os reflexos serão graduais e virão no longo prazo”, diz o gerente de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco.

A grande vantagem da medida, segundo ele, é que ela começa a dar mais claridade para os empreendedores, contribuindo para reduzir custos e melhorar a competitividade das empresas.

A medida beneficia principalmente o segmento de serviços - que é responsável por 73,5% do PIB brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) -, com a dispensa de alvará para abertura de negócios de baixo risco.

Atualmente, o Brasil é um dos países mais burocráticos no mundo para abertura de empresas. Um estudo do Banco Mundial feito em 190 países no ano passado mostra que são necessários, em média, 11 procedimentos durante 18,5 dias para abrir um empreendimento, o que coloca o Brasil em 140ª posição no ranking de facilidade para criar uma empresa. O país com o melhor desempenho é a Nova Zelândia, onde com um procedimento, que dura meio dia, é possível estabelecer uma empresa.

O comércio sente que vai ter mais facilidade. “A flexibilização na emissão de alvarás vai facilitar a abertura de lojas”, diz Luiz Augusto Idelfonso, diretor institucional da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping Centers (Alshop).

O professor Istvan Kasznar, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (Ebape/FGV) aponta que tudo que vier a facilitar a vida dos empreendedores é relevante. Mas destaca que, por si só, a flexibilização é uma medida de fôlego curto. “A direção é correta, mas é preciso avançar mais, em questões macro e microeconômicas.”


Outro fator que é fundamental, segundo ele, é a necessidade de medidas similares, que beneficiem a indústria. Kasznar lembra que a produção de vinhos do Rio Grande do Sul enfrenta dificuldades para entrar em outros países, por causa da dificuldade na obtenção dos registros dos produtos.

Castelo Branco, da CNI, destaca outras questões que precisam ser melhoradas para dar mais competitividade às empresas brasileiras. Entre elas estão a queda na taxa de juro, garantias de crédito e mais linhas de empréstimo de curto prazo.

Medida não se restringe aos alvarás
Outro ponto forte da medida que está em tramitação no Senado é o controle da atividade regulatória do Estado, aponta o advogado Fábio Cascione, do escritório Cascione Pulino Boulos Advogados.

“São criados limites à regulação, com o intuito de evitar abusos regulatórios. Não se pode, por exemplo, criar especificações técnicas inatingíveis de forma a retirar competidores do mercado.” Cascione aponta que um dos objetivos por trás do projeto é o de ampliar as condições para a entrada de competidores.

Pelo texto, a administração pública deve evitar medidas que criem reservas de mercado; impeçam a entrada de novos competidores; exijam especificações técnicas desnecessárias; impeçam a inovação; aumentem os custos de transação sem benefícios; criem demandas artificiais ou compulsórias; introduzam limites à livre formação de sociedades empresariais ou atividades econômicas e restrinjam o uso da publicidade e propaganda, exceto nos casos já previstos em lei.

Para se tornar lei, o texto da medida provisória precisa ser aprovado em votação no Senado até o dia 27, quando ela perde a validade.


Vandré Kramer, Gazeta do Povo