A queda da desocupação pelo aumento expressivo da informalidade em todo o País no trimestre encerrado em julho pode ser o prenúncio de que o trabalho com carteira assinada deve voltar a crescer em breve, segundo avaliação do professor-sênior da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (Fea-USP), Hélio Zylberstajn.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada pelo IBGE nesta sexta-feira, 30, mostram que a taxa de desemprego recuou entre maio e julho, para 11,8%, mas devido à criação de vagas no mercado informal, que bateu novo recorde.
"Os informais estão prestando serviços, contribuindo para o crescimento do nível de atividade e também estão podendo consumir mais. As empresas tendem a contratar formais quando a atividade cresce", avalia o economista, que também é coordenador do projeto Salariômetro, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
Zylberstajn também estima que os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, divulgados na última quinta-feira, trazem sinais positivos para o mercado de trabalho, caso o crescimento da construção civil, de 1,9% ante o trimestre anterior, se mantenha.
A seguir, trechos da entrevista:
Os dados de ocupação do trimestre encerrado em julho
mostram um cenário mais otimista do que o do começo
do ano?
Sim. Eles mostram que a ocupação cresceu de maneira acelerada no trimestre. Se a gente pensar que, nos últimos 12 meses encerrados em julho a ocupação cresceu em 2,2 milhões, o crescimento do trimestre encerrado em julho representa 55% do crescimento dos últimos 12 meses. O ritmo foi impressionante. Se o que aconteceu nesses três meses se repetir por três trimestres, serão 4,9 milhões de pessoas a mais ocupadas. Não é possível prever se esse resultado irá se repetir, mas é tudo que o País precisa.
Mas a informalidade bateu novo recorde no trimestre.
Sim, esta é a notícia ruim. Dos novos ocupados, 1,2 milhão de pessoas, 96% são informais. Só 4% são formais, houve uma explosão sem precedentes da informalidade. O mercado de trabalho brasileiro teve um trimestre indiano, com mais de 90% de novos postos informais.
Os recordes seguidos de aumento da informalidade
não assustam?
Em um primeiro momento, sim, mas essa explosão da informalidade pode ser um prenúncio do crescimento da formalidade. Os trabalhadores que não conseguiram uma ocupação formal partiram para informalidade e estão conseguindo sobreviver. Eles estão prestando serviços, contribuindo para o crescimento do nível de atividade e também estão podendo consumir mais. Esse pode ser um prenúncio de aumento da formalidade, as empresas tendem a contratar formais quando a atividade cresce. Só não sabemos em que ritmo isso vai ocorrer.
Desses 1,2 milhão de novos ocupados. metade estava desocupada e voltou ao mercado e metade veio da desocupação que não é explícita, dos desalentados que tomaram coragem e foram à luta, voltaram ao mercado, ainda que estejam informais.
As pessoas também estão ganhando menos, já que o
rendimento médio real dos trabalhadores caiu 1%.
Isso também é um reflexo da informalidade?
Se olharmos a curva da Pnad, quando a economia começa a empregar depois de uma crise, o rendimento médio cai. É que as pessoas agradecem aos céus só por ter uma ocupação, mesmo ganhando pouco.
Por isso ainda vemos um número crescente de pessoas
qualificadas em ocupações de baixa qualificação?
Exato. O trabalhador olha em volta, para a situação dos vizinhos, dos primos e amigos e vê que uma grande parte deles está desempregada. Ele vai aceitar salários menores, condições de trabalho mais duras. Só quando o emprego voltar a crescer, a massa de crescimento vai voltar a crescer também. Com as contratações, o mercado vai ficar mais competitivo e ganhando mais.
Os resultados do PIB no segundo trimestre mostraram
um avanço da construção civil. Isso pode se refletir no
mercado de trabalho?
É, sem dúvida, um sinal muito positivo. O crescimento da construção civil significa emprego na veia, é um setor que emprega muitas pessoas e, geralmente, trabalhadores de baixa qualificação. Se o setor tiver condições de se recuperar, pode empregar muitos trabalhadores mais jovens e com baixa experiência.
O governo tem agido para tentar reduzir o desemprego?
O presidente Jair Bolsonaro disse recentemente que o
governo não gera empregos, a menos que faça concursos
públicos.
Essa lógica não faz sentido. O que se espera do Estado não é fazer novos concursos públicos, mas que ele consiga gerar empregos indiretamente. Isso não aconteceu, em partes, porque as condições fiscais não existem para investimentos diretos. As repartições públicas estão apagando as luzes às 18h e o governo está cortando gastos.
Como resolver essa questão?
O governo pode, sim, ajudar a criar empregos quando ele investe, quando dá crédito para financiar empresas e dá condição para que elas contratem mais pessoas. Do lado do governo não vai ter investimentos, então, o setor privado precisa sair do desalento.
Douglas Gavras , O Estado de S. Paulo