Declaração foi dada durante debate em Porto Alegre, no Fórum Social Temático
FLÁVIO ILHA - O Globo
O secretário-geral da presidência da República, ministro Gilberto Carvalho, admitiu nesta sexta-feira que o modelo responsável por levar o PT ao poder em 2002 já mostra sinais de desgaste e que é necessário debater as características de um novo projeto de governo, que permita “ir além” de temas como inclusão social e distribuição de renda.
As declarações foram dadas durante um debate sobre “crise do capitalismo e democracia”, dentro da programação do Fórum Social Temático. Para um público de esquerda, Carvalho disse que o governo foi pego de surpresa pelas manifestações de junho do ano passado e que falhou ao não garantir a qualidade dos serviços públicos a uma população cada vez mais exigente.
- Não há dúvida nenhuma de que os sinais (de desgaste) estão dados. Neste momento, nos damos conta que as conquistas importantes que nós tivemos estão dadas. Foram importantes, mas foram absolutamente insuficientes. Tivemos um processo de inclusão social inegável e temos que nos orgulhar disso. Mas temos que reconhecer que foi absolutamente insuficiente – disse.
O ministro admitiu também que a presidente Dilma Rousseff foi pega de surpresa pelas manifestações de junho do ano passado e disse que o “processo de estresse” que levou aos atos violentos foi gerado por um equívoco do governo, que não soube garantir serviços de qualidade a uma população cada vez mais exigente.
- Eu diria que a corrida veloz para o consumo não foi acompanhada pela nossa capacidade de fazer um grande debate em torno dos outros valores. Havia uma demanda reprimida por bens e, quando essa demanda começa a ser satisfeita, a exigência passa a ser também por serviços de qualidade. Nesse ponto nós falhamos. – avaliou.
Carvalho descreveu o sentimento do governo e do PT com as manifestações de junho como de perplexidade, de “certa dor, certa incompreensão, quase um sentimento de ingratidão”.
- Bom, fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós? É quase uma sensação, equivocada da nossa parte, de achar que essa manifestação não dava para entender – disse.
No ano passado, o tom do discurso do PT indicava que o partido era vítima do sistema político atual. A sigla chegou a reforçar a tese em seus debates internos e documentos. Parte da plateia que lotava o auditório Dante Barone, da Assembleia Legislativa, vaiou as declarações de Carvalho.
Na quinta-feira, um ato de protesto no centro de Porto Alegre contra o aumento das passagens de ônibus terminou em atos de vandalismo por parte dos manifestantes. O ministro disse que acompanhou os fatos e elogiou a atuação da Brigada Militar, que não reprimiu atos de violência contra prédios públicos e privados por parte de manifestantes:
- O pior caminho é o da repressão, da discriminação, do apartheid. Isso acabou no Brasil. Definitivamente acabou. Os aeroportos foram tomados pela população. É o momento de ter capacidade de dialogar. Mas o Estado tem que cuidar dos exageros, das radicalizações. Temos que defender o patrimônio, mas acima de tudo (defender) as pessoas. Essa é a nossa prioridade. Percebi a paciência com que a polícia se comportou.
Carvalho também voltou a acusar a oposição – incluindo setores do judiciário – pelo que chamou de reação “raivosa e radical” contra o processo de inclusão social promovido pelos governo do ex-presidente Lula e da presidente Dilma Rousseff. Sem se referir em nenhum momento ao julgamento do mensalão, Carvalho disse que a Justiça participou do esforço de “criminalização” da conduta do PT nos mecanismos de financiamento de campanhas eleitorais.
Segundo Carvalho, o erro do PT foi acreditar, entre 2001 e 2002, que a implementação de programas de distribuição de renda e de inclusão social no país poderiam ser como “um passeio tranquilo”.
- Confundir governo com poder é um equívoco porque nós sabemos da relatividade (do conceito). O próprio fato de termos que fazer alianças para manter a hegemonia, o próprio fato de termos no legislativo este ano (2013) derrotas importantes, o próprio fato de (termos) um judiciário em que nós apostamos, em que nós demos autonomia, sobretudo pelos órgãos de controle, mas que trabalharam fortemente, e aí toda vem a ideologia dominante, pela criminalização, na medida em que não podiam nos vencer por maioria, na criminalização de toda a nossa conduta, nos transformando quase que em inventores da corrupção, quando nós sabemos que o problema nosso foi reeditar, infelizmente, em parte aquilo que eram os usos e costumes da política – declarou.