terça-feira, 15 de janeiro de 2019

"Reformas não se resumem à Previdência", editorial de O Globo

Mesmo economistas “desenvolvimentistas” não desconhecem o problema do desequilíbrio fiscal. Basta ter seriedade acadêmica. A divergência está na terapia, porque eles não se livram do dogma de que mais gastos geram sempre mais crescimento. Como disse uma vez a economista Dilma Rousseff, no cargo de chefe da Casa Civil do governo Lula: “gasto em custeio é vida”.

Mas, antes de tudo, costuma ser déficit. Contas públicas gravemente desequilibradas, como não há registro na história, caíram sobre o governo do vice Michel Temer, cuja competente equipe econômica evitou a debacle, que seria acompanhada de recessão e disparada da inflação. Devido a fragilidades éticas do presidente, um razoável e imprescindível projeto de reforma da Previdência não avançou no Congresso.
Resta ao governo Bolsonaro fazer o serviço, para dar um horizonte de crescimento ao país e esperanças a ainda 12 milhões de desempregados. Pois é preciso acelerar o crescimento, daí ser estratégico desatar o nó fiscal: uma Previdência há tempos inadequada ao padrão demográfico de um país cuja população jovem começa a decrescer; mecanismos de indexação de despesas e um Orçamento quase 100% engessado por vinculações.
Isso indica que, se a reforma da Previdência é vital, também há um trabalho a ser feito paralelamente, a fim de conter fontes de gastos que funcionam de forma autônoma. O que pode ser executado por meio de mudanças de legislações infraconstitucionais, sem necessidade do quórum qualificado exigido por mudanças constitucionais. Mais fácil de executar, e nem por isso pouco importante.
No domingo, O GLOBO revelou que a equipe do ministro Paulo Guedes estuda três dessas alterações, de grande ajuda ao equilíbrio das contas. Somadas às estimativas do que poderá ser poupado com a reforma da Previdência, até 2022, seriam economizados aproximadamente R$ 266 bilhões no período, uma grande contribuição à estabilização da economia.
Essas reformas além da Previdência são imprescindíveis, dado o tamanho do rombo fiscal. Estima-se que o ajuste terá de ser equivalente a 5% do PIB, mais que os superávits alcançados nas gestões FH e Lula, que contiveram o crescimento relativo da dívida. A grande diferença, porém, é que, no passado, os saldos positivos foram alcançados basicamente por aumento de impostos, a fim de elevar a arrecadação. Esta via se esgotou, porque fez a carga tributária chegar à faixa dos 33% do PIB, muito acima dos 27% da média das economias emergentes.
Por isso, a equipe econômica estuda mudanças na fórmula de cálculo do salário mínimo — que vence este ano —, para impedir aumentos reais descolados da produtividade da economia; postergar reajustes dos servidores, cuja folha é o segundo item mais pesado no Orçamento; e rever parâmetros muito benevolentes do abono salarial.
Não há alternativa a não ser podar excessos. O Brasil virou um ponto fora curva.