sexta-feira, 30 de setembro de 2022

'Os intelectuais sonham com utopias anticapitalistas', por Edilson Salgueiro

Rainer Zitelmann, historiador e sociólogo alemão | Foto: Divulgação

O historiador alemão Rainer Zitelmann descreve as experiências fracassadas dos países socialistas e mostra como as políticas capitalistas produziram riqueza em nações sem recursos naturais


Entusiasta do capitalismo de livre mercado, o historiador e sociólogo alemão Rainer Zitelmann, de 64 anos, é autor de diversos livros sobre o tema. Entre eles, O Capitalismo Não É o Problema, É a Solução, lançado neste ano pelo Grupo Almedina. A obra descreve as diversas experiências fracassadas dos países socialistas e mostra como as políticas capitalistas foram capazes de produzir riqueza em nações sem recursos naturais.

Em entrevista à Oeste, Zitelmann disse que o bem-estar da maioria da população está atrelado ao aprofundamento das reformas liberais, que incluem privatizações, redução de impostos, desregulamentação do mercado de trabalho e combate à corrupção. “Nos países mais capitalistas do mundo, como Singapura, Suíça, Irlanda e Luxemburgo, as pessoas estão indo muito bem”, observou. “Nos países mais socialistas, como Cuba, Coreia do Norte e Venezuela, o povo está indo muito mal.”

Livro O Capitalismo Não É o Problema, É a Solução, de Rainer Zitelmann | Foto: Divulgação

Na conversa, o historiador refutou a falácia do socialismo nórdico, criticou os intelectuais anticapitalistas e comentou o atual momento político-econômico do Brasil. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Por que o senhor decidiu escrever O Capitalismo Não É o Problema, É a Solução?

Fiquei impressionado com a crescente onda de anticapitalismo em todo o mundo, que é, em grande parte, alimentada pelo fato de que os jovens geralmente têm uma compreensão muito limitada da História. Na escola, seus professores contam tudo sobre os “males do capitalismo”, mas quase nada sobre os horrores do socialismo.

O primeiro capítulo do livro é sobre a ascensão econômica da China. Há algum motivo especial para falar do país asiático?

No fim da década de 1950, 45 milhões de chineses morreram em virtude do maior experimento socialista da História, o “Grande Salto Adiante”, de Mao Tsé-tung. A maioria dos alunos nunca ouve falar disso na escola. Após a morte de Mao, 88% da população chinesa vivia em extrema pobreza. Hoje, esse número caiu para menos de 1%. Por quê? Porque o reformador Deng Xiaoping [ex-presidente do país] introduziu os direitos de propriedade privada na década de 1980 e permitiu mais capitalismo na China.

O senhor argumenta que o capitalismo é mais eficaz contra a pobreza do que a “ajuda humanitária”. Por quê?

Você pode ver isso claramente quando compara países da Ásia e da África. Nenhum outro continente recebeu tanta ajuda ao desenvolvimento quanto a África. No entanto, a África ainda é o continente mais pobre, com a maioria das pessoas sofrendo com a fome. A Ásia recebeu muito menos ajuda e, por causa disso, dependeu de mais políticas capitalistas. Isso funcionou.

Em um dos capítulos, o senhor faz um paralelo entre a Coreia do Sul e a Coreia do Norte. Quais são as principais diferenças entre esses países?

Na década de 1960, a Coreia — tanto do Norte quanto do Sul — ainda era um dos países mais pobres do mundo. Tão pobre quanto os mais pobres da África Subsaariana são hoje. A Coreia do Norte escolheu o caminho do socialismo, enquanto a Coreia do Sul escolheu viver no capitalismo. A Coreia do Sul, hoje, é um dos países mais ricos do mundo. A Coreia do Norte, por sua vez, é um país onde a população vive na fome e na pobreza. O mesmo país, a mesma história, a mesma língua, a mesma cultura — mas sistemas econômicos diferentes. Vemos aqui as maravilhas do capitalismo e a miséria do socialismo.

“Uma coisa é certa: eleger o socialista Lula tornaria tudo muito pior”

O senhor também se propõe a refutar o mito do “socialismo nórdico”. Por que esses países não são socialistas?

Se você observar o ranking anual do think tank Heritage Foundation, que avalia os países economicamente mais livres do mundo, verá que a Suécia e a Dinamarca são ainda mais capitalistas que os Estados Unidos. A Dinamarca e a Suécia estão agora classificadas em 10º e 11º no Índice de Liberdade Econômica, enquanto os EUA estão em 25º. Se alguém disser que os países nórdicos são socialistas, então essas nações devem estar adormecidas nos últimos 50 anos. Como mostro em meu livro, a Suécia experimentou o “socialismo democrático” na década de 1970. Mas deu completamente errado. Os suecos reconheceram seus erros e implementaram reformas capitalistas na década de 1990, ou seja, privatizações, redução de impostos e desregulamentação do mercado de trabalho. A partir daí, as coisas começaram a melhorar.

A liberdade econômica aumenta o bem-estar dos seres humanos?

Sim, e vemos isso em todo o mundo. Nos países mais capitalistas, como Singapura, Suíça, Irlanda e Luxemburgo, as pessoas estão indo muito bem. Nos socialistas, como Cuba, Coreia do Norte e Venezuela, estão indo muito mal.

Por que os “intelectuais” não gostam do capitalismo?

Esse é realmente o capítulo mais importante do meu livro. Não quero revelar tudo aqui, porque quero que as pessoas leiam a obra. Mas é onde resolvo o enigma de por que um sistema tão bem-sucedido quanto o capitalismo é desprezado pelos intelectuais, que, ao mesmo tempo, ousaram sonhar (e ainda sonham) com utopias anticapitalistas. 

O senhor faz um apelo para que os países adotem urgentemente as reformas capitalistas. Quais seriam essas propostas?

É sempre o mesmo catálogo de medidas que traz o sucesso: baixar impostos, desregulamentar o mercado de trabalho, combater a corrupção e privatizar. Isso funcionou em todo o mundo, quando feito da maneira certa.

Por que as intervenções do Estado na economia não funcionam?

Porque empresários e consumidores sabem melhor o que é bom para eles do que políticos e funcionários do governo.

 O Brasil está mais próximo do socialismo ou do capitalismo?

Há apenas alguns anos, havia quase 700 empresas estatais (SOEs) no Brasil, das quais mais de 45 estavam sob controle direto do Estado, cerca se 160 eram subsidiárias, quase 260 eram coligadas (empresas relacionadas) e aproximadamente 230 eram minoritárias. Isso contraria os princípios claramente enunciados no artigo 173 da Constituição Federal brasileira: “Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado somente será permitida quando necessária à segurança nacional ou a um relevante interesse coletivo, conforme definido em lei”.

No atual governo, liderado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), esse cenário mudou?

De janeiro de 2019 a fevereiro de 2020, foram privatizadas empresas no valor de cerca de R$ 135 bilhões. Um relatório para a OCDE declarou: “O governo federal está desinvestindo suas participações diretas e indiretas nas estatais. Os desinvestimentos entre janeiro de 2019 e abril de 2020 atingiram quase R$ 135 bilhões, sendo R$ 29,5 bilhões contabilizados no primeiro quadrimestre de 2020. As medidas incluem participações em empresas listadas, como IRB e Banco do Brasil. Incluem também os desinvestimentos realizados pelas cinco maiores estatais (BNDES, Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal), por meio da venda de ativos e subsidiárias”. Mas então surgiu a pandemia de coronavírus, em que Bolsonaro seguiu uma série de políticas desastrosas. Tudo foi dominado pela covid-19, e o programa de privatizações estagnou. Houve algumas desregulamentações, mas muito poucas. O Brasil, como muitos países do mundo, precisa urgentemente de reformas capitalistas. Eu preferiria ver o ministro Paulo Guedes substituir Bolsonaro como presidente. Mas uma coisa é certa: eleger o socialista Lula tornaria tudo muito pior.

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Revista Oeste