sexta-feira, 12 de outubro de 2018

"No berço da intolerância", por Carlos José Marques


O que é a intolerância, o radicalismo? 
É antes de tudo a indisposição ao diálogo para ouvir, aceitar e saber sobre o pensamento distinto do outro. 
Esse clima pegou o Brasil de jeito. 
Colocou a Nação em módulo indolente e refém, sem direito ao contraditório, ao questionamento das opções. 
Tomou conta com tal virulência que difícil hoje é aplacar os ânimos. 
Resgatar a convergência. 
Pacificar o debate. 
Ninguém se arrisca a contrapor interlocutores, temendo ser tachado de corrompido visceral, racista incorrigível, homofóbico enrustido ou coisa pior. De onde vem tamanha resistência ao divergente? Existe forma e raiz para tal resposta. 
O “nós contra eles”, que soube se impregnar no preconceito rançoso do confronto – pregado às últimas consequências pelo Lulopetismo -, impôs um modelo tão falacioso como oportunista. 
Quem não se lembra das ruas tomadas por black blocs a depredar patrimônio e a incitar a baderna para fazer valer a tese de que o PT era injustiçado e precisava se manter no poder? 
Quem apagou da memória declarações insolentes, como as dos senadores Gleisi Hoffmann e Lindberg Farias, ameaçando incendiar o País se o demiurgo líder Lula fosse preso? 
Quem não levou a sério quando o próprio criminoso, mentor e articulador da pilhagem bilionária aos cofres públicos, arvorou-se o papel de Deus, comparável a Jesus Cristo, e se disse transmutado em “uma ideia” a ser disseminada por milhões de lulinhas País afora, estimulando a insubordinação à Lei? 
Há algo mais fascista e totalitário que isso? Inexistem nesse ambiente as condições mínimas para aproximar os dois polos gestados na rixa. 
O tribalismo político está em voga. Hoje a maioria dos brasileiros, mesmo a contragosto, virou Lula ou anti-Lula. 
Não tem opção. 
Ou se alinha com ele ou contra ele. Não interessa se do outro lado do ringue está um radical, um mero pau-mandado ou um pacífico coroinha de paróquia. 
A polarização pressupõe apenas o antagonismo extremo, as faces de uma mesma e venenosa moeda com o espectro inquisidor do capo petista. Seu oponente, no caso o capitão reformado de epítetos tão repulsivos quanto, terá a projeção, intenção e estatura necessárias para se contrapor à ameaça corrosiva do Lulopetismo? 
A dúvida é simples assim. Vista por esse prisma a eleição deu verniz institucional a uma guerra. Não ideológica apenas. 
De princípios, de modelos para o futuro, de ação e reação. A hostilidade é o amálgama que sedimenta as candidaturas de Bolsonaro e Haddad neste segundo turno. É inútil e improdutivo se colocar em cima do muro, pois um dos dois sairá presidente. 
Alguém escolherá pelos indecisos e, em boa medida, tal escolha pode e deve aborrecê-los. Os brasileiros são o esteio da democracia nativa. Enalteceram e reiteraram apoio majoritário a ela até em pesquisa recente. 
Muitos ainda, é verdade, incorrem no erro de se deixar levar pelo teatro dos disfarces que cada candidato costuma usar nessas horas para angariar votos desgarrados. 
O Partido dos Trabalhadores é mestre na arte da encenação. Recorreu à tática ainda na primeira vitória com o mantra do “Lulinha paz e Amor”. 
Repetiu a prática com a Dilma toda pura distribuindo promessas de luz e combustível baratos e agora dobra a aposta tirando, como que por encanto, a bandeira vermelha da campanha de Haddad, que passa a adotar o verde e amarelo e a evitar visitas ao presidiário Lula na cadeia, para descolar em parte a imagem um do outro. 
Até onde esse marketing do engodo é capaz de engabelar novos seguidores só as urnas dirão. 
Decerto, a farsa não deveria servir de instrumento na tentativa de convencimento. Em nenhuma hipótese. 
Mas o hábito tomou especialmente o Partido de Lula. 
Lá, por exemplo, o falso conflito de classes que rachou o País ganhou musculatura e fez escola. 
A modelagem de defesa petista das classes menos favorecidas representou na prática a submissão dos necessitados, sem resgate efetivo de sua condição, levando-os a vivenciar a seguir a falta de perspectiva, o desemprego em larga escala e, em muitos casos, a fome. 
O embuste acabou por gerar revolta. 
Enquanto a agremiação aparelhava o Estado e saqueava seus cofres resolveu colocar a culpa na oposição para evitar o rebosteio de um projeto de poder. 
Muitos dos lesados foram agora à forra e o conflito acabou armado. Cabe as agremiações não se comportarem mais como forças messiânicas, tal qual seitas, que saem atrás de missionários alienados para espalhar a mensagem do caos se o inimigo levar a contenda. 
Seria desejável que em suas cartilhas a lição da harmonia, e não a da divisão sectária, estivesse presente como princípio basilar a reger seus seguidores. 
Só assim haverá o retorno da paz política.
IstoE