O antipetismo derrotou o lulismo nestas eleições. Onde antes o PT teve votações respeitáveis, agora amargou derrotas acachapantes. Perdeu no Rio de Janeiro, perdeu em Minas Gerais e foi massacrado nos três estados do Sul e no Centro-Oeste. Em São Paulo, onde tradicionalmente o PT perde as eleições, a derrota foi ainda mais intensa. Mas o partido manteve intacta sua principal trincheira — o Nordeste. Fernando Haddad recebeu dos nordestinos o maior número de votos já depositados no PT. Mais de 20 milhões de eleitores da região votaram em Haddad, enquanto 8,3 milhões escolheram Jair Bolsonaro.
A derrota do PT, como de resto qualquer fracasso, tem mil pais. Aliados dizem que faltou um projeto de impacto nos moldes do que foram o Bolsa Família e o Mais Médicos (o que permitiu a Ciro Gomes, do PDT, abocanhar parte do eleitorado de esquerda com seu “Nome Limpo”). Faltou autocrítica em relação aos crimes recentes e do passado (o que poderia ter atraído o eleitor que só precisava desse aceno moral para desistir de votar em Bolsonaro). Faltou grandeza da parte de Lula, que não só se sentou em cima da vaga de candidato por tempo demais como elaborou a estratégia, agora vista como equivocada, da “curva fechada para a esquerda”, em substituição ao discurso liberal e centrista que o PT apresentou em 2002.
Na primeira etapa da campanha, por decisão do ex-presidente e visando a angariar o apoio do eleitorado ideológico, o PT ressuscitou propostas abandonadas por ele próprio desde os tempos em que era freguês tucano, como a rescisão de contratos de privatização. Já a segunda etapa seguiu o vetor inverso. As rédeas da campanha foram para as mãos do pragmático senador eleito Jaques Wagner. Com ele, o ex-prefeito passou a falar em “combate duro” ao crime organizado e chegou a elogiar o juiz Sergio Moro, algoz de seu chefe.
Como nada disso adiantou, a uma semana do segundo turno, Haddad topou abrir a última e desesperada carta: prometeu subir o salário mínimo, aumentar em 20% o Bolsa Família e congelar o preço do botijão de gás. “Já fiz as contas. Está decidido.” A promessa de limitar o preço do gás ao custo de subsídio da Petrobras foi sugestão da presidente do PT, Gleisi Hoffmann. A descambada populista só serviu para tornar mais amarga a derrota.
Nem Haddad nem o PT, porém, saem menores do pleito. Pelo contrário: de plano C de Lula (sendo o plano A o próprio ex-presidente e o B, Jaques Wagner), Haddad deixa a eleição tacitamente coroado uma das principais lideranças da sigla. Não é pouca coisa para um ex-prefeito que perdeu a reeleição em primeiro turno e até recentemente estava tão decepcionado com seu partido e com a política que chegou a planejar deixar os dois. O PT tampouco pode queixar-se. Para uma sigla que esteve no epicentro das duas maiores investigações de corrupção na história do Brasil, emergir de uma eleição com a primeira bancada do Congresso é mais que sair no lucro.
Com 56 cadeiras na Câmara, seis no Senado e quatro governos estaduais, o PT entrará em 2019 com voz, cacife e dinheiro para liderar a oposição. Desde que a derrota parecia inevitável, o partido passou a jogar para não perder de lavada e evitar uma desvantagem muito superior a 10 pontos, diferença que poderia abrir espaço para que o clã dos Gomes escanteasse o PT e assumisse o protagonismo na oposição de esquerda a Bolsonaro. No fim, perdeu por pouco mais de 10 pontos.
Numa de suas últimas entrevistas, questionado sobre o motivo pelo qual o mercado preferia Bolsonaro, Haddad iniciou a resposta dizendo que não era certo classificar o mercado como “uma pessoa”, depois titubeou e, quando estava prestes a gaguejar, foi socorrido por Wagner: “Não podemos interferir se o mercado escolheu Bolsonaro como candidato. Para nós, Haddad é o candidato do povo”. Foi aplaudido pelos petistas. Não deu tempo para que o ex-prefeito pusesse em prática as lições aprendidas nestas eleições, mas, a seu favor, pode-se dizer que saiu delas maior do que entrou.